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São Paulo, domingo, 16 de fevereiro de 2003

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TRABALHO

Juros, corte de investimentos e baixo crescimento devem elevar taxa de pessoas sem emprego a níveis recordes em 2003

Lula enfrenta maior desemprego da história

CLAUDIA ROLLI
FÁTIMA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai enfrentar, no primeiro ano de mandato, a maior crise de desemprego da história do país. Ao considerarem as medidas já anunciadas pelo novo governo, como a elevação dos juros e o corte de investimentos, economistas que acompanham o mercado de trabalho são unânimes: o desemprego vai disparar em 2003.
Ninguém consegue prever um crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) superior a 2%, número já considerado otimista. Com esse desempenho, o país não consegue se movimentar a ponto de elevar a oferta de emprego para absorver 1,5 milhão de pessoas que entram anualmente no mercado de trabalho, além de parte dos desempregados -são cerca de 12 milhões no país.
Nem mesmo o Cesit (Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho), da Unicamp, universidade que reúne profissionais com idéias próximas às do PT, consegue ver um ano melhor para o trabalhador. A taxa de desemprego na região metropolitana de São Paulo -que, na média do ano passado, foi de 19% sobre a PEA (População Economicamente Ativa), segundo o Dieese- ficaria, segundo as projeções da Unicamp, entre 20% e 21% neste ano. É um recorde histórico desde 85, quando a pesquisa foi iniciada.
"As projeções para o mercado de trabalho são bem pessimistas porque o país vai crescer pouco", afirma Anselmo Luís dos Santos, do Cesit. Para que consiga elevar a oferta de vagas, diz, o Brasil teria de crescer entre 4,5% e 5% ao ano. Só assim o governo conseguiria criar 10 milhões de postos de trabalho, com e sem carteira, como prometeu em sua campanha.

Relação inversa
Para estimar o comportamento do mercado de trabalho neste ano, o Cesit considerou a relação PIB/taxa de desemprego no período de 1996 a 2002. "É uma relação inversa. Quando o PIB cai, o desemprego aumenta. Se o país cresce, a taxa de desemprego recua", explica Santos.
Estudo da Secretaria do Trabalho da Prefeitura de São Paulo (PT) mostra que, no período de 1992 a 2002, para cada ponto percentual de queda do PIB -de 2% para 1%, por exemplo-, a quantidade de desempregados sobe 14,1 pontos percentuais nas seis regiões metropolitanas do país.
Se o PIB cresce um ponto percentual, de 1% para 2%, a quantidade de desempregados cai 3,2 pontos percentuais. O impacto é diferente porque, se a economia vai mal, o fechamento de vagas é acelerado. Mas, se o país cresce, as contratações já não ocorrem no mesmo ritmo das demissões, pois as empresas tendem a ser mais cautelosas nas admissões.
O Dieese, que faz pesquisa mensal de emprego e desemprego em São Paulo e em algumas regiões metropolitanas do país, também está pessimista. "A taxa de desemprego vai continuar em patamar alto, com ligeira tendência de crescimento em 2003", diz Sérgio Mendonça, coordenador técnico do Dieese. "O governo, que é mais otimista, prevê crescimento de 2,8% para o país neste ano. Se essa projeção se confirmar, o desemprego fica estável ou cresce", diz. Vale lembrar que a taxa recorde de desemprego em São Paulo, medida pelo Dieese, foi de 19,3% em 99 -quando o país sofreu os efeitos da desvalorização do real.
O mercado de trabalho pode encolher ainda mais neste ano, diz Mendonça, porque mais pessoas deverão buscar emprego. Motivo: estão mais otimistas com o governo Lula. Isso faz a PEA crescer, o que significa mais pressão sobre as taxas de desemprego.
Na opinião dos economistas ouvidos pela Folha, o novo governo enfrentará a elevação do desemprego porque não tem como escapar dos efeitos de uma crise mundial -agravada com a provável guerra entre os EUA e o Iraque- e da necessidade de mostrar credibilidade ao país e ao exterior, de conter a inflação e de implementar as reformas trabalhista, tributária e previdenciária.
"Esses cenários externo e interno nos levam a prever um primeiro semestre com baixo ritmo de atividade. A inflação está mais difícil de reduzir do que se previa. Também foi uma surpresa a elevação dos juros. A ameaça de guerra agrava essa situação", diz Francisco Eduardo Pires de Souza, coordenador do Boletim de Conjuntura da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
A avaliação do economista Roberto Sobreira, da FGV, é a mesma. "Com esse ambiente, a capacidade de criar postos de trabalho fica comprometida até o primeiro semestre de 2004. O governo não será capaz de dar um choque de emprego nos dois últimos anos de mandato." Ele prevê para o país, em 2003, taxa de crescimento entre 1,2% e 1,4% e elevação de cerca de um ponto percentual nas taxas de desemprego.

Impacto dos juros
A decisão da equipe econômica do governo Lula de aumentar a taxa de juros (Selic) de 25% para 25,5% tem forte impacto no desemprego. Conforme estudo da Secretaria do Trabalho de São Paulo, entre dezembro de 1999 e dezembro de 2002, para cada aumento de um ponto percentual nos juros, houve incremento de 0,7 ponto na taxa de desemprego na cidade de São Paulo. Significa dizer que o desemprego aumentou em 39,9 mil pessoas -ou um estádio do Pacaembu lotado.
Para Flávio Castello Branco, coordenador de política econômica da CNI (Confederação Nacional da Indústria), a indústria vai elevar o número de empregos se o país crescer acima de 4%. "Sem essa expansão, não há estímulo para contratações." No ano passado, a indústria brasileira reduziu em 0,12% o número de pessoas empregadas. Para 2003, esse quadro se mantém -isto é, na melhor das hipóteses, o número de empregos fica estável.



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