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LIÇÕES CONTEMPORÂNEAS
Desindustrialização e desnacionalização
LUCIANO COUTINHO
Começa a ficar indisfarçável o
viés antiprodução no país (e
pró-importação) da atual política econômica. A penetração
de bens importados cresce de
forma veloz e generalizada, segundo os resultados de pesquisa
recém-concluída por técnicos
do BNDES. Os números são impressionantes, como se pode ver
no quadro simplificado.
O peso das importações sobre
a produção no país já vinha
crescendo progressivamente
desde 1990, como resultado da
abertura econômica promovida
pelo governo Collor, mas saltou
de forma espetacular depois do
Plano Real pelo fato de o poder
de compra do real (em termos
de dólares) ter sido fixado em
patamar artificialmente elevado.
Este terrível erro vem custando muito caro: 1) o déficit comercial e de serviços com o exterior aumenta sem parar, tornando o país cada vez mais vulnerável e dependente da entrada de créditos externos para fechar o desequilíbrio; 2) a desindustrialização dos setores e segmentos mais atingidos vem se
aprofundando (especialmente
nos três primeiros grupos da tabela), com fechamento de linhas de produção e de unidades
fabris inteiras; 3) em muitos setores ocorre uma rápida desnacionalização da indústria, pois
as empresas brasileiras foram
colocadas em condições desiguais de competição (exemplos
eloquentes são autopeças, eletrodomésticos, alimentos, higiene e limpeza).
Apenas nos setores tipicamente domésticos, não afetados pelo
comércio internacional, ou em
alguns setores onde a competitividade brasileira é muito forte, o estrago não tem sido violento. Duas outras exceções são
os setores automobilístico
(montadoras) e de têxteis sintéticos, cujos coeficientes haviam
alcançado níveis altos e retrocederam por força de proteção especial.
A restrição às importações financiadas, recentemente adotada, foi uma medida correta,
pois eliminou parte do incentivo a importar, dado pelo fato de
os juros serem muito mais baixos no exterior. Mas ela só alcança metade da pauta de importados e terá seus efeitos diluídos à medida que alternativas financeiras sejam encontradas.
Diante dessas evidências, é lamentável que o governo ainda
insista em vender ilusões. As falácias mais frequentes são as de
que os ganhos de produtividade
derivados da abertura e o reequipamento industrial favorecido pela importação de bens de
capital provocarão um vigoroso
ressurgimento das exportações
"dentro de dois ou três anos".
Alguns formuladores imaginam que medidas seletivas de
estímulo aos investimentos seriam suficientes, sem se dar
conta dos imensos custos fiscais
necessários para se articular
uma política compensatória de
fomento industrial, sob a atual
combinação das taxas de câmbio e de juros. Subestima-se rotundamente o forte viés antiexportação dado pela âncora
cambial, expresso no bisonho
desempenho das vendas externas nos últimos anos, o que está
demonstrado com clareza no
mencionado estudo.
Em algum momento -mais
cedo ou mais tarde- será necessário reduzir esse crescente
déficit externo e será inescapável operar uma significativa depreciação do real. Quanto mais
cedo, ainda sob condições favoráveis de liquidez internacional, menos custoso será o ajuste. Embora difícil, este não significará o fim da estabilidade
de preços, pois os mecanismos
automáticos de indexação já
foram desarticulados e o déficit
público já se encontra em firme
trajetória descendente. Quanto
mais tarde, mais violento e penoso -particularmente se isso
for ditado por uma mudança
adversa do mercado financeiro
global.
Luciano Coutinho, 50, é professor titular do
Instituto de Economia da Universidade de
Campinas (Unicamp). Foi secretário-geral do
Ministério da Ciência e Tecnologia (governo
Sarney).
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