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COMÉRCIO
No varejo já são 50 milhões; nas instituições financeiras, 41,5 milhões
Número de cartões ligados a lojas supera o de bancos
FÁTIMA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL
As redes de lojas descobriram
mais uma forma de financiar a
compra do cliente e lucrar com
um negócio tradicionalmente reservado às instituições financeiras
e às administradoras de cartões: a
venda parcelada por meio de cartões de crédito próprios.
Essa forma de financiamento
começou a se proliferar sobretudo a partir de 2000 -até então era
utilizada por um pequeno número de lojas (Mappin e Mesbla, que
não existem mais). Alguns especialistas dizem que os cartões de
crédito de lojas estão se expandindo tão rapidamente que, em pouco tempo, eles poderão ser até
uma ameaça aos bancos e às administradoras, que exploravam
sozinhos esse negócio no país.
Em parceria com instituições financeiras ou ainda sozinhas, as
lojas já têm hoje mais cartões de
crédito com marca própria no
mercado brasileiro do que as administradoras tradicionais que
operam por meio de bancos.
Essa mudança pode ter a ver
com a mudança sofrida pelo país
nos últimos anos. Em 2002, o setor de comércio vendeu 0,68% a
menos do que no anterior, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Inflação em alta, emprego em baixa, queda do poder aquisitivo e
juros entre os mais altos do mundo desestimularam a compra de
novos bens. Já os lucros das instituições financeiras subiram cerca
de 30% em média, na comparação de 2002 sobre 2001. Uma prova viva de que emprestar a juros
altos pode dar retorno maior do
que produzir e tentar vender um
bem ou serviço.
Interesse
A estimativa é que existam cerca
de 50 milhões de cartões de crédito de lojas -chamados de private
label (uso restrito nas lojas)- nas
mãos dos consumidores no país.
Os cartões de crédito tradicionais
(bandeira Visa, Mastercard,
Amex e Diners), ligados a bancos,
somam 41,5 milhões, informa a
Abecs, que reúne as administradoras cartões.
O interesse do varejo em lançar
o seu próprio cartão de crédito
cresce basicamente por três razões: torna o cliente mais fiel à loja, custa menos do que o cartão
tradicional e cria mais uma modalidade na venda a prazo -um
negócio lucrativo no país devido
às altas taxas de juros. Para o consumidor, a grande vantagem é
que, geralmente, é gratuito.
Assim, os cartões de fidelização
-aqueles que permitem ao cliente obter descontos em alguns produtos e ganhar brindes- estão se
transformando em cartões de crédito, que, por sua vez, passaram a
substituir o sistema de crediário
tradicional (os carnês).
Pelo menos 200 redes de lojas já
emitem cartão de crédito próprio
no país, estima a Partner Consultoria, especializada na prestação
de serviços financeiros ao consumidor. São cartões com a marca
da empresa que têm ou não parceria com uma instituição financeira e uma administradora.
"Há dez anos, os bancos deixaram de ser vendedores de cartões
Visa e Mastercard para serem donos de cartões. Agora chegou a
vez do varejo participar desse negócio e também ganhar dinheiro
com cartão de crédito", afirma
Boanerges Ramos Freire, sócio-diretor da Partner.
C&A, Lojas Riachuelo, Lojas
Pernambucanas, Carrefour, Lojas
Renner e grupo Pão de Açúcar são
alguns exemplos de redes que já
participam desse negócio -algumas com e outras sem parcerias
com instituições financeiras e administradoras de cartão.
A C&A é uma das redes mais
experientes na venda financiada
por meio cartão de crédito próprio, tanto que já tem até um banco -o Ibi- para cuidar dos seus
serviços financeiros. Além de cartão de crédito, oferece ao cliente
títulos de capitalização, empréstimo pessoal e seguros.
Com 80 pontos-de-venda no
país, a C&A, de origem holandesa, tem 12 milhões de cartões nas
mãos de clientes, especialmente
das classes de menor poder aquisitivo. Dárcio D" Agosto, diretor
de crédito do banco Ibi, diz que a
emissão de cartões não pára de
crescer especialmente por causa
do menor custo do financiamento
oferecido ao cliente.
Enquanto os juros das administradoras tradicionais de cartões
de crédito vão de 8,5% a 13,5% ao
mês, os das lojas variam de 3,5% a
7% ao mês, informa Waldemar
Petty, presidente da Cardco, empresa que processa cartões de crédito para o varejo. Algumas redes
informam que parcelam o preço à
vista em cinco vezes sem juros.
O interesse de redes de lojas em
lançar cartão de crédito próprio
levou especialistas em serviços financeiros para o consumidor a
discutir se é legal ou não uma loja
emitir o seu próprio cartão de crédito sem parceria com bancos, financeiras ou administradoras.
O Procon-SP informa que sim,
desde que os juros cobrados dos
consumidores no cartão de crédito de loja sejam limitados a 6% ao
ano, como determina a Lei de
Usura, de 1933.
Isto é, para cobrar juros acima
disso, a loja tem de ser parceira de
uma instituição financeira -que
tem autorização do Banco Central
(BC) para buscar recursos no
mercado e financiar o consumidor- ou de uma administradora
de cartão, que tem contrato de
operação registrado em cartório.
O fato é que muitas redes de lojas informam que parcelam o preço à vista em várias vezes no cartão sem cobrar juros, só que os juros já estão embutidos no preço
-ou seja, as taxas não são especificadas. Especialistas dizem que
isso acontece muito, mas não há
como provar essa prática num
mercado de preços liberados.
Cobrança indevida
A Acrefi, associação que reúne
as financeiras, admite que existem cerca de cem lojas espalhadas
pelo país -com cerca de 1 milhão
de cartões de crédito emitidos-
que operam sem a parceria de financeiras. Elas estariam cobrando juros dos clientes mesmo sem
ter vínculo com financeiras.
"Estamos trabalhando num
projeto para legalizar a operação
dessas lojas, com o apoio das financeiras, e elevar de 1 milhão para 2 milhões o número de carnês
emitidos por essas lojas", afirma
Walter Arantes de Moraes, diretor da Acrefi.
Segundo ele, o cartão de crédito
de lojas se transformou num negócio tão interessante para o comércio que cerca de 1.700 associações comerciais espalhadas pelo
país também estudam a possibilidade de ter parceria com os lojistas. Nesse caso, o cartão de crédito
levaria o nome da loja e também
da associação.
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