|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
LUÍS NASSIF
Uma revolução
diplomática
O lance diplomático de Lula, no episódio da Venezuela, se assemelha ao jogo de
xadrez em que ocorre o chamado lance inovador. Só depois de
algumas jogadas se saberá se
havia consistência na jogada,
ou se foi apenas uma temeridade inconsequente.
Pela primeira vez, o país adotou uma posição pró-ativa em
uma crise do continente. E, pela
primeira vez, Lula deixa pruridos de lado e fala publicamente
do Brasil assumir sua liderança
natural na América Latina, em
nome da bandeira social do
combate à fome.
Havia duas leituras para o
episódio. A primeira, a de que o
episódio foi um ato de voluntarismo de Lula que, na última
hora, conseguiu se consertar
com a criação do grupo Amigos
para a Venezuela, e a inclusão
dos Estados Unidos. O segundo,
o de que representou o primeiro
passo, planejado, de uma nova
postura do Brasil no campo externo.
Depois de alguns dias filtrando as informações, a sensação
que se tem é que o episódio da
Venezuela poderá se constituir
em um divisor de águas para a
diplomacia brasileira e continental. Não se trata de uma estratégia isenta de riscos. Seguindo sua tradição, o Brasil ficou
do lado da solução institucional. Só que a solução institucional significa apoiar uma canastra lotada de paralelepípedos,
de nome Hugo Chaves.
Apesar dos primeiros tropeços,
com a ida do assessor especial de
Lula, Marco Aurélio Garcia, à
Venezuela despertando a ira da
oposição venezuelana, o que
ocorreu foi uma ação orquestrada com o Itamaraty. O chanceler Celso Amorim sustenta que
em nenhum momento houve intenção de confrontar os Estados
Unidos, "o que seria tolo de nossa parte". Alguém teria que tomar a iniciativa, porque há
uma grave ameaça à ordem institucional na Venezuela, diz ele.
Por unanimidade, a Organização dos Estados Americanos
(OEA) aprovou resoluções para
o secretário-geral César Gavíria
atuar na crise venezuelana. Só
que o processo não estava dando resultado. Surgiu então a
idéia do Grupo de Amigos, para
dar ao secretário mais instrumentos e novas visões da crise, e
até ajudar nas conversas com
todas as partes envolvidas
-sempre mantendo os princípios de respeito aos parâmetros
da ordem constitucional.
Em dez dias houve intensas
consultas. Uma das primeiras
pessoas consultadas por Amorim foi o secretário norte-americano Colin Powell. Inicialmente, é possível que alguns grupos
norte-americanos tenham se
mostrado céticos em relação à
iniciativa, diz Amorim. Depois,
reavaliaram e mudaram de
idéia. Assim que se soube do interesse americano, o país foi
convidado a integrar o grupo.
Não houve rompimentos com
os princípios básicos da diplomacia brasileira, de respeito aos
princípios constitucionais. Mas
há dois movimentos em marcha, que poderão mudar a face
da diplomacia brasileira, a partir da constatação de que houve
todo um trabalho de planejamento para embasar a intuição
política de Lula.
O primeiro, a posição pró-ativa da diplomacia brasileira,
saindo da retórica do não envolvimento, e suscitando inclusive
um editorial elogioso do "The
New York Times". O segundo é
que há grande possibilidade de
que a imagem internacional
projetada por Lula do líder contra a fome no mundo, nesses
tempos de pós-liberalismo, trabalhada estrategicamente por
Amorim e Garcia, resulte em
um novo líder global.
Só não dará certo se a crise venezuelana se precipitar, Chaves
cair, e se constatar que o Brasil
fez uma aposta errada.
Desrespeito
Com os constrangimentos macroeconômicos, a única maneira do país conseguir se desenvolver será investir firmemente em
tecnologia e inovação. A manutenção do ministro Roberto
Amaral no Ministério de Ciência e Tecnologia ameaça destruir todo um trabalho desenvolvido nos últimos anos. É bom
que caia a ficha do governo Lula
de que rifou uma área estratégica para os planos de crescer sem
comprometer os fundamentos
da economia.
A ida do físico Sérgio Rezende
para a Finep ameniza, mas não
resolve a questão. Depois do
desmonte, levará tempos para
se reconstruir a área.
E-mail: lnassif@uol.com.br
Texto Anterior: Finanças: Corretora baixa taxa de "home broker' Próximo Texto: Ética: Comissão restringirá ação do BC que afete o FleetBoston Índice
|