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São Paulo, domingo, 16 de novembro de 2003

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CENÁRIOS

De 25 economias em desenvolvimento, 19 devem crescer mais que o país; porto seguro está longe, dizem analistas

Brasil fica atrás de emergentes em 2004

ÉRICA FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL

O magro desempenho da economia nos últimos três anos tem feito dos 3,2% de expansão esperados para 2004 motivo para festa. Ainda assim, o país continuará na rabeira do crescimento no mundo emergente. Pesquisa divulgada recentemente pela revista "The Economist" mostra que 19 entre 25 países em desenvolvimento terão desempenho do PIB (Produto Interno Bruto) superior ao do Brasil no próximo ano.
O levantamento é feito com base na média das projeções de dez importantes bancos e institutos de pesquisa. Segundo os resultados, o Brasil empatará, em 2004, com duas outras nações e ganhará de apenas três: Egito (3,1%), Israel (2,2%) e Hungria (2,9%).
O pior é que economistas são unânimes ao afirmar que a capacidade de expansão brasileira, no médio prazo, é limitada. Segundo alguns analistas, o chamado PIB (Produto Interno Bruto) potencial do país -capacidade que uma economia tem de se expandir sem pressões inflacionárias- gira em torno de 3%.
Esse é um entre vários outros indicadores de vulnerabilidade da economia brasileira que deixam, apesar da recente recuperação, o país ainda longe de preencher os requisitos para ser considerado porto seguro para investimentos.
Recente estudo do próprio Ministério da Fazenda ("Risco soberano e prêmios de risco em economias emergentes") lista os dados que mais influenciam as decisões das agências de classificação de risco para conceder a um país a cobiçada nota de grau de investimento ("investment grade"), que indica o baixo risco de investir.

Os indicadores
Uma análise de seis desses indicadores feita pela Folha com base em dados de consultorias, bancos e da agência Moody's mostra que o Brasil está muito aquém de outros emergentes que já receberam essa classificação:
1) taxa elevada de crescimento. Apesar da melhora de 0,7% neste ano para 3,2% em 2004, o Brasil ainda ficará a uma longa distância de países que são grau de investimento, como China (7,7%), Rússia (5,1%) e Malásia (5%);
2) elevada renda per capita em dólares. A do Brasil perde significativamente para a de de países emergentes considerados de baixo risco. Deve encerrar 2004 em US$ 2.829, 68% inferior à do Chile e 118% menor que a do México;
3) baixa inflação ao consumidor. Embora deva cair de 9,7% neste ano para cerca de 6% em 2004, a inflação ao consumidor (medida pelo IPCA) ainda estará bem acima da de outros países, como Malásia (0,8%) e Tailândia (1,5%), no próximo ano;
4) baixa relação entre dívida externa total (pública e privada) e receitas em contra corrente (como exportações, royalties e ganhos com fretes). Quanto menor esse indicador, maior a capacidade de determinado país para fazer frente ao seu endividamento sem depender de recursos externos.
Por isso, é considerado um dos principais dados acompanhados pelas agências de risco. E, novamente, nesse caso, o Brasil deixa muito a desejar.
Para a economia brasileira, essa relação é de 2,83, segundo dados do Itaú. Para países que são grau de investimento, oscila de 0,2 a 1.
"Essa é nossa pior relação. Como as perspectivas de redução da dívida externa total são baixas, a solução para melhorá-la é triplicar o volume de exportações, se quisermos ser "investment grade'", diz Joel Bogdanski, gerente de política monetária do Itaú;
5) elevado grau de abertura comercial, medida pela corrente de comércio (soma de exportações e importações) em relação ao PIB. É outro indicador listado como de extrema importância para a redução da vulnerabilidade externa.
"Em países com elevada corrente de comércio em relação ao Produto Interno Bruto, os custos de eventuais ajustes em razão de choques externos são menores", diz Alexandre Bassoli, economista-chefe do HSBC Bank.
Segundo Bassoli, é fundamental ter altos montantes tanto de exportação como de importação, ainda que o saldo não seja grande.
Isso porque, na ocorrência de uma crise de financiamento externo, países endividados precisam aumentar seu saldo comercial para conseguir receita extra. Países com alta corrente de comércio conseguem isso com maior facilidade e rapidez:
"Imagine que um país precise gerar um saldo comercial de US$ 10 bilhões. Se ele importa e exporta US$ 50 bilhões e tem saldo zero, precisa cortar importações ou elevar exportações em 20%. Se essa corrente é de US$ 100 bilhões, o ajuste passa a ser só de 10%", diz.
No segundo caso, ajustes monetários (alta dos juros) e cambiais (alta do dólar) são menores.

Melhora
Segundo Bassoli, a corrente de comércio do Brasil tem melhorado significativamente. Ainda assim, deve saltar de 28% do PIB, neste ano, para 30% do PIB, no próximo ano. A relação é muito inferior à de países como Malásia (179%) e México (56%);
6) ausência de episódios de moratória a partir de 1975. O Brasil decretou moratória em 1982 e deu o calote no pagamento da dívida externa em 1987.
A análise desses indicadores mostra que o Brasil tem um longo caminho a trilhar se quiser atingir nos próximos anos a categoria de grau de investimento.
Para chegar lá, o fundamental, na opinião de analistas, é investir no aumento da corrente de comércio e em fatores que possam contribuir para a elevação do PIB potencial, como educação e produtividade.


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