São Paulo, terça-feira, 12 de dezembro de 2000

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EMERGENTES

Turquia e Argentina seguiram programa do FMI, mas não resistiram à desconfiança de investidores internacionais

Ajuda do FMI não evita pânico no mercado

JOSEPH KAHN
DO "THE NEW YORK TIMES"

Se o FMI desse notas aos seus países devedores, a Turquia e a Argentina teriam tirado dez este ano, provavelmente.
Os líderes dos dois países reforçaram seus sistemas bancários, mantiveram sob controle os dispêndios do governo e impediram viradas súbitas nas cotações de suas moedas, como parte do esforço para atrair investidores estrangeiros e administrar suas finanças de maneira semelhante aos países ricos. Os analistas diziam que eles estavam fazendo praticamente tudo certo.
No entanto os mercados financeiros se voltaram contra eles no mês passado -da mesma forma repentina que que os investidores perderam a confiança na Rússia e na Indonésia três anos atrás. A Rússia e a Indonésia tinham administradores financeiros públicos muito menos severos e definitivamente não estavam entre os melhores alunos do FMI.
A lição parece clara: países que reconstroem seus sistemas financeiros agressivamente ao modo do Primeiro Mundo são mais vulneráveis a choques do que os países que fazem esse tipo de mudança sem muito entusiasmo. Quanto mais investimento estrangeiro atraem, maior o risco de que uma virada no clima emocional entre os investidores perturbe suas economias.
A boa notícia para a Turquia e para a Argentina é que elas merecem crédito adicional por se esforçarem tanto.
O FMI abriu caminho para pacotes de resgates financeiros rápidos e de grande volume, com o objetivo de dar sustentação às suas reservas cambiais e reassegurar os investidores.
A Turquia recebeu US$ 7,5 bilhões na semana passada, menos de duas semanas depois que surgiram os primeiros sinais de pânico entre os investidores estrangeiros. A Argentina está na fila para receber um pacote ainda maior de novos empréstimos do FMI e do Banco Mundial, para garantir que ela não decrete moratória sobre sua dívida externa.
A má notícia é que o pânico que afligiu os dois países está se provando difícil de evitar. Afinal, muitos aparentemente inexpugnáveis tigres econômicos do Leste Asiático caíram vítima da epidemia de 1997. Aquele período pode ter deixado os investidores ainda mais relutantes quanto aos defeitos percebidos nos países de mercado emergente.
Os funcionários do FMI rejeitaram a idéia de que a Turquia e a Argentina fossem apenas vítimas inocentes de viradas aleatórias no sentimento do mercado.
Disseram que eles cometeram erros quando a confiança nas posições financeiras de alto risco estava em declínio, em todo o mundo.
Mas alguns dos críticos do FMI dizem que os problemas da Turquia e da Argentina, alimentados em larga medida por investidores estrangeiros, confirmam sua visão de que o Fundo muitas vezes pressiona os países a confiar demais em capitais internacionais.
"Eles enfrentam uma situação na qual jogaram de acordo com as regras e então, subitamente, precisam enfrentar um pânico", diz Dani Rodrik, economista da Universidade Harvard. Funcionários do Fundo dizem que a situação agora é mais complexa.
A Turquia e a Argentina planejaram e colocaram em vigor seus próprios programas de reestruturação, ainda que com ajuda do FMI. Essas transições são praticamente sempre vítimas de alguns problemas, mas a compensação por manter a fidelidade à abertura de mercado e à disciplina fiscal é comprovada, alegam.
Para a Turquia, um programa ambicioso de administração monetária, reestruturação bancária e privatização, orientado pelo FMI, deixava "uma margem minúscula de erro", diz Stanley Fisher, o número dois na hierarquia do FMI.
No geral, a Turquia se saiu bem, alega ele, mas não conseguiu cumprir o cronograma de sua reforma bancária. Os 81 bancos do país estavam acostumados a lucrar explorando a alta taxa de inflação turca.
Quando a Turquia conseguiu sucesso em seu combate à inflação, este ano, a renda que isso propiciava aos bancos diminui, e diversos deles faliram.
A Argentina conquistou repetidos votos de confiança dos economistas ortodoxos por sua disciplina monetária, rigorosa fiscalização bancária e políticas favoráveis ao investimento, adotadas em 1991. Mas o país decidiu manter o peso vinculado ao dólar mesmo quando o Brasil, seu maior vizinho, desvalorizou acentuadamente sua moeda depois da crise asiática, no começo de 1999.
O valor elevado do peso prejudicou as exportações e manteve baixo o crescimento econômico argentino.
Mas a Argentina continuou a tomar empréstimos em grande volume, e os investidores temiam que ela não conseguisse pagar os cerca de US$ 20 bilhões em dívidas estrangeiras que vencem ao longo do próximo ano.
Fisher disse que a Argentina vinha tendo bom desempenho há anos, até encontrar essas dificuldades, e que empréstimos de emergência poderiam ajudá-la a manter as reformas e a pagar suas dívidas.
No entanto, ao que parece, mesmo os melhores alunos terminam precisando de ajuda de emergência, uma hora ou outra.

Tradução de Paulo Migliacci


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