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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Fundo Monetário Asiático?
Os países do leste da Ásia estão mais avançados em matéria de cooperação financeira regional
AS ÚLTIMAS duas semanas aqui
no FMI têm sido sobrecarregadas pelo tema da "surveillance", isto é, pela revisão das regras
de monitoramento dos países-membros. É um dos principais temas da agenda do Fundo. A questão
está pegando fogo e pode haver uma
decisão já amanhã. Escrevo este artigo, precariamente, entre uma reunião e outra. Portanto, peço desculpas, leitor, se a coluna sair pior do
que de costume.
Deixo de lado, por enquanto, a
questão da "surveillance", que ainda
é objeto de discussão acirrada neste
momento. Vou tratar de outro assunto que me parece bastante relevante para o Brasil e os demais países sul-americanos: a experiência do
leste da Ásia em matéria de cooperação financeira. É um assunto praticamente ignorado aí no Brasil, mas
de grande relevância para a discussão da integração financeira regional na América do Sul, que envolve,
entre outros aspectos, a provável
formação do Banco do Sul e de um
Fundo Monetário do Sul, atualmente em fase inicial de discussão entre
vários países da nossa região.
Os países do leste da Ásia estão
mais avançados em matéria de cooperação financeira. Integração regional nunca foi o forte dos asiáticos.
Mas a gravíssima crise cambial e financeira de 1997-98 mudou a percepção desses países. Houve descontentamento, e até revolta, com o
modo como os EUA e o FMI abordaram a crise. As recomendações de
política econômica foram consideradas em grande medida contraproducentes. Além disso, parece ter ficado evidente que os EUA estavam
se valendo do Fundo e de outras instituições sediadas em Washington
para promover os seus interesses
nacionais. "O FMI tem feito mais
para promover a agenda comercial e
de investimento dos EUA na Coréia
do que 30 anos de entendimentos
comerciais bilaterais", disse na época Lawrence Summers, então subsecretário do Tesouro do governo
Clinton.
Em setembro de 1997, o Japão
propôs a criação de um Fundo Monetário Asiático. A proposta foi uma
reação aos veementes pedidos de
apoio dos países atingidos pela crise,
mas foi abortada pela forte resistência dos EUA, dos países europeus e
do FMI. A idéia não morreu, contudo. Em 2000, ela foi retomada de
outra forma, mais discreta e mais limitada, e vem sendo gradualmente
desenvolvida desde então. É conhecida como a Iniciativa de Chiang
Mai e começou basicamente pela
criação de uma rede de acordos bilaterais de "swaps", cuja finalidade é
prover financiamento de balanços
de pagamentos em situação de
emergência. Os países participantes
são a China, o Japão, a Coréia do Sul
e os dez membros da Asean, a Associação das Nações do Sudeste Asiático (Indonésia, Tailândia, Malásia,
Filipinas, entre outros).
Em maio deste ano, esses 13 países
resolveram "multilateralizar" a Iniciativa de Chiang Mai, e constituir
um arranjo auto-administrado de
compartilhamento de reservas, governado por um único acordo contratual. Um país que tenha dificuldades de balanço de pagamentos poderá recorrer com mais rapidez a financiamento de emergência, desde
que atenda às condições que forem
negociadas, evitando assim as medidas traumáticas a que foram obrigados durante a crise de 1997-98.
"A volatilidade e o volume dos fluxos de capital é ainda maior do que
há dez anos. É por isso que nós precisamos de um projeto regional para
lidar com o problema", declarou o
ministro das Finanças da Tailândia
ao anunciar, em nome do grupo, a
"multilateralização" da Iniciativa de
Chiang Mai.
Convém prestar atenção ao que
está acontecendo no leste da Ásia.
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR., 52, escreve às quintas-feiras nesta coluna. Diretor-executivo no FMI, representa
um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago).
pnbjr@attglobal.net
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