São Paulo, domingo, 15 de setembro de 2002

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COMÉRCIO EXTERIOR

País não vai poder contar com queda das importações no próximo ano para obter superávit maior

Sem vender mais, país lucra menos em 2003

JOSÉ ALAN DIAS
DA REPORTAGEM LOCAL

O Brasil não poderá depender somente da contração das importações em 2003. Se quiser obter o superávit comercial de US$ 9 bilhões que pretende, o país terá de exportar mais e não deixar que a taxa de câmbio se aprecie para manter os produtos brasileiros competitivos e evitar nova onda de importações. E, por mais paradoxal que seja, contar que a economia cresça pouco.
A Folha colheu pesquisas preparadas por bancos e instituições ligados ao setor. O ponto comum é que qualquer tentativa de saltar de US$ 7 bilhões, a previsão oficial de superávit deste ano, para US$ 9 bilhões em 2003 passa pelo aumento de exportações.
Pelas projeções do BBV, o superávit no próximo ano será de US$ 8,8 bilhões. O banco espanhol baseia sua análise nos seguintes termos: o fluxo de investimento estrangeiro direto (IED) se manterá em declínio -deve cair de US$ 16 bilhões, a estimativa para este ano, para US$ 15 bilhões. Nessas circunstâncias, para fechar suas contas externas, o Brasil teria dois caminhos: ou continuar a depreciar a taxa cambial (hipótese que qualifica como pouco provável) ou estabelecer o crescimento da economia entre 2% e 3%.
"Esse crescimento menor do PIB não permite que ocorra tanta pressão por aumento de importações", diz Fernando Honorato Barbosa, economista do BBV.
Em 2002, o motivo reconhecido até pelo governo para o desempenho na balança comercial é simples: a brutal queda nas importações (18,1%, no acumulado até agosto), que compensou, com margem, os 6% de recuo no volume em dólares das exportações.
Embora estime que as importações devam aumentar em 5% no próximo ano, o banco calcula que o valor arrecadado com as exportações vai subir em 9,7%, o suficiente para compensar esses gastos e permitir o superávit próximo ao pretendido pelo governo.
"Não é um número exuberante, mas possível", diz Barbosa. "Se a Argentina emitir qualquer sinal de melhora, as exportações vão crescer", completa. Segundo a Secex (Secretaria de Comércio Exterior), de janeiro a julho, a queda das vendas para a Argentina representou 81,8% da redução total das exportações brasileiras -ou perda de US$ 2,1 bilhões.
A Global Invest prevê que o superávit comercial em 2003 alcance US$ 9,6 bilhões. Nas estimativas da consultoria, o deste ano ficará em US$ 7,9 bilhões.
Assim como o BBV, os analistas da Global Invest usam a premissa de que a economia não pode se expandir além de níveis modestos. "Se crescer mais de 3%, não conseguimos obter o superávit [oficial de US$ 9 bilhões] em 2003", diz Fernando Ferreira, da Global Invest. "Não conseguiremos porque a taxa de câmbio vai se valorizar. Em vez de exportar, as empresas vão querer vender mais aqui dentro."
O economista também aposta que o preço das commodities voltará a subir nos próximos meses, o que teria impacto direto no resultado de países como Brasil e Argentina, grandes exportadores de produtos agropecuários. "Uma alta de 10% na cotação das commodities significa, no nosso caso, ganho extra de exportações de US$ 3 bilhões", comenta.
De acordo com Ferreira, "como o Brasil não faz o ajuste por custo (de produção) que é correto, acaba fazendo por câmbio".
Para ele, o governo não deveria, mesmo em períodos de crescimento econômico, permitir que o real se valorize diante do dólar. "Câmbio de R$ 2,50 e R$ 2,60 é ilusão. O real precisa ficar desvalorizado, e não estar desvalorizado. Não há como se firmar como país exportador se a busca ao mercado externo obedece a ciclos de alta e baixa da moeda", afirma.
Pelas contas do HSBC, que considera taxa de câmbio em R$ 3 por dólar, o superávit da balança comercial no ano que vem chegará a US$ 10 bilhões -que incluiria aumento das exportações e melhora nos preços das commodities.

Dissidência
A avaliação da Funcex (Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior) é de que, mesmo com as prerrogativas de crescimento de 3% do PIB, taxa de câmbio entre R$ 2,80 e R$ 2,90 e recuperação da economia (e comércio) mundial, "se o país for capaz de repetir superávit similar ao de 2002 [US$ 7 bilhões], será ótimo resultado".
A fundação prevê que a queda nas importações encontrou o chamado "piso" e que, a despeito do processo de substituição de importações, os valores gastos com esse item deverão subir 10%.
"Se isso ocorrer", diz relatório da Funcex, "para sair de um superávit de US$ 7 bilhões para US$ 9 bilhões em 2003, seria necessário crescimento das exportações na casa dos 12%, o que não é absolutamente trivial".
Taxa similar verificou-se apenas em 2000, antes da freada da economia global.
Por fim, conclui, "isso [superávit de US$ 9 bilhões] dependeria de fatores com os quais não se conta nesse momento: crescimento vigoroso no comércio mundial, aumento expressivo dos preços das commodities e substituição maior das importações".


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