São Paulo, terça-feira, 14 de março de 2006

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OPINIÃO ECONÔMICA

Ser um Bric

BENJAMIN STEINBRUCH

O estudo da Goldman Sachs "Dreaming With Brics: The Path to 2050" (Sonhando com os Brics: o caminho para 2050) foi uma das melhores coisas que ocorreram ao Brasil em matéria de imagem internacional neste início século. Concluído em outubro de 2003, esse trabalho criou o acróstico famoso que colocou o Brasil e mais Rússia, Índia e China no bloco emergente predestinado a se tornar a principal força da economia mundial até meados do século 21.
Ser um Bric, hoje, tem uma enorme importância. As decisões econômicas, em qualquer escala, principalmente de investimentos, são tomadas em grande parte com base em expectativas.
É inaceitável, portanto, que o Brasil comece a ficar para traz na comparação com os outros Brics. Nos primeiros seis anos do século (consideradas as previsões para 2006), a economia brasileira deve acumular crescimento de pouco mais de 15%. Esse desempenho está abaixo do projetado pelo Goldman Sachs para o país no período. Pior: está muito aquém do crescimento obtido pelos outros três países companheiros de bloco (veja quadro), que devem superar com folga as projeções. A China deve crescer 63%, a Índia, 43%, e a Rússia, 41%.
Sabemos muito bem por que o Brasil está ficando para trás. Segundo a "doutrina" neoliberal, o país não pode crescer mais do que 3% a 3,5% ao ano -o tal do crescimento potencial-, porque isso ressuscitaria o dragão da inflação. Tomo emprestada a expressão de Nelson Rodrigues para dizer que esse é um "complexo de vira-lata" brasileiro. Mas essa discussão não é objeto deste artigo. Quero lembrar que continuar atrelado aos Brics, marca da moda, traz inúmeras vantagens econômicas para o Brasil. Todos acreditam que o crescimento mundial nas próximas décadas se concentrará nesse bloco, onde haverá a maior possibilidade de valorização de ativos. E as grandes corporações multinacionais, cada vez mais, tenderão a ver nos Brics as melhores possibilidades de retorno para seus investimentos.
O país precisa estar atento para se beneficiar dessa predisposição internacional em favor dos países emergentes, e em especial do Bric. Uma interessante reportagem feita pela revista "The Economist", em janeiro, resgatou estudos históricos mostrando que os emergentes dominaram a economia mundial até o século 18, considerando-se o PIB pela paridade do poder de compra (PPC). Só depois do advento da Revolução Industrial, no século 19, os atuais países hoje ricos passaram a ter a maior parcela do PIB. Agora, no século 21, a economia estaria empreendendo o caminho de volta, para a situação de divisão compartilhada da riqueza da época da pré-revolução industrial. A "The Economist" calcula que, já em 2005, considerado o PIB pela PPC, emergentes e Primeiro Mundo se equivalem em poder econômico.
A ressurreição dos emergentes se dá, obviamente, pela liderança dos Brics. Parece óbvio que o Brasil precisa colar nesse bloco de vanguarda. Esse noivado longo e penoso com a América Latina e o Mercosul vale a pena, mas demorará. A maior parte dos países da América Latina está de olhos voltados para outro noivo, os EUA (parceiro que nunca podemos desdenhar). Em vez de pensar em Mercosul, melhor seria pensar em Mercobric, esse sim um bloco no qual o Brasil pode ser favorecido. Com seu enorme potencial agrícola, Brasil e Rússia têm todas as condições de pegar carona no crescimento de Índia e China.
Entre os quatro Brics, o Brasil é seguramente o que tem maior potencial para se beneficiar nessa corrida conjunta para o Primeiro Mundo. Não há razões para ficar para trás. O país tem enormes recursos naturais e a grande possibilidade de desenvolvimento agrícola em razão de clima favorável, insolação e solo fértil. Não enfrenta problemas religiosos, o regime democrático está consolidado e estável, o sistema financeiro é sólido e as instituições são respeitadas.
Olhe para os outros parceiros dos Brics e verá que nenhum reúne todas essas qualidades. Superar o "complexo de vira-lata" e enriquecer é uma possibilidade concreta para o Brasil neste século. Trata-se de uma corrida de longa distância, na qual os corredores que pretendem vencer precisam manter-se no bloco da frente. Não é necessário estar sempre em primeiro. Mas em último e longe não pode ser!


Benjamin Steinbruch, 52, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
E-mail - bvictoria@psi.com.br


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