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GESNER OLIVEIRA
Vai, Robinho!
A livre mobilidade do
trabalho traria ganhos,
representaria política de
combate à pobreza eficiente
IMAGINE a Copa do Mundo sem
circulação de mão-de-obra. O
Japão sem Zico, Portugal sem
Scolari, a Alemanha sem Klose e a
Itália sem Camoranesi, entre outros
exemplos. É impossível pensar o futebol atual sem mobilidade de trabalho. No entanto, é assim que funciona a economia mundial em prejuízo
do desenvolvimento.
A globalização não é tão global assim. Há muita mobilidade de capital,
alguma circulação de mercadorias e
toda sorte de restrições à liberdade
de ir e vir dos trabalhadores.
Segundo relatório das Nações
Unidas, haveria 191 milhões de imigrantes no mundo. O número verdadeiro incluindo os ilegais é um múltiplo disso. Supondo que seja o dobro, o total de imigrantes ainda representaria parcela reduzida de
uma população global de cerca de
6,4 bilhões de pessoas (6%).
A livre mobilidade do trabalho
traria inúmeros ganhos. Representaria política de combate à pobreza
eficiente. Beneficiaria mais que proporcionalmente os pobres e ao mesmo tempo faria o produto mundial
crescer. Premiaria aqueles que gostam de trabalhar e empreender, e
não apenas receber uma mesada do
pai-Estado.
Uma estratégia de direcionar o
movimento dos trabalhadores para
o desenvolvimento ajudaria em vários aspectos. Em primeiro lugar,
cria-se fluxo estável de remessas para os países de origem. Isso melhora
o desempenho externo sem a volatilidade de outros itens, como o capital de curto prazo.
Em segundo lugar, essa poupança
pode ser transformada em investimentos no país de origem. Algumas
pesquisas sugerem que a poupança
do trabalhador imigrante é freqüentemente utilizada em empreendimentos a serem desenvolvidos por
ocasião de seu retorno. Seria racional direcioná-la para projetos de
empreendedorismo, sobretudo em
regiões mais pobres.
Em terceiro lugar, os movimentos
migratórios geram impactos óbvios
sobre determinados setores. O turismo e as telecomunicações tendem a ser beneficiados. A maioria
dos nova-iorquinos ainda ignora essa tal Copa do Mundo. Mas o motorista de táxi que emigrou de Gana é
capaz de passar horas ao telefone
com seu cunhado, discutindo os detalhes do jogo se seu país contra a
Itália. Isso tudo a um preço que
equivale a uma ligação local de há
apenas 20 anos atrás.
No passado, a relação do imigrante com seu país de origem era esporádica. Na atualidade, graças à tecnologia, os laços não precisam ser
rompidos. Pelo contrário, devem ser
estreitados!
Em quarto lugar, desde a Antigüidade a movimentação do homem
pelo planeta é instrumento poderoso de transferência de tecnologia.
Continua a ser assim. Esta coluna
aderiu ao movimento "Fica, Robinho!" no passado. Mas é inegável
que Robinho amadureceu em um
mercado mais organizado e profissionalizado como o do futebol europeu. Essa noção simples de que a
emigração de trabalhadores qualificados não é necessariamente negativa está desenvolvida em livro recente de Devesh Kapur e John
McHale.
Não adianta impedir os grandes
talentos de se deslocar pelo mundo.
Em vez disso, é preciso saber tirar
proveito desse fato mediante cooperação e parcerias estratégicas. Há
muito menos colaboração com centros de pesquisa e inovação empresarial de países avançados do que seria necessário e possível fazer. Tampouco há estratégias de atração de
quadros qualificados de países desenvolvidos. Ou mesmo de pessoal
de gerência média tão escasso em
países em desenvolvimento.
Em quinto lugar, o mundo desenvolvido não pode ficar sem imigração. Estima-se que, daqui a dez anos,
para cada 100 trabalhadores que se
aposentam nos países desenvolvidos, apenas 87 entrarão na força de
trabalho. Se nada for feito, o planeta
será habitado por dependentes de
pensões de sistemas quebrados de
previdência nos países ricos e de esmolas nos países pobres.
Em setembro, as Nações Unidas
terão encontro de alto nível sobre o
tema da imigração. Trata-se de assunto da maior importância para a
integração econômica das Américas
até hoje inexplicavelmente relegado
como uma questão que interessa
apenas ao México e à América Central. É hora de abandonar o besteirol
Chávez-Morales e pensar seriamente em propostas sobre o assunto para a América Latina.
GESNER OLIVEIRA, 50, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley), professor da FGV-EAESP,
presidente do Instituto Tendências de Direito e Economia e
ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
gesner fgvsp.br
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