|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
COMÉRCIO EXTERIOR
Bloco europeu anuncia redução nos subsídios ao açúcar, e usineiros estimam aumentar exportações
País espera ter US$ 300 mi com decisão da UE
CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
O Brasil ganhará cerca de US$
300 milhões em exportações adicionais de açúcar, apenas no primeiro momento de vigência das
novas medidas da União Européia, que anunciou ontem um pacote de substanciais reduções no
protecionismo a seus produtores.
O cálculo é de um eufórico
Eduardo de Carvalho, presidente
da Unica (União da Agroindústria Canavieira de São Paulo), que
reúne 98 associados, responsáveis
por 65% da produção brasileira
de açúcar.
Tão eufórico que considerou o
pacote europeu a "Queda da Bastilha" do açúcar, em alusão ao fato
de que se deu num 14 de julho,
exatamente a mesma data da queda da verdadeira Bastilha, na Revolução Francesa, no século 18.
As contas são fáceis de fazer: a
Europa reduzirá as exportações
subsidiadas de 2,4 milhões para
apenas 400 milhões. Abre-se, portanto, um espaço de 2 milhões de
toneladas a ser preenchido por
outros produtores. O Brasil, que
já é o maior exportador de açúcar
e o segundo maior de açúcar refinado (depois da Europa), ficará
com entre 50% e 60% desse total,
o que dá de 1 milhão a 1,2 milhão
de toneladas.
"A US$ 250 a tonelada, ganharemos, no primeiro momento, algo
em torno de US$ 250 milhões a
US$ 300 milhões", fecha a conta o
presidente da Unica.
A reforma européia começará
em julho de 2005 e prevê, além da
redução dos subsídios à exportação, um corte no preço mínimo
pago aos produtores, dos atuais
632 por tonelada para 241 em
duas etapas em três anos.
A produção européia se reduzirá, em quatro anos, de 17,4 milhões de toneladas para 14,6 milhões de toneladas.
Mas o ganho brasileiro pode ser
mais imediato. Nas negociações
entre o Mercosul e a União Européia, que continuam a partir de
segunda-feira em Bruxelas, o bloco do Sul vai pedir acesso ao mercado europeu do açúcar, que continuará fechado mesmo após a reforma.
Sabe que não vai levar, a não ser,
eventualmente, na forma de cota.
Nesse caso, o Mercosul pedirá
uma cota de 1,8 milhão de toneladas, que é quase a quantia (2 milhões de toneladas) que os europeus deixarão de exportar com
subsídios.
Mesmo que não ganhe cota de
açúcar, o Mercosul terá cota para
etanol, álcool combustível que é
produzido a partir da cana-de-açúcar e do qual o Brasil é o maior
produtor mundial.
Sinal político
A Comissão Européia deu ao
novo plano para o açúcar o caráter de mensagem política, assim
transmitida por Arancha González, a porta-voz para Comércio:
"Quando falamos que estamos
fazendo reformas, é porque estamos de fato executando-as".
Tradução: a Europa cansou-se
de ser a vilã eterna em todas as negociações comerciais, pelo seu
protecionismo agrícola, e resolveu sair ao ataque, com o que coloca na defensiva os EUA (o outro
país que usa e abusa do protecionismo agrícola).
Não por acaso, o comissário europeu para o Comércio, Pascal
Lamy, tomou a iniciativa de mencionar o algodão, outro produto
agrícola hiper-sensível, durante a
reunião do fim de semana em Paris entre os chamados cinco grandes parceiros da negociação comercial global (UE, EUA, Brasil,
Austrália e Índia).
Disse que era preciso, no bojo
da negociação agrícola da Organização Mundial do Comércio, dar
"visibilidade setorial" ao algodão.
Motivo: os EUA subsidiam seus
produtores, o que deprime os preços, arruina os cotonicultores
africanos e causa fortes prejuízos
aos brasileiros. Por isso, o Brasil
entrou com reclamação na OMC
e ganhou, mas os EUA recorrerão.
A mensagem de Lamy e o novo
plano europeu para o açúcar se
cruzam assim: Brasil, Tailândia e
Austrália (também grandes produtores de açúcar) entraram com
queixa contra os subsídios europeus ao açúcar, em caso que deverá ter uma primeira decisão ainda
neste mês, e a sua formalização,
em setembro.
A União Européia sabe que vai
perder, como os Estados Unidos
perderam. Então, antecipa-se, faz
sua reforma e deixa os norte-americanos como os grandes vilões.
Texto Anterior: O vaivém das commodities Próximo Texto: Brasil oferecerá vantagem em concorrências Índice
|