São Paulo, sexta-feira, 17 de outubro de 2008

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União Européia agora quer preparar pacote para incentivar setor industrial

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A MADRI

Os 27 países da União Européia anunciaram ontem a "determinação de tomar as medidas necessárias para reagir à desaceleração da demanda e do investimento e, em particular, para apoiar a indústria européia".
É o anúncio de um possível novo pacote, destinado agora à atividade produtiva, depois que o colossal plano de salvação do setor financeiro fracassou, até agora, em acalmar as Bolsas, que continuam derretendo.
Como a explicação para as novas quedas é a perspectiva de recessão global, nada mais natural que botar dinheiro para estimular a produção. Mas, no caso, não há a pressa que houve para ajudar a banca.
Os chefes de governo encarregaram a Comissão Européia, braço executivo da UE, de apresentar uma proposta antes do fim do ano, além de um estudo sobre a situação da indústria.
Não combina com as urgências do empresariado industrial, manifestadas, por exemplo, por Jürgen Thumann, presidente da Federação das Indústrias Alemães, para quem o governo precisa adotar já ações para reduzir os efeitos da crise sobre a economia real.
"Em nenhuma circunstância, o governo deve reduzir seu nível de investimento", gritou Thumann, em entrevista ao jornal "Tagesspiegel", no que é uma visível demonstração do receio de que, com a ajuda aos bancos, não sobre dinheiro público para o setor produtivo.
Já o primeiro-ministro italiano, Silvio Berlusconi, chegou a especificar qual área a ser ajudada: a automobilística. "Se os Estados Unidos investiram maciçamente no setor de autos, não é de se escandalizar que o Estado, de nossa parte, possa pensar em dar apoio de algum modo à sua própria indústria automobilística."
Justificou seu ministro da Economia, Giulio Tremonti. Antes da eleição de Berlusconi em abril, o ministro publicou um livro que é um hino de amor ao liberalismo: "O Mundo Mudou, Tudo Mudou".

Mau humor do mercado
Tudo mudou, menos o humor dos mercados, que voltaram a sofrer perdas, exceto nos EUA. A vítima maior foi o Japão, que perdeu 11,41%, a maior queda em um dia desde a crise de 1987. Na Europa, as perdas variaram dos 4,11% de Madri aos 5,92% de Paris.
Pior: os pacotaços de ajuda, elogiados quase unanimemente, até pelo Nobel de Economia Paul Krugman, já não gozam da mesma aura de magia.
O primeiro-ministro japonês, Taro Aso, por exemplo, disse que os US$ 700 bilhões que os Estados Unidos reservaram para salvar seus bancos não são suficientes. "Como não são, o mercado está caindo de novo agudamente", disse Aso.
Para fomentar ainda a desconfiança no setor, a UBS (União de Bancos Suíços), a maior grife em gerenciamento de fortunas no mundo, teve que ser socorrida pelo governo suíço e do Qatar. O Credit Suisse foi igualmente ajudado.
Explicação do presidente do Conselho Federal suíço, Pascal Couchepin: "Nas últimas semanas, o refinanciamento [intrabancos] se tornara mais difícil. Tanto a UBS como o Credit Suisse são atualmente muito bem capitalizados mas eles podem ter problemas de liquidez em vista das dificuldades no tráfico bancário".
Se até bancos suíços, símbolos da indústria, têm problemas de liquidez, não é difícil concordar com Robert Peston, o editor de Negócios da BBC, quando diz que "os bancos ainda não estão emprestando uns aos outros a qualquer taxa parecida com a normalidade".
De fato, o Euribor, a taxa utilizada na Europa para empréstimos entre bancos, caiu de novo ontem, mas pouquinho: para 5,248%, quando a taxa do BCE para as demais operações não passa de 3,75%.
A exceção à regra entre os grandes banqueiros é o que mais interessa ao Brasil. Caso de Emílio Botín, o patriarca do Santander, que dispensou socorro do governo espanhol, afirmando a "fortaleza e solvência" da banca do país. Mas reconheceu que se vive, no mundo, "uma crise de confiança generalizada", que atribuiu aos "excessos" que seus companheiros praticaram, levando à "perda de referências".
Se os bancos ainda não recuperaram a confiança, os produtores de petróleo a perderam de vez. A Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) antecipou para o dia 24 uma reunião prevista apenas para o mês que vem.
Para Abdalla Salem El-Badri, secretário-geral, a tendência é reduzir a produção de 32,2 milhões de barris/dia para 31,3 milhões, o que pode aumentar o preço. Com isso, pode morrer a única boa notícia (ao menos para os importadores).


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