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"Investimento privado garante crescimento"
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A seguir, trechos da entrevista como o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci Filho.
FOLHA - O desejo de Lula de meta
de inflação de 4% em 2005 contra
proposta de 5% da equipe econômica [acabou fixada em 4,5%] não retrataria mais eventual despreparo
do presidente pois exigiu custo da
política monetária e menor crescimento, do que realmente uma preocupação com inflação baixa? Lula
acertou ao ser mais radical do que
sua equipe econômica?
ANTONIO PALOCCI FILHO - Como
relatei no livro, em determinado momento daquela reunião,
cheguei a achar que a decisão
estaria sendo tomada não de
forma despreparada, mas talvez sem todas as informações.
Por isso, insisti até o final. E
ele mostrou extrema clareza
sobre sua decisão e as conseqüências. Penso hoje que acertou na mosca.
FOLHA - Aos olhos de hoje, com um
crescimento médio do PIB de 2,6%
no primeiro mandato, Lula não errou por exagero?
PALOCCI - Não errou e não exagerou. Quis inflação menor e
conseguiu. O sacrifício se reverterá num crescimento social e economicamente mais
robusto daqui para a frente.
FOLHA - O real forte não é evidência de erro da política monetária?
PALOCCI - Não. É evidência
crescente de melhoria do risco-país. Se você fizer uma curva do
câmbio e colar numa curva do
risco-país, vai ver que são similares no tempo e na magnitude.
Opinião sobre cada momento
da política monetária não é relevante. A política monetária
teve grande sucesso.
FOLHA - O sr. revela o desconforto
de Lula ao ler a primeira versão da
"Carta ao Povo Brasileiro", semente
da política de rigor fiscal e monetário. Relata que, no governo, ele
apoiou a política econômica, mas teve momentos de dúvida. Por que Lula conviveu mal com essa política?
PALOCCI - O presidente teve e
tem plena consciência da relação entre esforço e resultados
em matéria de política econômica ou mesmo em outros terrenos da política. O desconforto que existia naquele momento era provocado pela consciência de que ele poderia receber um país em crise, que exigisse rigidez na política econômica. Não me parece que alguém possa gostar disso.
FOLHA - A negociação com João
Roberto Marinho [da TV Globo] ter
chegado ao detalhe de quanto deveria ser o superávit primário, como
o sr. relata no livro, não dá razão aos
críticos que acusam Lula de ter feito
concessões demais pelo poder?
PALOCCI - Não se tratava de
concessões, mas de diálogo.
Naquele período, falei com empresários, líderes sindicais e de
movimentos sociais, agentes
políticos e econômicos.
FOLHA - O sr. escreve que Lula
"nunca fez muita questão de pacificar as posições antagônicas", num
estilo de dividir para reinar. Estimulava seu conflito com Dirceu?
PALOCCI - O estilo do presidente não é o de dividir para reinar.
Ele respeita diferenças, convive
com elas, explora o que elas trazem de riqueza nas formulações e políticas públicas.
FOLHA - O sr. minimiza o duelo
com Dirceu, mas, nas grandes decisões, ele defendia posições que se
chocavam com as suas. O sr. escondeu o jogo?
PALOCCI - Não. Deixei claro no
livro que tivemos divergências.
Ressaltei que foram muitas.
Mas o fato real, para além dos
boatos, é que tive convivência
civilizada com José Dirceu.
Exercemos o jogo da democracia e não o jogo das intrigas.
FOLHA - Pelo livro, entende-se que
seu grande rival foi Mercadante e
Gushiken, seu maior aliado.
PALOCCI - O Gushiken sempre
jogou muito a favor da política
econômica e mais ainda da unidade do governo. Seria absolutamente injusto com Mercadante tratá-lo como rival da política econômica. Foi líder do
governo no Senado. Defendeu
com vigor a política econômica.
Ele teve uma divergência conosco em torno da meta de inflação. E, naquele momento eu
não poderia revelar que a decisão havia sido do presidente.
Meu papel era segurar o rojão, pois aquela meta era do governo e a responsabilidade de
defendê-la era minha. Só revelo
hoje porque isso já é passado, a
inflação foi debelada.
FOLHA - Seus críticos dizem que o
sr. vivia pedindo demissão a Lula como forma de se fortalecer?
PALOCCI - Não é verdade, nunca
usei esse expediente. Mesmo
porque nunca me considerei
insubstituível. Pedi para deixar
o governo no final de 2005 por
achar que deveria sair, mas o
presidente não me deu espaço
para avançar, não quis conversar sobre a hipótese. Teria sido
melhor se eu saísse. Para mim e
para o governo.
FOLHA - No livro, o sr. diz não gostar de criação de planos econômicos.
Lula criou o PAC, que afrouxou sua
política fiscal. Como o sr. o avalia?
PALOCCI - No livro, refiro-me a
planos heterodoxos, com tabelamento de preços ou de câmbio, que criam passivos bilionários. O PAC é um plano de medidas de incentivo. Seu grande
acerto é o foco no investimento. Um ponto que foi anunciado
no PAC precisa de maior destaque são as medidas para incrementar o investimento privado. É o investimento privado,
pela sua magnitude, que vai garantir de fato um crescimento
maior. Melhorar o investimento público sempre é bom. Mas
acreditar que ele resolve a falta
do investimento privado é um
erro.
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