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OPINIÃO ECONÔMICA
A quinta-coluna
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Hoje eu preciso falar um
pouco da quinta-coluna. A
quinta-coluna, leitor, é uma grande realidade. A expressão remonta à Guerra Civil Espanhola. Em
1936, enquanto quatro colunas do
general Franco marchavam sobre
Madri, uma outra, a quinta,
atuava dentro da cidade, preparando sub-repticiamente a traição.
Bem. A nossa quinta-coluna
não fica atrás da original. Toda
vez que se esboça uma reação nacional, lá vem ela, infalivelmente,
espalhar as suas ameaças e intrigas e puxar o tapete dos brasileiros que contrariam os interesses
estrangeiros. Todos aqueles que já
fizeram, ou tentaram fazer, algo
em prol do interesse nacional sabem que, frequentemente, é mais
fácil lidar com os estrangeiros do
que os seus inúmeros e influentes
prepostos locais, sempre muito
atuantes dentro e fora do governo.
Nos tempos recentes, porém, a
quinta-coluna tem tido dificuldades inesperadas. Surgiu uma nova
e importante variável: o "companheiro" Bush. O atual presidente
dos EUA, como se sabe, é uma força em estado algo rudimentar.
Não tem apreço por sutilezas e diplomacias. Não acredita em hipocrisias e prefere quase sempre a
sinceridade brutal.
O antigo lema de política externa dos EUA, lançado pelo presidente Theodore Roosevelt há cerca de cem anos -"Speak softly
and carry a big stick, you will go
far"-, foi substituído por: "Speak
loudly and carry a big stick"
-uma variante bem menos eficaz, obviamente.
No que diz respeito às negociações da Alca (Área de Livre Comércio das Américas), por exemplo, o Executivo e o Congresso dos
EUA parecem constantemente
empenhados em proporcionar argumentos adicionais aos críticos
da integração hemisférica. Com o
passar do tempo, torna-se mais e
mais evidente que os EUA só se
dispõem a aceitar uma negociação profundamente desequilibrada. Já deram indicações de sobra
de que não pretendem fazer concessões importantes nos temas de
interesse do Brasil.
Em Washington, prevalecem
sem grandes disfarces o nacionalismo e o protecionismo. Foi-se o
tempo em que um presidente carismático e habilidoso como Bill
Clinton percorria o mundo discursando sobre os benefícios da
"globalização" e da abertura dos
mercados.
Nos primeiros movimentos da
corrida presidencial de 2004, um
aspecto tem chamado atenção:
nem o presidente Bush nem os
pré-candidatos democratas ousam levantar o tema do livre comércio. Todos registraram a lição
das eleições congressuais de 2002:
o protecionismo seletivo e cuidadosamente calibrado foi um sucesso político, que contribuiu de
maneira importante para dar o
controle das duas Casas do Congresso ao Partido Republicano.
Devo dizer, leitor, que em toda a
minha vida nunca vi os partidários do alinhamento com os EUA
tão desorientados. Em entrevista
recente, um daqueles economistas
brasileiros bastante festejados pelos norte-americanos, que ocupou
importante cargo no governo Fernando Henrique Cardoso, criticou as barreiras comerciais impostas pelos EUA a produtos brasileiros. Disse que, em diversas
conversas com lideranças do governo americano, sempre manifestou a sua indignação com o fato de que algumas vezes os americanos ou europeus nos dão rasteiras, fragilizando os argumentos
de pessoas como ele e muitas do
governo Lula, que querem construir uma sociedade aberta.
Realmente, não é fácil defender
uma "sociedade aberta" quando
os líderes políticos e intelectuais
da liberalização se mostram cada
vez menos dispostos a aplicá-la
em casa. Nesse ponto, os americanos sempre operaram muito bem.
Abriram as suas universidades a
economistas e outros estudantes
de países em desenvolvimento,
que foram sistematicamente catequizados quanto às virtudes do livre comércio e do livre mercado.
No entanto quem conhece a política econômica dos EUA, assim
como a dos demais países desenvolvidos, sabe que o liberalismo
raramente foi aplicado a ferro e
fogo. Todas as economias desenvolvidas são economias mistas em
que o Estado desempenha importante papel. Nenhuma delas pratica o livre comércio.
No período Bush, essa assimetria entre doutrina e prática vem
aparecendo de maneira muito
mais clara e desabrida. Daí o silêncio constrangido a que se recolheram ultimamente os numerosos integrantes da quinta-coluna
tupiniquim.
Mas uma coisa me preocupa: e
se os eleitores americanos resolverem não reeleger o "companheiro" Bush em 2004?
Não façam isso, pelo amor de
Deus!
Paulo Nogueira Batista Jr., 48, economista, pesquisador visitante do Instituto
de Estudos Avançados da USP e professor da FGV-EAESP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro "A Economia como Ela É..." (Boitempo Editorial,
3ª edição, 2002).
E-mail - pnbjr@attglobal.net
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