São Paulo, sábado, 16 de outubro de 2004

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BARRIL DE PÓLVORA

Presidente da estatal diz que alta do petróleo no mercado internacional não será toda repassada internamente

Petrobras diz que fará reajustes com "cautela"

ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA

O presidente da Petrobras, José Eduardo Dutra, praticamente admitiu ontem que haverá novos aumentos de preço além dos 4% na gasolina e dos 6% no diesel que passaram a vigorar ontem: "Se o preço internacional ficar em US$ 50 por um longo período, vai ter aumento de novo", disse à Folha.
O próprio Dutra lembrou que haverá uma sobrecarga natural de consumo no final do ano, por causa do inverno nos Estados Unidos e na Europa, e que não há expectativa de redução expressiva nos preços: "É muito pouco provável que o petróleo volte ao patamar de US$ 30 ou de US$ 40 com que trabalhávamos antes".
Dutra, porém, foi cuidadoso. Disse que não há previsão de datas, nem de índices e que todos os cálculos são de caráter técnico.
"O preço está defasado? Hoje, está. Vai aumentar, então? Não sei quanto, não sei quando, se vai ser depois da eleição, se vai ser em janeiro", disse, ressaltando que a empresa monitora sistematicamente a evolução e as tendências do produto no mercado internacional, principalmente sob o ângulo geopolítico.
Analistas de mercado estimavam que seria necessário um reajuste de 20%, mas imaginavam que um índice tão alto seria politicamente inviável em pleno segundo turno eleitoral e já previam um meio-termo em torno de 10%. O reajuste decidido, portanto, foi bem menor do que a previsão mais conservadora.
Quanto a essa crítica, Dutra ironizou: "Analistas? Muita gente se arvora em especialista, mas os verdadeiros especialistas não estão arriscando previsões. Eles sabem que o quadro é instável, não dá para apostar". Ele lembrou que o Conselho Administrativo da empresa determinou em 2002, ainda com a composição anterior, que a direção tivesse "cautela" em relação a preços.
"O conselho antigo decidiu, e nós achamos correto. Não há mais monopólio, mas a empresa é dominante e precisa agir com responsabilidade. Não dá para atuar com uma visão exclusivamente economicista", disse ele.
"Cautela" e "responsabilidade", na sua versão, significam: "Seguir uma certa aderência ao preço internacional, mas sem repassar ao consumidor interno a mesma volatilidade externa".
"A função da Petrobras não é atender uma expectativa pontual de mercado, mas sim de atuar com base em avaliações empresariais, com um olho no interesse dos acionistas e outro nos interesses da sociedade, dos consumidores. Os acionistas não têm reclamado", afirmou ele.
Dutra fez uma comparação entre o que ocorreu no segundo trimestre de 2003 e em igual período de 2004. Segundo ele, no ano passado, os "analistas entre aspas" reclamavam do que seriam lucros absurdos da Petrobras, com preços muito acima do mercado internacional. O petróleo estava num patamar de cerca de US$ 25 o barril. No mesmo período neste ano, a reclamação era outra, inversa: a de que os preços estavam muito abaixo do mercado internacional e que, portanto, os acionistas estavam tendo prejuízo.
O resultado, ainda segundo ele: o lucro da empresa foi igualmente de R$ 3,9 bilhões tanto no segundo trimestre de 2003 quanto no de 2004, com uma diferença apenas de cerca de R$ 20 milhões a mais neste ano.
"Mudanças no câmbio têm mais influência no lucro da Petrobras, para o bem e para o mal, do que estar abaixo ou acima dos preços internacionais", disse. No ano passado, o dólar subiu e o petróleo subiu junto. Neste ano, o real se valorizou cerca de 7% em relação à moeda americana.
Quanto às análises de que o aumento de agora foi combinado com o cronograma das eleições, Dutra respondeu com uma provocação: em 2002, ano da disputa presidencial, o petróleo subiu, o dólar disparou, mas a Petrobras não promoveu grandes mexidas nos preços.
"A Petrobras não usou critério político nem naquela nem nas atuais eleições", disse ele, apesar de o aumento estar sendo esperado desde antes do primeiro turno das eleições municipais e com percentuais bem maiores.


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