São Paulo, sábado, 16 de setembro de 2006

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Renda aumenta pela 1ª vez desde 1996

Valor dos ganhos do trabalhador sobe 4,6% em 2005, mas em nove anos perda acumulada ainda é de 15,1%, aponta Pnad

Especialistas creditam avanço à formalização do emprego, à inflação menor e ao reajuste do mínimo; sob Lula, ainda há recuo de 3,36%


ANTÔNIO GOIS
JANAINA LAGE
DA SUCURSAL DO RIO

Depois de praticamente uma década de perdas sucessivas, a renda do trabalhador brasileiro cresceu em 2005 (4,6%) e chegou a R$ 805. Trata-se da primeira expansão desde 1996.
Apesar do sinal positivo, o avanço não foi suficiente para compensar as quedas acumuladas, e o rendimento ainda é 15,1% inferior ao verificado em 1996 (R$ 948). Essa é uma das principais conclusões da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 2005, divulgada ontem pelo IBGE.
Apesar do crescimento em 2005, a renda tem caído a um ritmo anual de 1,12% no governo Luiz Inácio Lula da Silva. A comparação entre o valor herdado do governo anterior e o de 2005 mostra uma queda de 3,36%. No segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso, o ritmo de queda do rendimento foi mais intenso, de 2,71% ao ano. O período foi marcado por crises externas e pela adoção do câmbio flutuante.
O último ciclo de crescimento da renda ocorreu no primeiro mandato de FHC, quando a expansão foi da ordem de 5,39% ao ano, com os efeitos do Plano Real. Em relação à renda herdada do governo Itamar Franco, a primeira gestão de FHC terminou com aumento no rendimento de 29,93%. O cálculo compara a renda de 1998 com a de 1993. A Pnad não foi realizada em 1994, último ano do governo de Itamar.
O resultado da Pnad surpreendeu especialistas em razão do contraste com o crescimento da economia no ano passado, de 2,3%. "Não sabemos se estamos no Haiti, como apontavam os dados do PIB, ou na Índia, como indicam os dados de renda da Pnad", afirmou Marcelo Néri, chefe do Centro de Políticas Sociais da FGV (Fundação Getulio Vargas).
De acordo com dados calculados por Néri a partir dos microdados da Pnad, a renda domiciliar per capita (que inclui as pessoas que não têm renda) cresceu 6,6% em 2005, contra uma expansão de 3,1% em 2004. "O rendimento do trabalho cresceu 4,6%, mas muita gente que não tinha renda nenhuma passou a ter com os programas de transferência de renda, mas o crescimento do trabalho foi muito forte", disse.
Em 2005, o rendimento médio dos domicílios chegou a R$ 1.536, contra R$ 1.462 em 2004. O valor inclui as rendas do trabalho e de outras fontes, como aposentadorias, pensões, aluguéis, aplicações e programas de transferência de renda.
Da última vez em que a renda cresceu no país, o trabalhador ainda se beneficiava dos ganhos de estabilidade proporcionados pelo Plano Real.

Carteira assinada
Segundo especialistas, na prática, a conta passou a incluir menos pessoas com remuneração baixa, o que foi o principal fator a inflar a renda do trabalho em 2005. "O trabalho com carteira assinada cresceu muito e, em geral, tem um nível de remuneração mais alta", disse João Sabóia, diretor do Instituto de Economia da UFRJ.
Em 2005, o crescimento da renda, especialmente entre os mais pobres, foi impulsionado pelo aumento em termos reais de 9,9% do salário mínimo. Além disso, o dólar em baixa ajudou a reduzir os preços dos alimentos, e o índice oficial de inflação, o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), recuou para 5,69% no ano, o menor patamar desde 1998.
Para Marcelo de Ávila, economista do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), os dados indicam que a Pnad de 2006 deve mostrar novo crescimento da renda, amparado no aumento dos trabalhadores formais e do salário mínimo.

Desigualdade
A Pnad confirmou a tendência de redução da desigualdade verificada nos últimos anos. O índice de Gini das rendas do trabalho apresentou um ligeiro recuo, de 0,547 para 0,544, o mais baixo desde 1981, no cálculo. O índice varia de 0 a 1 -quanto mais próximo de 1, maior a desigualdade. A concentração de renda não cresce no país desde 1993.
Segundo Néri, o bem-estar social (combinação da renda per capita domiciliar e da desigualdade) cresceu 7,6% em 2005, contra uma expansão de 5,9% em 2004. Apesar disso, o economista classifica a redução da desigualdade de 2005 como "frustrante" porque havia a expectativa de um recuo maior.
"A desigualdade está diminuindo muito lentamente, mas de forma contínua", afirmou Vandeli Guerra, do IBGE. Todas as classes de renda registraram ganhos pela primeira vez desde 1996. A desigualdade caiu por causa dos ganhos um pouco maior dos mais pobres.
A análise com base na renda mensal de todos os trabalhos mostra que os 50% mais pobres tiveram alta de 6,5% nos rendimentos. Já os 10% mais ricos registraram alta de 4,9%. A mudança na apropriação da renda, no entanto, ainda caminha a passos lentos. Em 2004, os 50% mais pobres detinham 16% da renda total. Em 2005, esse percentual subiu para 16,3%.
Sob a ótica do rendimento do trabalho, o ganho foi maior na faixa de renda próxima do salário mínimo, com alta de 10,3%. Quando se incluem na conta rendimentos provenientes de pensões ou de programas de transferência de renda, o crescimento da renda é mais intenso entre os 10% mais pobres, com alta de 14,8%.


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