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Pacote fiscal português inclui "imposto da crise"
Além do corte de gastos públicos, trabalhadores e empresas terão de pagar mais IR; esforço é "indispensável", diz primeiro-ministro
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A MADRI
Não adiantou muito o papa
Bento 16 dizer ontem, no santuário português de Fátima,
que ali estava para "rezar, com
Maria e tantos peregrinos, pela
nossa humanidade acabrunhada por misérias e sofrimentos".
A 135 quilômetros dali, na capital Lisboa, o governo português desconsiderava a oração
do papa e anunciava sofrimentos para a sociedade, na forma
de corte de gastos públicos e
aumento de impostos.
Mas, em relação a outros países, há uma novidade: empresas, bancos e investimentos de
capital pagarão a sua cota.
"É um esforço absolutamente indispensável", justificou-se
o primeiro-ministro socialista
José Sócrates. Afinal, Portugal
está de fato acabrunhado por
um formidável deficit público
de 9,4% do PIB (Produto Interno Bruto, medida da produção
econômica de um país).
Sócrates já havia lançado anteriormente o seu PEC (Pacto
de Estabilidade e Crescimento), que previa reduzir o deficit
para 8,3%. Com as novas medidas, a expectativa é que o buraco caia para 7,3% neste ano e
para 4,6% em 2011.
Há diferenças importantes
entre o pacote português e os
que estão sendo adotados em
outros países europeus.
Em Portugal, o ajuste se fará
metade a metade: o aumento de
impostos representará uma arrecadação extra de 1 bilhão
(R$ 2,22 bilhões); o corte de
gastos será de 1,1 bilhão.
Nos outros países, tem havido mais corte de gastos do que
aumento de impostos.
Além disso, Portugal passa a
fatura do ajuste também aos
setores mais fortes economicamente, e não apenas ao funcionalismo público. Haverá aumento de 1% no Imposto de
Renda para quem ganha até
2.375 (R$ 5.285) e de 1,5% para quem recebe mais.
As empresas terão uma tributação autônoma de 2,5% para as maiores, sobretudo instituições financeiras.
Também sobe o imposto sobre capital e para os dividendos
(1,5% para os juros recebidos
por depósitos a prazo). É o que
o jornal "Financial Times" chamou de "imposto da crise".
O fantasma da Grécia também sobrevoou Lisboa, mas o
ministro das Finanças, Fernando Teixeira dos Santos,
afastou a hipótese de violência
nas ruas. "Haverá tensões sociais, mas temos de avançar
com esse plano", disse à agência Bloomberg.
Na Espanha, a tensão social
que já se previa anteontem, no
lançamento do pacote de ajuste, tomou forma concreta ontem: a Federação dos Serviços
Públicos da União Geral de
Trabalhadores convocou greve
geral do setor púbico para o dia
2 de junho.
A UGT sempre foi próxima
dos socialistas, que governam
atualmente a Espanha.
Não obstante, seu braço para
o setor público classificou de
"agressão sem precedentes" o
pacote anunciado na terça-feira, que prevê, entre outros pontos, corte de 5% nos salários
dos funcionários.
Em Portugal, o corte, também de 5%, será apenas nos
soldos dos funcionários políticos e dos gestores de empresas
públicas.
Reino Unido
A moda do corte de salários
de ministros pegou: o primeiro
ato anunciado por David Cameron, 48 horas depois de assumir o cargo de premiê britânico, foi justamente a redução,
também de 5%, nos salários de
seus ministros.
Mas Cameron foi além: os salários ficarão congelados por
cinco anos. É o tempo que, em
tese, durará o seu governo de
coligação com os liberais.
De todo modo, o correto seria
dizer que os socialistas Zapatero e Sócrates é que copiaram o
conservador Cameron: o corte
de salários era promessa de
campanha dos conservadores.
Zapatero, ao contrário, tinha
até acertado um aumento, antes que a pressão dos mercados
impusesse o pacote. É parte do
que o "Le Monde" ironizou como "Tour d'Europe des plans
de rigueur" (a "Volta da Europa" dos planos de austeridade).
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