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"Inspiração" de investidor, Charles Ponzi morreu pobre no Brasil, há exatos 60 anos
MAURÍCIO MORAES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
No dia 18 de janeiro de 1949,
o Hospital São Francisco, no
centro do Rio de Janeiro, registrava a morte do italiano Charles Ponzi. Cego, vítima de um
infarto, ele não tinha família no
Brasil. Internado na ala dos indigentes, era o mesmo homem
que, três décadas antes, tinha
uma vida luxuosa e que quase
comprou um banco nos Estados Unidos. Até sua rede de
fraude, imortalizada como "Esquema Ponzi", cair por terra.
O homem que inspirou o investidor Bernard Madoff (acusado de fraudes de até US$ 50
bilhões) começou seu negócio
na década de 1910, alguns anos
depois de emigrar para os EUA.
Na ocasião, descobriu que os
selos de retorno postal vendidos no país eram muito mais
caros que os comprados na Europa. Passou, então, a comprar
e a revender selos do correio internacional e conseguir lucros
elevados. Para expandir seu negócio, passou a captar dinheiro
com outros imigrantes em troca de alta rentabilidade. Até o
negócio desmoronar, e Ponzi
acabar parando no Brasil.
Quase um século depois, Madoff também prometia altos
rendimentos aos seus investidores. Em vez dos selos de Ponzi, o ex-presidente da Nasdaq
dizia aplicar em fundos igualmente fabulosos. Entre seus
clientes, estavam, principalmente, membros e instituições
da comunidade judaica, que,
igualmente aos imigrantes italianos do início do século, confiaram o seu dinheiro a um dos
membros de sua comunidade.
Assim como Madoff, Ponzi
vivia uma vida de luxo em Boston, após enriquecer. Sua fama
cresceu, ele contratou agentes
e montou um pequeno império.
"Ele administrava milhões
de dólares em investimentos,
que só faziam crescer, com as
pessoas hipotecando as próprias casas", diz o jornalista
americano Mitchell Zuckoff,
autor de "Ponzi's Scheme: True
Story of a Financial Legend"
("Esquema Ponzi: A Verdadeira História de uma Lenda Financeira", em tradução livre).
Cerca de 17 mil investidores
deixaram seu dinheiro nas
mãos de Ponzi.
A rentabilidade fenomenal
começou a levantar suspeitas e
o jornal "The Boston Post" passou a investigá-lo, descobrindo
que, para sustentar o negócio,
Ponzi teria de comercializar
160 milhões de selos de retorno
postal. Mas apenas 27 mil selos
circulavam no país.
A notícia fez uma multidão
de investidores reclamar seu
dinheiro, em 1920. Ponzi se fez
de vítima, pagou a alguns e convenceu a maioria a manter as
aplicações. Contratou até um
relações-públicas, James
McMasters, para gerir o escândalo. Conseguiu segurar a situação por mais alguns meses,
até McMasters vender os detalhes da negociata ao jornal.
Ponzi acabou preso e, em
1934, foi deportado à Itália. Em
1941, desembarcou no Brasil,
como funcionário da antiga
companhia de aviação Ala Littoria. Por razões desconhecidas, deixou a empresa e passou
a viver no subúrbio de Engenho
Novo, na zona norte do Rio, de
onde mantinha uma intensa e
apaixonada correspondência
com Rose, sua ex-mulher, que
ficara nos EUA. Eles não tiveram filhos, eram divorciados.
"A impressão que tenho de
suas cartas é que ele estava feliz
no Brasil, mas queria voltar para Rose e para os Estados Unidos, não para a Itália", afirma
Zuckoff. "Ele tentou a sorte
com alguns negócios. Numa
carta, ele pergunta a Rose qual
tipo de batom ela usava. Ele
queria vender batons no Brasil.
Ele estava sempre tentando fazer dinheiro de alguma forma."
Nos últimos anos, doente e
cego, Ponzi nem conseguia escrever. "As cartas eram escritas
por um vizinho" chamado Antonio, segundo Zuckoff. Foi ele
quem avisou Rose da morte de
Ponzi, aos 66 anos, num dia
quente de verão de 1949.
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