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Falta de investimento cria apagão argentino
Mais que o frio, tarifas congeladas e com defasagem em relação a custos são apontadas como as principais causas da crise de energia
A longo prazo, especialistas apontam a necessidade de diversificar fontes de energia, com menor dependência do gás e do petróleo
RODRIGO RÖTZSCH
DE BUENOS AIRES
A falta de investimentos na
exploração de novos recursos,
na criação de novas usinas e na
ampliação dos sistemas de
transmissão, gerada principalmente pela política do governo
de não reajustar os contratos
com as empresas concessionárias e criar um ambiente hostil
a investimentos de longo prazo,
é mais determinante para a crise energética argentina que o
inverno rigoroso, apontam
analistas do setor.
Já em 23 de outubro de 2006,
o Instituto Argentino de Energia, organização não-governamental centrada em estudos do
setor, divulgou estudo de 15 páginas intitulado "O Instituto
Argentino de Energia diante da
inegável crise energética".
Nele, dizia: "Nos primeiros
meses de 2004, o desajuste entre oferta e demanda começou
a ser evidente. Originou-se e
agravou-se como conseqüência
de efeito combinado de crescente demanda impulsionada
pelo crescimento econômico e
uma insuficiente oferta de gás
natural para fazer frente aos requerimentos da demanda".
Entre os motivos para a pouca oferta, o informe sinaliza como principal "os preços e tarifas com significativa defasagem
em respeito a seus custos econômicos e em relação aos preços vigentes no Mercosul para
produtos similares".
O analista Francisco Medrazzi coincide com o diagnóstico do IAE e culpa os governos
de Eduardo Duhalde (2002-2003) e Néstor Kirchner.
"Em 2002, violaram-se os
contratos de concessão. Os preços do gás e da eletricidade foram congelados e não se respeitaram as regulações. Ali tudo
começou. No governo Kirchner, não corrigiram o erro, mas
o mantiveram e pioraram."
Com a pesificação dos contratos, ao mesmo tempo em
que as dívidas tomadas para investir se mantiveram em dólares, as empresas ficaram sem
capacidade de investimento.
"O que o governo fez foi alterar o regime econômico da
energia de um Estado regulador e um setor privado que investia para um Estado interventor e empresas sem capacidade de investimento."
Cecilia Laclau, da Fundação
para o Desenvolvimento da
Energia Elétrica, diz que o frio
teve sua dose de influência na
crise, mas ressalva: "As coisas
não acontecem de um dia para
o outro. Já há alguns anos que
vêm postergando os reajustes
para o setor elétrico, o que debilitou o mercado".
O especialista Antonio Rossi
acrescenta dados concretos à
discussão. "Para atender ao aumento da demanda, é necessário incorporar por ano 1.000
MW de geração adicional. A última termelétrica nova de
grande porte, de 800 MW, entrou em serviço em 2000. Desde então, o consumo de energia
subiu mais de 30% sem a ampliação do parque gerador, afirma Rossi.
Como resultado, explica Rossi, "o sistema está funcionando
ao limite de sua capacidade técnica e sem reserva de proteção
que permita atender qualquer
evento inesperado", como o inverno mais rigoroso dos últimos anos. Nos primeiros dez
dias do mês, a média de temperatura em Buenos Aires foi de
8,5C, a mais fria em 45 anos.
Os baixos investimentos
também ficam claros ao comparar a abertura de poços novos de gás e petróleo. Em 1995,
as petroleiras abriram 195 poços de petróleo. Dez anos depois, só 165. Em relação ao gás,
entre 1990 e 1997, houve uma
média de 160 novos poços por
ano; em 2004 e 2005, só 25.
O resultado da falta de investimento em novos poços é uma
queda da reserva em ambos os
casos (leia texto nesta página).
Soluções
Os analistas coincidem em
afirmar que a situação energética já está comprometida para
o curto prazo e prevêem dificuldades para resolvê-la.
"Poderá haver situações mais
amenas quando a temperatura
for mais moderada. Mas, em
definitivo, nada do que se está
fazendo reverte o fato de que há
um déficit no parque de geração", diz Medrazzi.
Rossi aponta dificuldades para suprir o déficit elétrico. "É
diferente do setor petroleiro,
que pode cobrir seu déficit com
importações. O sistema elétrico depende de linhas de interconexão, e a única existente
com o Brasil só permite transportar cerca de 1.000 MW."
A longo prazo, os especialistas apontam a necessidade de
diversificar a matriz energética, tornando-a menos dependente do gás e petróleo. Antes
disso, apontam para a necessidade de um plano de racionamento que abranja também os
usuários residenciais.
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