São Paulo, sexta-feira, 15 de junho de 2007

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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

Uma nova velocidade de crescimento

Considero a expansão do PIB de 4,3% bastante boa se observarmos as amarras que ainda existem na economia

O IBGE divulgou na última quarta-feira os números referentes ao crescimento da economia no primeiro trimestre do ano. Essas informações têm uma importância especial por serem divulgadas segundo metodologia mais acurada de cálculo, implantada no ano passado. Parte dos analistas ficou decepcionada com o crescimento de 4,3%, em relação ao primeiro trimestre do ano passado. O próprio presidente da República mostrou-se um pouco decepcionado, pois esperava algo próximo de 5%.
Considero o número de 4,3% bastante bom se observarmos as amarras que ainda existem na economia. Analisando os detalhes desse crescimento médio, essa observação fica ainda mais reforçada. Duas coisas chamam a atenção: em primeiro lugar, o aumento expressivo dos itens principais do investimento privado; em segundo, a crescente participação das importações na oferta de produtos comercializáveis em nosso mercado interno. São essas duas informações que nos permitem ficar razoavelmente tranqüilos em relação ao vigor do crescimento do consumo privado -perto de 6% ao ano- nesse período.
Em outras palavras, estamos vendo, pela primeira vez em muitas décadas, um aumento expressivo do consumo interno sendo acompanhado por um aumento quase paralelo da oferta, evitando uma repetição do chamado vôo de galinha. Essa imagem muito feliz procurava associar a incapacidade que tínhamos de ter um crescimento da oferta interna em linha com o aumento do consumo dos brasileiros, em momentos de crescimento mais acelerado. A fragilidade no balanço de pagamentos era o fator crítico, que levava ao ciclo de desvalorização cambial, inflação e choque de juros, já que o Banco Central era obrigado a abortar o crescimento.
Na ata da última reunião do Copom, divulgada no momento em que escrevo esta coluna, temos pela primeira vez um reconhecimento explícito da predominância do canal externo por nossa autoridade monetária. Aliás, essa é a causa principal apontada para a volta das reduções de meio ponto percentual na taxa Selic. Como se dizia antigamente, "água mole em pedra dura tanto bate até que fura". Depois de meses em que um grupo de economistas -no qual me incluo- vinha chamando a atenção para essa nova dinâmica do lado da oferta, é muito bom ver o Banco Central incorporando essas observações nas suas decisões. Somos uma economia aberta de fato, experimentando de forma inédita os efeitos da globalização em nosso mercado de bens. E essa situação traz uma nova dinâmica à economia que precisa ser reconhecida.
Com relação à decepção de nosso presidente, cabe lembrá-lo que, apesar de uma taxa de crescimento do PIB duas vezes superior à da última década, ainda há amarras estruturais que emperram a economia.
Oxalá a decepção do presidente da República o faça acordar de sua paralisia e o leve a liderar uma agenda de reformas, por menor que seja, para melhorar nosso ambiente de negócios. É preciso usar a oportunidade aberta pela economia mundial para melhorar a competitividade sistêmica da economia. O caso do Japão é ilustrativo. Após quase uma década de expansão fiscal, que levou as contas públicas do país à pior situação entre os países do G7, o governo está usando o vento de cauda da China para restaurar sua saúde financeira. Infelizmente, a preocupação com o futuro parece ser contrária ao DNA dos que hoje ocupam o poder em Brasília, como deixou claro ontem a ministra do Turismo.


LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 64, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).
lcmb2@terra.com.br


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