São Paulo, domingo, 15 de novembro de 2009

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Reunião Lula-Kirchner tenta reduzir tensão

Em encontro marcado para a próxima quarta, em Brasília, governantes devem procurar saída para impasse comercial

Atrito começou com entrave argentino a importações de 14% da pauta exportadora brasileira; Brasil retaliou sobre 10% da pauta vizinha

SILVANA ARANTES
DE BUENOS AIRES

"Esse tango se baila a dois" é a expressão usada na Argentina para situações em que os parceiros não querem se deixar.
É também o resumo do desfecho que o lado argentino espera para a reunião dos presidentes Lula e Cristina Kirchner, que ocorre na próxima quarta, em Brasília, cercada por elevada tensão na relação comercial entre os dois países.
"Não é a primeira vez que acontece [a tensão bilateral] e certamente não será a última. Tivemos muitas situações parecidas no passado. Sempre as autoridades máximas dos dois países se reuniram e encontraram soluções mais ou menos satisfatórias para ambas as partes", afirma Juan Cantarella, gerente-geral da Associação de Fábricas Argentinas de Componentes, que representa o setor de autopeças.
O problema é que, desta vez, a solução "mais ou menos satisfatória" parece distante. "Houve mudança de atitude da administração Lula, que sempre foi muito complacente [com a Argentina]. Acho que acabou a paciência do governo brasileiro", diz o consultor Dante Sica, ex-secretário de Indústria e Comércio da Argentina.
Na opinião de Sica, "a gota d'água foi a falta de previsibilidade, ocasionada pelo tempo que a Argentina demora para liberar as licenças não automáticas de importação" exigidas, desde outubro de 2008, para produtos que conformam 14% das exportações brasileiras ao país vizinho.
Segundo as regras da OMC (Organização Mundial do Comércio), a liberação das licenças deve ocorrer num prazo máximo de 60 dias.
A Argentina leva, em média, 150 dias para autorizar a entrada de produtos brasileiros. Há demoras de até 300 dias na autorização de pedidos do setor têxtil, segundo informações repassadas pelo empresariado brasileiro ao governo.
A reação brasileira veio na mesma moeda, impulsionada pela conjuntura de "um ano eleitoral, em que Lula tem menos margem para frear as reclamações do empresariado, cuja visão é muito mais amistosa em relação a uma candidatura de Serra do que a qualquer outra", segundo opina Sica.
O Brasil aplicou, em outubro passado, o sistema de licenciamento não automático a 35 produtos, que abarcam 10% da pauta exportadora argentina ao país, incluindo itens do setor automotivo, que responde por 40% das exportações vizinhas.
A medida surpreendeu e irritou a Casa Rosada, que convocou o embaixador do Brasil em Buenos Aires, Mauro Vieira, para uma reclamação formal.
Na conversa com Vieira, o secretário de Comércio e Relações Econômicas Internacionais da chancelaria argentina, Alfredo Chiaradía, condenou a forma como o Brasil implementou sua decisão -sem claro aviso prévio, surpreendendo na fronteira caminhões carregados com produtos perecíveis, como frutas.
O argumento de Chiaradía é que a Argentina avisa previamente os setores afetados por suas restrições e jamais pôs em risco produtos perecíveis.
Vieira retrucou com a tese de que o setor calçadista brasileiro considera que a sazonalidade do consumo de seu produto lhe dá também o caráter de "perecível" e citou os prejuízos de quem viu sua coleção de verão chegar à Argentina no inverno.
"Temos a mesma opinião da chancelaria argentina: essa medida da parte do Brasil tem o sentido de uma represália, porque os produtos que ficaram retidos nas fronteiras não pertencem a setores que o Brasil precisa proteger", diz Adriano De Fina, gerente da Aiera (Associação de Importadores e Exportadores da República Argentina), que agrupa pequenas e médias empresas.
Procurado, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, que determinou a aplicação das licenças não automáticas, disse que não iria se pronunciar sobre a questão antes da reunião presidencial.


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