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G20 acena com medidas heterodoxas
Ministros das Finanças não detalham propostas, mas falam em estimular demanda e atacar problema de "ativos tóxicos"
Dirigentes do G20 também concordam em unir esforços para elaborar medidas efetivas e aperfeiçoar mecanismos de regulação
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A LONDRES
Os ministros da Fazenda e
presidentes de bancos centrais
do G20 (as maiores economias
do mundo) anunciaram ontem
a disposição de adotar até "instrumentos não-convencionais
de política" [monetária] na ânsia de enfrentar uma crise que o
diretor-gerente do FMI (Fundo Monetário Internacional),
Dominique Strauss-Khan, batizou de "A Grande Recessão".
Alistair Darling, ministro do
Tesouro britânico e, como tal, o
anfitrião da reunião do G20,
disse que os participantes reconheceram a dimensão da crise:
"Não há ninguém no mundo
que não reconheça que se trata
do maior desafio que o mundo
enfrenta em gerações".
O problema é que foram pouco específicas as respostas desenhadas ontem pelos responsáveis financeiros por países
que respondem por cerca de
85% da economia global.
Mesmo os "instrumentos
não-convencionais" não foram
especificados nem na declaração final nem nas entrevistas
coletivas posteriores.
Darling deixou a cargo de cada país a escolha dos instrumentos, convencionais ou não,
ao afirmar que "o modelo tamanho único não é o enfoque mais
apropriado". Mas, em certo
momento, lembrou a política
que o Banco da Inglaterra adotou na semana passada, de
comprar, em vez de vender, títulos em poder de investidores.
Trata-se, na prática, de injetar dinheiro diretamente na
veia da economia, para superar
a trombose do sistema financeiro, na medida em que a expectativa é a de que os investidores usem o dinheiro recebido
para colocá-lo no jogo econômico, movimentando a demanda. Mas Darling fez questão de
dizer que não houve, durante a
reunião de ministros, sermões
sobre cada qual deveria fazer.
A Folha perguntou a Timothy Geithner se ele podia
dar ao menos um exemplo concreto de "instrumento não-convencional" de política monetária. Geithner fugiu: "Acho
que você deveria fazer a pergunta aos nossos banqueiros
centrais".
Seja qual for a heterodoxia,
não é a estatização de bancos
ou de outras empresas que receberam ou ainda vão receber
dinheiro público.
O comunicado final é claro
em afirmar que "as companhias", de modo geral, ficam
melhor no "setor comercial",
ou seja, em mãos privadas.
Receita
De todo modo, a reunião de
ontem cobriu todos os temas
previstos, divididos em três
grandes áreas: estimular a demanda, virtualmente congelada na maior parte dos países do
G20, em especial nos grandes;
reformar as instituições financeiras internacionais, inclusive
pelo aperfeiçoamento da regulação/supervisão; e atacar o
problema dos chamados "ativos tóxicos", cuja remoção do
sistema financeiro é condição
preliminar para que os bancos
voltem a emprestar dinheiro,
sem o qual a economia obviamente não funciona.
Tanto nos comunicados emitidos após a reunião como nas
entrevistas houve empenho em
falar em coordenação internacional e em demonstrar unidade entre os participantes -uma
maneira de enfrentar o noticiário da semana que fazia uma
contraposição entre Europa e
Estados Unidos.
Estes insistiram em novos
pacotes de estímulo à economia, enquanto os europeus diziam que já haviam feito o necessário e era preciso esperar o
efeito do já decidido.
Fla-Flu financeiro
Mas esse Fla-Flu econômico-financeiro, tal como a Folha
havia antecipado ontem, terminou em empate: o documento fala em "tomar qualquer
ação que seja necessária até
que o crescimento seja restaurado". Geithner traduziu esse
trecho na seguinte frase:
"Quanto mais forte for a resposta [à crise] mais cedo se dará a recuperação". Em tese,
portanto, deu-se por satisfeito
com os termos do comunicado
distribuído ontem.
Os europeus também ficaram satisfeitos, na medida em
que está prometida uma regulação/supervisão abrangente
de todas as instituições, mercados e instrumentos financeiros
"sistemicamente importantes"
-tal como insistiram líderes
europeus como Nicolas Sarkozy (França) e Angela Merkel
(Alemanha).
Os europeus culpam os "hedge funds" e os mercados de derivativos pela crise -e dizem
que esse tipo de instrumento
opera basicamente a partir dos
Estados Unidos. Ou de paraísos
fiscais que também entraram
na mira das críticas.
Não faltou a menção ritual à
necessidade de "lutar contra
todas as formas de protecionismo", tal como já havia ocorrido
na cúpula do G20 de Washington. Compromisso que passa
alegremente por cima do fato
de que, depois dessa cúpula, 19
países do G20 adotaram medidas de alguma forma protecionistas, de acordo com os cálculos de Carla Hills, ex-chefe do
Comércio Exterior norte-americano.
Agora, caberá aos chefes de
governo, que se reúnem sempre em Londres, no dia 2 de
abril, pôr carne política e números econômicos nos compromissos de seus ministros.
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