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ARTIGO
O Pantanal, a hidrovia e um ministro
ALCIDES FARIA
Em setembro de 1998 o Ministério dos Transportes licenciou junto ao Ibama obras em um trecho de
120 quilômetros do rio Paraguai,
na parte norte do Pantanal. O dr.
Stephen Hamilton, da Michigan
State University e estudioso da hidrologia da região, analisou o Plano de Controle Ambiental, documento que serviu de base para o licenciamento, e concluiu que até 10
mil quilômetros da planície pantaneira podem ser afetados.
Essas obras fazem parte da hidrovia Paraná-Paraguai, um megaprojeto de 3.442 quilômetros,
sendo os 1.240 quilômetros iniciais
do Pantanal, com participação do
Brasil, Bolívia, Paraguai, Argentina e Uruguai. Dragagens, retilinização do curso e retirada de rochas
do leito do rio possibilitariam a navegação "24 horas por dia, 365 dias
por ano", principalmente para o
transporte de grãos para portos argentinos e uruguaios.
Desde seu lançamento, em 1988,
o projeto tem encontrado oposição no país e no exterior por sua
inviabilidade econômica e ambiental. Dentro do próprio governo há contradições.
Por um lado, o presidente Fernando Henrique apóia um amplo
programa ambiental para a região
(BID/Pantanal) e não incluiu a hidrovia na primeira parte do programa "Brasil em Ação", não devendo fazê-lo na segunda, de acordo com Luiz Nassif na coluna
"Brasil em Ação, o retorno" (Folha, 13/08/98), pois se "identificarão rotas alternativas de transporte que contornem o Pantanal, reduzindo o risco ambiental".
De outro lado, o Ministério dos
Transportes adota estratégias para
viabilizar a hidrovia executando-a
por partes, como é o caso relatado
de início e, ao mesmo tempo, negando a existência do megaprojeto
(Folha, 14/09/98).
Também fazem parte dessas estratégias artigos do ministro Elizeu
Padilha para os principais jornais
do país atacando os que questionam a hidrovia Paraná-Paraguai e
outras obras de infra-estrutura a
cargo do ministério. As principais
considerações e adjetivos são para
os ecologistas. Eles são taxados de
"críticos desinformados" (Folha,
14/09/97); "espécie predadora" e
"terroristas verdes" ("Gazeta Mercantil", 30/07/98) ou ainda "espertos que permanecem ocultos" e
que manejam os ingênuos com o
objetivo de "impedir que o Brasil
saia de sua secular condição de ser
apenas potencialmente uma das
nações mais ricas do mundo" (Folha, 25/06/98).
É interessante notar a coincidência desses artigos com opiniões de
uma publicação norte-americana
chamada "Executive Inteligence
Review" (EIR), a qual teve textos
exibidos em um dos programas
eleitorais do ex-candidato Enéas
Carneiro para "provar" que Lula,
FHC e Ciro estavam aliados a interesses contrários ao desenvolvimento do país. Estes fariam parte
dos espertos ou dos ingênuos
identificados pelo ministro?
Na verdade o que impulsiona as
obras defendidas pelo sr. Elizeu
Padilha é o modelo de expansão da
agricultura horizontalmente baseado na devastação acelerada de
áreas nativas de cerrados e florestas, quando o lógico seria investir
para aumentar a produtividade
onde tem infra-estrutura, conservando e recuperando solos e aportando tecnologias limpas. No caso
do Pantanal, o desenvolvimento
sustentável virá com investimento em atividades que se adaptaram às condições naturais e particularmente no turismo.
Esse é um dos caminhos para
quem quer, de fato, o desenvolvimento do país.
Alcides Faria, 45, biólogo, é secretário-executivo da Coalizão Rios Vivos.
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