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OPINIÃO ECONÔMICA
Capacidade para crescer
GESNER OLIVEIRA
O Natal de 2004 será o melhor desde 1994, ano do Plano Real. A atividade econômica
ganhou ritmo nessa etapa fácil da
recuperação com base na ocupação da capacidade produtiva instalada. Mas as condições para o
crescimento sustentado ainda
não foram criadas.
É possível que ontem, sexta-feira, 13 de agosto e ainda por cima
Dia do Economista, houvesse algum agoureiro prevendo uma crise iminente. Mas as chances de
um desempenho razoável da economia nos próximos 18 meses são
boas. Os gargalos mais sérios vão
aparecer a partir do último trimestre de 2005.
É prematuro o diagnóstico de
que a utilização da capacidade já
teria atingido nível elevado na
maioria dos ramos industriais,
caracterizando excesso de demanda generalizado.
Como de hábito, as médias enganam. É verdade que, na média,
a utilização de capacidade na indústria aumentou. Chamou a
atenção, em particular, o dado da
Sondagem Conjuntural da Indústria de Transformação da Fundação Getúlio Vargas de 84,2% para
o segundo trimestre do ano. Depurando o efeito sazonal, é o
maior nível desde o primeiro trimestre de 1995.
No entanto, a situação varia
muito entre os diferentes setores e
mesmo dentro de cada segmento.
O quadro nesta página dá uma
idéia dessa heterogeneidade. Foram estudados 16 setores. Para
cada um deles, comparou-se o nível atual de utilização da capacidade com o pico histórico. Este último nem sempre é a melhor referência, especialmente em casos
em que sua ocorrência se deu há
muito tempo, pois o avanço tecnológico permite com freqüência
um melhor aproveitamento do
parque instalado.
De qualquer modo, o exercício
revela que, em metade dos casos
escolhidos, o nível de utilização
da capacidade não pode ser considerado alto. Há situações muito
diferentes dentro de um mesmo
setor. Por exemplo, dentro de material de transporte, o segmento
de caminhões e ônibus registra
baixo nível de utilização, em nítido contraste com aquilo que ocorre em acessórios para veículos.
A continuidade da recuperação
causará, portanto, carências localizadas, mas não a ponto de gerar
pressões inflacionárias generalizadas. Isso é tanto mais provável
em um contexto de maior folga
nos balanços comercial e de transações correntes, permitindo que
as importações cresçam um pouco mais em 2005, induzidas pelo
reaquecimento da atividade.
Apesar da melhora da economia em 2004, o grande desafio da
retomada dos investimentos ainda não foi enfrentado. Isso seria
necessário não apenas para aumentar a capacidade de produção em cada setor específico mas
para atenuar a enorme deficiência da infra-estrutura do país, especialmente nos vários modais de
transporte e portos de escoamento
da produção.
Alerte-se de que uma reação excessivamente conservadora da
política monetária, com a elevação dos juros neste momento, sob
o pretexto de combater um suposto excesso de demanda, teria efeito particularmente nocivo. Isso
porque o investimento seria ainda mais inibido, impedindo o necessário aumento da capacidade
produtiva.
Não é hora de conter a demanda, mas de estimular a oferta. Isso
pode ser feito mediante estímulos
claros para o investimento e a
criação de marcos regulatórios
adequados para a infra-estrutura. Apenas nesse momento será
possível sonhar com a medalha de
ouro do crescimento sustentado.
Gesner Oliveira, 48, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia
(Berkeley), professor da FGV-EAESP, sócio-diretor da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
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