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LUÍS NASSIF
Os direitos dos pacientes
A cena não sai da memória
dos membros da família que
dela participaram, em um dia
qualquer de 1987. Meu pai tinha
sofrido um segundo derrame e
fora encaminhado à Beneficência Portuguesa de São Paulo.
Lá, foi atendido por um clínico-geral à antiga -dedicado,
atencioso- que chamou, para
auxiliá-lo, um neurologista.
Com as radiografias do cérebro na mão, ambos me chamaram -na condição de primogênito- e informaram que se
acabara: o cérebro de meu pai
tinha sido totalmente afetado.
Incontinênti, pedi que não prolongassem sua vida, porque
acabaria levando junto minha
mãe, de saúde frágil, com duas
operações de ponte de safena.
Conversei com minha mãe, expondo a questão, mostrando
que meu pai não mais existia.
Em um momento de crise dele,
o neurologista encaminhou-o à
UTI. A família insistiu que não
prolongasse inutilmente sua vida, mas como se reage em um
momento desses? Meu pai foi internado, passou um mês, depois
voltou para casa, em estado vegetativo. O neurologista, ambicioso, argentário -pelas conversas ocasionais durante a internação do velho- cobrou 30
dias de atendimento. O custo
maior não foi esse. O coração de
meu pai levou oito meses para
deixar de bater e, a cada dia que
passava, consumia as derradeiras energias de minha mãe. Ela
morreu menos de um ano após
sua morte.
Essa onipotência e essa ambição, que beiram a selvageria, começam finalmente a ser podadas pelo próprio meio médico. O
código de conduta "Direitos do
Paciente", recém-aprovado pelo
Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, da UFRJ, é um
documento histórico para todos
os que sofreram o que minha família sofreu e merece ser estendido a todo complexo hospitalar
brasileiro.
Entre outros pontos, define como direitos do paciente:
1)obter tratamento digno,
atencioso e respeitoso, sendo
tratado e identificado por seu
nome e sobrenome, não por números ou códigos nem de modo
genérico desrespeitoso;
2)ter guardados sob sigilo seus
dados pessoais, desde que isso
não acarrete riscos a terceiros
ou à saúde pública;
3)poder identificar as pessoas
responsáveis direta ou indiretamente por sua assistência por
meio de crachás visíveis e legíveis;
4)receber informações claras,
objetivas e compreensíveis sobre
hipóteses de diagnóstico, finalidade dos materiais coletados
para exames, diagnósticos confirmados, ações terapêuticas,
riscos, benefícios e inconvenientes provenientes dos exames
diagnósticos e das terapias propostas;
5)ser consultado quando houver necessidade de escolha entre
duas ou mais condutas terapêuticas;
6)consentir ou recusar, de forma livre, voluntária e esclarecida, com adequada informação,
procedimentos cirúrgicos, diagnósticos e/ou terapêuticos a que
será submetido, para os quais
deverá conceder autorização
por escrito por meio de um termo de consentimento;
7)ter anotado em seu prontuário, principalmente se inconsciente durante o atendimento, todas as medicações utilizadas, com as respectivas dosagens e a quantidade de sangue recebido, além dos dados
que permitam identificar a sua
origem, as sorologias efetuadas
e os prazos de validade;
8)quando esgotadas as possibilidades do hospital de oferecer
tratamento curativo e respeitadas as responsabilidades do hospital com relação à coletividade,
recusar tratamentos dolorosos
ou extraordinários para tentar
prolongar a vida e optar pelo local em que o paciente, ou sua família, no seu impedimento, prefira que se dê o óbito.
Internet: www.dinheirovivo.com.br
E-mail - lnassif@uol.com.br
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