São Paulo, terça-feira, 13 de março de 2007

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"Investimento privado garante crescimento"

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A seguir, trechos da entrevista como o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci Filho.

 

FOLHA - O desejo de Lula de meta de inflação de 4% em 2005 contra proposta de 5% da equipe econômica [acabou fixada em 4,5%] não retrataria mais eventual despreparo do presidente pois exigiu custo da política monetária e menor crescimento, do que realmente uma preocupação com inflação baixa? Lula acertou ao ser mais radical do que sua equipe econômica?
ANTONIO PALOCCI FILHO
- Como relatei no livro, em determinado momento daquela reunião, cheguei a achar que a decisão estaria sendo tomada não de forma despreparada, mas talvez sem todas as informações. Por isso, insisti até o final. E ele mostrou extrema clareza sobre sua decisão e as conseqüências. Penso hoje que acertou na mosca.

FOLHA - Aos olhos de hoje, com um crescimento médio do PIB de 2,6% no primeiro mandato, Lula não errou por exagero?
PALOCCI
- Não errou e não exagerou. Quis inflação menor e conseguiu. O sacrifício se reverterá num crescimento social e economicamente mais robusto daqui para a frente.

FOLHA - O real forte não é evidência de erro da política monetária?
PALOCCI
- Não. É evidência crescente de melhoria do risco-país. Se você fizer uma curva do câmbio e colar numa curva do risco-país, vai ver que são similares no tempo e na magnitude. Opinião sobre cada momento da política monetária não é relevante. A política monetária teve grande sucesso.

FOLHA - O sr. revela o desconforto de Lula ao ler a primeira versão da "Carta ao Povo Brasileiro", semente da política de rigor fiscal e monetário. Relata que, no governo, ele apoiou a política econômica, mas teve momentos de dúvida. Por que Lula conviveu mal com essa política?
PALOCCI
- O presidente teve e tem plena consciência da relação entre esforço e resultados em matéria de política econômica ou mesmo em outros terrenos da política. O desconforto que existia naquele momento era provocado pela consciência de que ele poderia receber um país em crise, que exigisse rigidez na política econômica. Não me parece que alguém possa gostar disso.

FOLHA - A negociação com João Roberto Marinho [da TV Globo] ter chegado ao detalhe de quanto deveria ser o superávit primário, como o sr. relata no livro, não dá razão aos críticos que acusam Lula de ter feito concessões demais pelo poder?
PALOCCI
- Não se tratava de concessões, mas de diálogo. Naquele período, falei com empresários, líderes sindicais e de movimentos sociais, agentes políticos e econômicos.

FOLHA - O sr. escreve que Lula "nunca fez muita questão de pacificar as posições antagônicas", num estilo de dividir para reinar. Estimulava seu conflito com Dirceu?
PALOCCI
- O estilo do presidente não é o de dividir para reinar. Ele respeita diferenças, convive com elas, explora o que elas trazem de riqueza nas formulações e políticas públicas.

FOLHA - O sr. minimiza o duelo com Dirceu, mas, nas grandes decisões, ele defendia posições que se chocavam com as suas. O sr. escondeu o jogo?
PALOCCI
- Não. Deixei claro no livro que tivemos divergências. Ressaltei que foram muitas. Mas o fato real, para além dos boatos, é que tive convivência civilizada com José Dirceu. Exercemos o jogo da democracia e não o jogo das intrigas.

FOLHA - Pelo livro, entende-se que seu grande rival foi Mercadante e Gushiken, seu maior aliado.
PALOCCI
- O Gushiken sempre jogou muito a favor da política econômica e mais ainda da unidade do governo. Seria absolutamente injusto com Mercadante tratá-lo como rival da política econômica. Foi líder do governo no Senado. Defendeu com vigor a política econômica. Ele teve uma divergência conosco em torno da meta de inflação. E, naquele momento eu não poderia revelar que a decisão havia sido do presidente. Meu papel era segurar o rojão, pois aquela meta era do governo e a responsabilidade de defendê-la era minha. Só revelo hoje porque isso já é passado, a inflação foi debelada.

FOLHA - Seus críticos dizem que o sr. vivia pedindo demissão a Lula como forma de se fortalecer?
PALOCCI
- Não é verdade, nunca usei esse expediente. Mesmo porque nunca me considerei insubstituível. Pedi para deixar o governo no final de 2005 por achar que deveria sair, mas o presidente não me deu espaço para avançar, não quis conversar sobre a hipótese. Teria sido melhor se eu saísse. Para mim e para o governo.

FOLHA - No livro, o sr. diz não gostar de criação de planos econômicos. Lula criou o PAC, que afrouxou sua política fiscal. Como o sr. o avalia?
PALOCCI
- No livro, refiro-me a planos heterodoxos, com tabelamento de preços ou de câmbio, que criam passivos bilionários. O PAC é um plano de medidas de incentivo. Seu grande acerto é o foco no investimento. Um ponto que foi anunciado no PAC precisa de maior destaque são as medidas para incrementar o investimento privado. É o investimento privado, pela sua magnitude, que vai garantir de fato um crescimento maior. Melhorar o investimento público sempre é bom. Mas acreditar que ele resolve a falta do investimento privado é um erro.


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