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Mundo começa a ensaiar nova gerência financeira
Líderes dos países integrantes do G20 têm reunião amanhã, em Washington
Principal objetivo da reunião é estabelecer novas regras para assegurar
a estabilidade financeira
e econômica mundial
CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
Um jantar hoje na Casa Branca, em Washington, marca o
início de um processo, certamente longo, de construção de
uma nova gerência para o sistema financeiro global.
Por enquanto, a nova gerência toma o formato do G20, o
clube dos 20 países sistemicamente mais importantes, que
respondem por 85% da economia mundial e por dois terços
da população do planeta.
Hoje, na verdade, serão 22
países, na medida em que a Espanha e a Holanda entraram na
carona oferecida pela França,
que é, ao mesmo tempo, membro do clube e presidente de
turno da União Européia, conglomerado que também integra
o G20.
Não se espere, no entanto,
que o jantar de hoje e a reunião
de amanhã representem o que
alguns líderes e muitos jornalistas chamaram de Bretton
Woods 2. Para começar, Bretton Woods 1 -a reunião que,
em 1944, definiu a gerência financeira ainda vigente, com a
criação do Fundo Monetário
Internacional e do Banco Mundial- foi a culminação de um
processo de negociação de três
anos.
Os encontros de Washington
foram precedidos de apenas
uma reunião preparatória, no
fim de semana, em São Paulo.
Mais: em Bretton Woods, estavam presentes 44 países. Hoje, só os países africanos são 54
-quase todos eles colônias de
potências européias em 1944.
O máximo que as reuniões de
Washington podem oferecer é
uma agenda e um cronograma
para as próximas reuniões.
Uma delas, aliás, já prevista pela União Européia para dentro
de cem dias -ou seja, no fim de
fevereiro ou começo de março,
cerca de um mês e meio depois
da posse de Barack Obama como presidente dos Estados
Unidos, o país que, em crise ou
não, detém a chave de qualquer
negociação.
A questão seguinte óbvia é
saber se Obama aprova ou não
o formato G20. A esse respeito
só há uma indicação -e indireta: Lawrence Summers, da nutrida equipe de assessores econômicos do presidente eleito, é
um dos pais do G20, ao lado do
canadense Paul Martin, ambos
ministros no lançamento do
grupo em 1999.
Summers defendeu o G20
em artigo para uma revista editada pela Universidade de Toronto e seu grupo de estudos
sobre o G20, em número especial dedicado à reunião de São
Paulo.
"O G20 é agora parte importante e estabelecida dos calendários oficiais e da arquitetura
internacional. (...) A cooperação [internacional] tem sido
melhor e as políticas mais sábias por causa da existência do
G20", escreveu.
Na mesma linha de raciocínio, Sebastian Mallaby, pesquisador-sênior do Conselho de
Economia Internacional do
Council on Foreign Relations,
vê na simples realização da cúpula de Washington o principal
resultado dela. Explica: "É a
primeira cúpula do G20, o que
estabelece um padrão, a partir
do qual construir uma presença
que vá além do G8".
Jantar, e não só cafezinho
Até agora, o G20 só reunia
seus ministros de Finanças e
presidentes de bancos centrais,
não os chefes de governo. A alusão ao G8 se deve ao fato de que
a gerência política do planeta
ficou mais ou menos nas mãos
desse pequeno grupo de sete
países ricos mais a Rússia.
Se o G20 tomará o lugar do
G8, como apostam Mallaby e o
governo brasileiro, é uma questão em aberto, que possivelmente será discutida pelos líderes reunidos em Washington.
O problema é de que G20 se
está falando.
Quando Summers o elogia,
possivelmente está pensando
no G20 que ajudou a criar, como instrumento para que os
países emergentes assimilassem lições do mundo rico e se
comportassem como o mundo
rico gostaria.
Diz, por exemplo, Xaiojin
Chen, do Instituto de Tecnologia Internacional e Economia
da China: "Tanto o G8+5 como
o G20 têm a função de legitimar iniciativas do G8 para um
universo mais amplo e de angariar suporte mais amplo para
idéias geradas no G8. É assim
difícil imaginar que o G20 possa ter qualquer influência independente".
O G8+5 é a reunião entre o
G8 e cinco países emergentes
(o Brasil entre eles), em que os
emergentes aparecem no final,
"para tomar um cafezinho", na
expressão usada na semana
passada pelo ministro brasileiro da Fazenda, Guido Mantega.
Já na visão do governo brasileiro, o G20 seria a maneira de
integrar os emergentes para a
refeição completa.
Na reunião de São Paulo, o
G20 ganhou um selo de qualidade. O comunicado final diz
que o grupo, "com sua ampla
representação das maiores economias sistemicamente importantes, tem um papel crucial a
desempenhar para assegurar a
estabilidade financeira e econômica global".
Mas não ganhou o rótulo de
substituto do G8 nem do G8+5.
Washington pode representar um avanço nesse sentido.
Pelo menos, os emergentes jantam com os ricos, em vez de serem servidos apenas do cafezinho.
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