São Paulo, domingo, 14 de junho de 2009

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ALBERT FISHLOW

Grandes esperanças


Vai demorar pouco para que as recentes previsões sombrias quanto à expansão do Brasil sejam revisadas para melhor

O BRASIL anunciou estatísticas econômicas impressionantes na semana passada. O crescimento real caiu no primeiro trimestre, mas muito menos do que quase todos esperavam. A Selic caiu um ponto percentual na quarta e está agora na casa de um dígito. Os preços das commodities mantiveram alta, o que promete receitas de exportação melhores no futuro, para acompanhar a melhora no influxo de capitais. Vai demorar pouco para que as recentes previsões sombrias quanto ao crescimento brasileiro sejam revisadas para melhor.
Agora, todos estão retornando à posição anterior de que a atual recessão é um problema sério principalmente para os países desenvolvidos -EUA, Europa e Japão. Para a China e a Índia, bem como outros países asiáticos, estão começando a surgir sinais positivos. Até mesmo a Rússia, que sofreu abalo substancial devido a prejuízos recentes, voltará a se beneficiar dos preços do petróleo, que dobraram de dezembro para cá.
Mas nos EUA, igualmente, os sinais de otimismo começam a se acumular. Parece provável uma retomada no segundo semestre. Há indícios de que os preços das casas chegaram ao fim de sua queda. Os programas de gastos públicos, acompanhados por financiamento do Fed, estão só começando a se fazer sentir. Embora o desemprego tenha atingido níveis mais elevados do que se esperava, o alto déficit fiscal que será registrado neste ano e em 2010 virtualmente assegura que não faltará demanda agregada.
Será que essa encorajadora reação americana terminará em breve devido a fortes pressões inflacionárias, juros mais altos, desvalorização do dólar e crescimento limitado? Um aspecto central da resposta será determinar até que ponto os gastos públicos simplesmente substituem os gastos privados, reduzindo o espaço para investimentos produtivos. Se existir capacidade produtiva não utilizada, essa demanda mais ampla propiciada por ação do governo não precisa induzir a consequências desse tipo. Mesmo assim, os juros dos títulos de dívida do governo começaram a subir de forma acentuada.
Também é preciso saber quem financiará esse déficit. Até o momento, boa parte do financiamento vem do exterior, com títulos da dívida americana adquiridos por países que elevaram suas reservas cambiais para acompanhar a expansão de suas exportações. Com baixos juros e uma possível desvalorização do dólar, essa escolha está sendo reconsiderada. Primeiro a China e agora a Rússia indicaram sua preferência por proporção maior de reservas não denominadas em dólares, criadas pelo FMI por meio de Direitos Especiais de Saque.
Boa parte desse desafio tem origens políticas e serve para contestar o poder unilateral dos EUA. O FMI não está em posição de se tornar o banco central do planeta, e o dólar, que responde por quase três quartos das reservas internacionais, não desaparecerá assim tão rápido. Ainda assim, a aversão dos chineses a continuar acumulando títulos da dívida americana pode causar danos.
Nesta semana, dirigentes dos Brics (Brasil, Rússia, Índia e China) se reunirão na Rússia. Indubitavelmente a questão mencionada acima será debatida durante as discussões sobre a reforma do sistema financeiro internacional e a ampliação do Conselho de Segurança da ONU. O Brasil já fechou acordo com Argentina e China para usar moedas nacionais como parte de suas transações comerciais, mas esse fator ainda não pesa muito.
Lula terá sua posição reforçada pela recuperação da economia brasileira e exercerá papel importante para determinar até que ponto esse tema será conduzido no debate.


Tradução de PAULO MIGLIACCI

ALBERT FISHLOW , 73, é professor emérito da Universidade Columbia e da Universidade Berkeley. Escreve quinzenalmente, aos domingos, nesta coluna.

afishlow@uol.com.br


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