|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
OPINIÃO ECONÔMICA
Procura-se
JOÃO SAYAD
São Paulo, quinta-feira, nove
horas da manhã, cruzamento
da Faria Lima com a avenida
Rebouças, trânsito congestionado: dez ônibus ocupam todas as
faixas da avenida.
Todos os ônibus juntos levavam apenas 15 passageiros: média de um passageiro e meio por
ônibus! Ônibus praticamente
vazios e não há nenhuma garagem por perto.
A mesma coisa pode ser vista
em todas as avenidas de São
Paulo: muitos ônibus vazios.
Em princípio, é muito bom para os passageiros, ainda que
atrapalhe um pouco o trânsito.
Nesta coluna de economia, a
observação cria duas dúvidas:
primeiro, como os donos das
empresas de ônibus conseguem
sobreviver com tantos ônibus
tão vazios? Quem paga pelos lugares vazios? Seria a Prefeitura
de São Paulo?
Em segundo lugar, por que as
lotações dirigidas pelos perueiros estão sempre cheias e andam
para baixo e para cima fugindo
da polícia? A tarifa é igual à do
ônibus. O veículo é menor.
A maioria dos passageiros prefere o conforto da perua: conhecem o motorista, param em
qualquer lugar, não permitem
que homenzarrões apertem as
mocinhas.
Por que cobrando o mesmo
preço, as peruas estão cheias e os
ônibus vazios? Será que o passageiro de transporte público não é
soberano, não sabe o que quer?
Confiamos na sua escolha entre
diferentes parques temáticos,
vários provedores de Internet,
mas o consideramos um ignorante em questão de transporte
pessoal.
Temos que "ensiná-lo" a tomar ônibus grandes, lerdos, com
acesso muito difícil por causa da
altura das carrocerias.
A propaganda contra perueiros fala em falta de segurança.
Quem entende mais de segurança: a) as empresas de ônibus;
b) os técnicos do setor que insistem que transporte público exige
fiscalização (que não coíbe o
abuso de ônibus vazios) e que os
veículos precisam ter corredor
central; ou c) os passageiros?
De fato, quando a polícia persegue peruas dando tiros, elas
acabam batendo nos postes, ferindo passageiros e pedestres.
Nós, os dinossauros, estamos
sempre escrevendo a favor da
empresa nacional, da empresa
estatal, do servidor público, a favor de mais política e menos economia. Cumprimos rigorosamente os deveres de nossas convicções.
Por que os neoliberais não defendem os perueiros, representantes legítimos da melhor livre
iniciativa, da guerra à burocracia, da criatividade, do auto-emprego e da concorrência?
O Cade poderia desviar atenção da cerveja e verificar a concorrência entre as "aparentemente numerosas" companhias
de ônibus e os microempresários. O Sindicato de Microempresas, a Associação Comercial,
a Federação do Comércio e as
câmaras de comércio, os entusiastas da "nova economia",
não têm nada a dizer sobre esse
exemplo de criatividade, iniciativa e bons serviços? Onde estão
todos?
Se os neoliberais continuarem
de férias, os perueiros vão ficar à
mercê da defesa que os dinossauros podem dar. E infelizmente temos perdido muitas batalhas.
Pensando bem, talvez eu não
devesse falar sobre transporte
público, pois não sou engenheiro
nem especialista.
Mas o problema é simples.
Há uma briga.
De um lado estão o prefeito de
São Paulo e as empresas de ônibus.
Do outro, uma infinidade de
microempresários, motoristas
de peruas e vans, lutando para
ganhar a vida e oferecendo serviço que os consumidores querem. Quem está certo?
João Sayad, 53, economista, professor da
Faculdade de Economia e Administração
da USP e ex-ministro do Planejamento (governo José Sarney); é autor de "Que País é
Este?" (editora Revan); escreve às segundas
nesta coluna. E-mail: jsayad@ibm.net
Texto Anterior: Índice é maior em Salvador Próximo Texto: Habitação: Repactuar dívida pode ser saída para SFH Índice
|