São Paulo, sábado, 16 de janeiro de 1999

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MERCOSUL
Governantes e empresários do maior vizinho do Brasil temem que balança comercial do país seja prejudicada
Argentinos estão apreensivos

MAURÍCIO SANTANA DIAS
de Buenos Aires

A Argentina viveu ontem um dia de sobressaltos. Depois de receber na tarde de quinta-feira uma nota do Banco Central brasileiro que garantia categoricamente a manutenção da banda cambial, na manhã seguinte o real passou a flutuar livremente.
A nova desvalorização do real coloca em risco vários setores da produção argentina, na medida em que aumenta a competitividade dos produtos brasileiros e inibe as exportações argentinas para o Brasil, seu principal sócio do Mercosul.
O presidente argentino, Carlos Menem, avançou a proposta de uma moeda única para a região, baseada na paridade com o dólar, como o peso. Na prática, uma dolarização.

Dificuldades
O ministro da Economia, Roque Fernández, alertou o presidente de que seria muito difícil fazer funcionar esse mecanismo, mas prometeu analisar a proposta.
O economista Roberto Lavagna, ex-secretário de Indústria e Comércio e atual presidente da Ecolatina, disse à Folha que "tudo é ainda muito provisório, e vai depender de como vai ficar o câmbio -ou se haverá inflação".
Lavagna sugere que os países do Mercosul adotem "restrições voluntárias às exportações" a fim de salvaguardar o comércio na região -tal como o que foi acertado entre os Estados Unidos e o Japão.
Lavagna salienta que esse seria um mecanismo transitório, e o menos traumático para as economias do bloco.
Uma outra saída compensatória, pleiteada pela maioria dos empresários argentinos, seria a redução dos aportes patronais combinada a um aumento das tarifas alfandegárias -"um enorme retrocesso", na opinião do economista.
Consultado sobre o possível cenário brasileiro para a próxima semana, Lavagna disse esperar "uma reestruturação da dívida e a fixação de uma nova banda cambial, que deverá ficar entre R$ 1,50 e R$ 1,60 por dólar", descartando um hipotético "plano de convertibilidade brasileiro" -defendido, por exemplo, pelo economista e ex-ministro Domingo Cavallo.

A posição do governo
Funcionários do governo argentino não acreditam que a desvalorização do real vá ocasionar uma avalanche de produtos brasileiros em seu país.
O secretário de Política Macroeconômica, Rogelio Frigerio, assegurou que, por enquanto, o governo não vai tomar nenhuma medida preventiva contra a mudança da política cambial brasileira.
"A experiência argentina diz que uma desvalorização nominal não implica uma melhora da competitividade; a Argentina se tornou muito mais competitiva quando fez a convertibilidade, e não quando desvalorizou", declarou Frigerio à Folha.
No entanto, caso a situação no Brasil se agrave e saia de controle, o secretário admitiu a necessidade de negociações entre os parceiros do Mercosul.
"Se se mantém esse quadro, e se houver uma avalanche, teremos que dialogar (ambos os governos) para que as relações comerciais do Mercosul não deteriorem", assegurou.
Indagado sobre a solicitação dos empresários, que pedem maior proteção ao governo, Frigerio disse que "qualquer alteração terá de ser analisada setor a setor, dentro dos acordos do Mercosul".

Euforia nas Bolsas
A despeito da onda de instabilidade e incerteza, o mercado financeiro argentino reagiu à situação com euforia, estimulado pela alta de 33,39% do Bovespa. O índice Merval registrou ontem uma subida de 12,26%.



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