São Paulo, sábado, 16 de dezembro de 2000

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OPINIÃO ECONÔMICA

A Copene e a revolução petroquímica

GESNER OLIVEIRA A frustração do leilão da Copene (Companhia Petroquímica do Nordeste) na madrugada de ontem intensifica a discussão sobre o futuro da petroquímica brasileira. Para além do nervosismo natural dos dias que antecederam o evento e dos eventuais motivos que teriam provocado a desistência do principal candidato estrangeiro (Dow Chemical), vale a pena refletir sobre a revolução produtiva do setor.
A petroquímica tem importância fundamental para o funcionamento da economia. Nem sempre o consumidor se dá conta de que o preço e a qualidade de uma imensa gama de produtos depende da eficiência da indústria petroquímica. Um exemplo dos efeitos práticos de atraso nesse segmento: estima-se que a perda de alimentos no Brasil por causa das embalagens atinja 20% em comparação com 4% de uma amostra de países desenvolvidos.
Além de essenciais para a cadeia de embalagens, os produtos petroquímicos são consumidos pelas indústrias da construção civil, de utilidades domésticas, farmacêutica, de artigos de higiene pessoal, automotiva e de eletroeletrônicos, entre outras. Curiosamente, no entanto, mercados como o de cerveja merecem muito mais atenção da imprensa do que o de matérias-primas tão decisivas para a formação dos preços da economia.
A competitividade da petroquímica depende de três fatores principais. Em primeiro lugar, o custo da matéria-prima, para o qual a oferta de nafta e gás natural é fundamental. O Brasil não tem vantagem nesse ponto relativamente ao Canadá, ao Oriente Médio, à Argentina, aos Estados Unidos e à Europa Ocidental.
Em segundo lugar, a escala de produção é crucial para a redução dos custos unitários e para a otimização da capacidade. Esse elemento requer, por si só, empresas de um porte muito superior à média da indústria brasileira, caracterizada por fragmentação e excessiva pulverização societária. O segmento exige aportes elevados de capital e investimentos indivisíveis que requerem coesão societária e grande disponibilidade de caixa.
Em terceiro lugar, a inovação passou a exercer papel fundamental nas últimas duas décadas. Paralelamente ao aumento da escala de produção que se verifica nos vários derivados petroquímicos que possuem características de commodities, verifica-se uma importância crescente de produtos diferenciados que asseguram um melhor desempenho e atendem a demandas muito específicas dos clientes.
Esse fenômeno acentuou a importância da tecnologia de produtos e da capacidade de acompanhar rapidamente as tendências da demanda, introduzindo as inovações adequadas no ritmo necessário para satisfazer o mercado. Essa "descomoditização" de certas linhas de produtos, conforme enfatizado em recente estudo técnico do BNDES, aumenta a necessidade de alianças estratégicas e de integração vertical. Novamente, a petroquímica brasileira se encontra em desvantagem pela ausência de integração e pela separação entre as chamadas primeira e segunda geração.
Diante de dificuldades estruturais tão sérias, parece irracional voltar a polêmicas superadas entre, de um lado, a velha proteção à empresa nacional e, de outro, o liberalismo extremado. A moderna política de competitividade dos Estados nacionais requer a priorização da eficiência econômica e a utilização de mecanismos de mercado, bem como transparência nos critérios de alocação dos recursos públicos. Talvez o tempo adicional para a venda da Copene em 2001 permita que o debate acerca do futuro da petroquímica brasileira avance nessa direção.

Gesner Oliveira, 44, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley), professor da FGV-SP, consultor de Tendências e ex-presidente do Cade.
E-mail - gesner@fgvsp.br


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