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COMÉRCIO MUNDIAL
Graça Lima diz que subsídios agrícolas e poder demais ao Senado dos EUA são os mais novos empecilhos
Para Brasil, onda negativa emperra acordos
ENVIADO ESPECIAL A MADRI
Uma "conspiração de motivos
negativos" está emperrando todas as três grandes negociações
comerciais em que o Brasil está
envolvido, na opinião do embaixador José Alfredo Graça Lima,
um dos mais experientes negociadores do Itamaraty.
O mais recente motivo a compor a "conspiração" foi a decisão
de anteontem do Senado norte-americano de manter os seus poderes para aprovar apenas as partes que considerar de interesse
dos EUA dos acordos comerciais
que o Executivo vier a negociar.
A decisão torna muito difícil
avançar na criação da Alca (Área
de Livre Comércio das Américas,
que deve abranger os 34 países
americanos, excluído Cuba).
Os países latino-americanos,
Brasil à frente, temem negociar
com Washington se o Congresso
dos Estados Unidos mantiver o
poder de fatiar qualquer acordo
alcançado, preservando apenas as
partes tidas como boas para os
EUA, mas que podem ser ruins
para os demais.
Antes mesmo da votação de terça-feira, a negociação da Alca estava se dando em "ambiente muito deteriorado", conforme relatou
a seus colegas o embaixador Clodoaldo Hugueney, recém-promovido a negociador-chefe do
Brasil, ao chegar ontem a Madri.
Hugueney veio direto do Panamá, onde os países que comporão
a Alca tentavam, sem grandes
avanços, definir de uma vez os
métodos e modalidades que permitirão, a partir de 2003, elaborar
as propostas de redução das tarifas de importação -a cereja do
bolo em qualquer acordo de livre
comércio.
Incentivos demais
A causa da "deterioração", pelo
menos a mais recente, é a "farm
bill" recém-aprovada pelo Congresso norte-americano, que, pelos cálculos preliminares do Itamaraty, embute subsídios de US$
19 bilhões por ano (além dos já
existentes).
Com tanto incentivo, os produtores agrícolas norte-americanos
produzirão o que precisam e até o
que não precisam, o que fatalmente bloqueia a entrada da produção brasileira (e de outros países latino-americanos também
competitivos no setor, como a Argentina) tanto no mercado dos
EUA como em terceiros países.
"A recém-aprovada legislação
agrícola [norte-americana" produzirá não só impactos graves nas
exportações dos países que, como
o Brasil, possuem um setor agrícola altamente competitivo, mas
também sinaliza o menor compromisso norte-americano com a
agenda agrícola nas negociações
em curso na OMC (Organização
Mundial do Comércio) e na Alca", diz nota oficial do Itamaraty.
A nota aponta para a "conspiração de motivos negativos" apontada por Graça Lima: as reticências dos Estados Unidos (e também da Europa) em ceder na parte agrícola atrapalham não apenas
a negociação na Alca mas também a liberalização comercial planetária definida, no papel, durante a Conferência Ministerial da
OMC realizada em Doha, em novembro passado.
Não é uma visão restrita ao âmbito diplomático. O empresário
Roberto Teixeira da Costa, que
acompanha todas as negociações
comerciais globais e é membro do
Ceal (Conselho de Empresários
da América Latina), acaba de voltar de Genebra com uma avaliação similar.
"O sentimento que trago de Genebra é o de que as coisas não vão
acontecer com a velocidade que
se imagina. Pôr em prática o que
foi decidido em Doha é bem mais
difícil do que se pensa", diz.
"Conspiração"
Se a Alca emperra, se as negociações na OMC serão mais difíceis do que inicialmente imaginado, restaria, entre os acordos que
o Brasil busca, o entendimento
com a União Européia.
Mas nem esse escapa da "conspiração" vista por Graça Lima,
com a autoridade de quem está
assumindo o posto de representante brasileiro na União Européia, em Bruxelas.
"Os europeus mantêm a disposição de negociar, mas com um
olho no retrovisor", diz o embaixador. E o "retrovisor" mostra,
primeiro, que a crise do Mercosul
impede qualquer avanço em negociações comerciais. Em segundo lugar, mostra que, "se a Alca
não avançar, a Europa, sem sentir
pressão pela perda de fatias de
mercado no Mercosul, também
não sente maior urgência em
avançar".
Tudo somado, os três cenários
parecem de fato recheados de
"motivos negativos", em especial,
como diz Graça Lima, "para os
países, como o Brasil, que precisam de mais comércio para crescer". (CLÓVIS ROSSI)
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