São Paulo, quarta-feira, 14 de maio de 2008

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Fundo soberano não é grande negócio, diz especialista

JANAINA LAGE
DA SUCURSAL DO RIO

O economista americano Jan Kregel, especialista em finanças e desenvolvimento, afirma que a criação de um fundo soberano é uma estratégia pouco eficaz. Segundo ele, a única forma de o país driblar os efeitos da enxurrada de dólares é adotar taxas de juros mais baixas. Os fundos soberanos visam gerar um retorno mais alto para o excesso de poupança gerado do que o país teria se fosse gerenciado de forma mais conservadora -por exemplo, com reservas internacionais. Kregel esteve no Brasil na semana passada para participar de um encontro com especialistas em um estudo internacional com o Ibase (Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas) sobre o papel das entidades financeiras internacionais na governança global. Ele já foi economista-chefe do departamento de Análises de Políticas e Desenvolvimento do escritório de Financiamento do Desenvolvimento da ONU e assessorou a Unctad.

 

FOLHA - Qual o valor de obter o "investment grade" quando as agências de risco são tão criticadas?
JAN KREGEL
- As agências medem a capacidade de pagamento do país. A forma como o "rating" é feito, no entanto, não necessariamente reflete a habilidade real de pagamento. Isso é usualmente feito de forma comparativa. Há dúvidas se a comparação é mesmo válida. A nota significa uma mudança estrutural. Muitas instituições que trabalham de acordo com princípios fiduciários rígidos podem investir apenas em locais que não representem risco significativo. Essa regra é interpretada como somente investir em ativos classificados como grau de investimento.

FOLHA - Como fica a questão da maior entrada de dólares?
KREGEL
- O Brasil passa a ser atraente não apenas para fundos de hedge especulativos mas para instituições como fundos de pensão e companhias de seguro. Não há dúvida de que haverá um aumento no fluxo de recursos. Nos últimos anos, o Brasil teve efeitos positivos com a balança comercial favorável. Mas, em qualquer cenário, há uma probabilidade maior de que a balança não seja tão favorável quanto no passado por fatores externos, como a crise nos EUA e os efeitos sobre a demanda chinesa. Além disso, o real se apreciou muito em relação ao dólar nos últimos anos, e isso teve um grande impacto nos preços dos produtos brasileiros lá fora. O Brasil tem um mercado doméstico consistente, capaz de sustentar o crescimento da indústria. Mas, em geral, para ser bem-sucedido, um país precisa ser capaz de vender seus produtos no exterior. A taxa de câmbio torna essa competição mais difícil.

FOLHA - O governo anunciou a criação de um fundo soberano. O que o sr. acha?
KREGEL
- O fundo soberano significa simplesmente dizer que estamos recebendo esses dólares, mas não precisamos deles e vamos mandá-los de volta. Se os investidores estrangeiros vão aplicar no Brasil e receber algo em torno de 12%, e o fundo soberano vai usar esse dinheiro para investir no exterior com taxa de retorno de 6% ou 7%, isso não me parece realmente um grande negócio.

FOLHA - Como resolver então a questão do dólar?
KREGEL
- Esse é um debate que vem desde o início do governo Lula -o equilíbrio entre a política monetária e a política industrial e fiscal. O país precisa baixar as taxas de juros. Isso reduz o incentivo para o estrangeiro aplicar aqui. Mais importante do que as expectativas de inflação é o seu movimento, se sobem ou caem ante os acontecimentos.


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