São Paulo, domingo, 18 de abril de 2010 |
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ALBERT FISHLOW Cúpulas
A ARTE das conferências de cúpula esteve em exposição em Brasília alguns dias atrás. Em forma condensada, porque o presidente Hu Jintao teve de retornar à China por conta do terremoto na Província rural de Qinghai, as reuniões do Ibas e dos Brics aconteceram em um só dia. Como grupo, esses países vêm sendo recentemente -e continuarão a ser nos próximos anos- a fonte de mais de três quintos da expansão mundial. Somadas, dentro de uma década suas economias serão maiores que a dos EUA. Esses encontros não geraram grandes novidades. Como apontou a revista "The Economist", existe rivalidade estratégica entre os Brics, e isso limita suas empreitadas mais sérias e cooperativas. O único acordo que atingiram foi quanto à necessidade de redistribuição do poder no FMI e no Banco Mundial, mas depois disso as divergências com relação a detalhes começaram a dissipar as declarações genéricas iniciais. Falou-se muito sobre a potencial cooperação entre bancos nacionais de desenvolvimento, mas não surgiram muitos indicadores de como ela aconteceria na prática. No documento bilateral com a China, o "Financial Times" aponta para cláusulas de oposição ao protecionismo, mas também para uma menção a medidas "de proteção aos interesses dos agricultores dos países em desenvolvimento". Quanto a algumas das questões centrais, houve silêncio. Embora a reunião dos Brics realizada na Rússia um ano atrás tenha incluído discussões sobre a substituição do dólar como moeda de reserva, neste ano o tema da supervalorização do yuan aparentemente não ocorreu. Isso é algo de bastante relevante para a atual recuperação da economia mundial, e brasileira. A reunião do grupo Ibas envolvia uma associação mais antiga, e com maior uniformidade política. Os três países são democracias e fortes candidatos a postos permanentes no Conselho de Segurança da ONU. A reafirmação dessa reivindicação teve posição central. Mas a oposição chinesa à admissão do Japão torna improvável essa possibilidade. As conversações do Ibas envolveram diversos assuntos, tais como desenvolvimento sustentável e mudança do clima, políticas macroeconômicas para um crescimento inclusivo e segurança alimentar e o emprego rural. Embora relevantes, e essas reuniões trilaterais continuarão a acontecer, o objetivo prático é uma posição diplomática expandida. Uma questão brasileira específica continua sendo ignorada, e a realização dessas reuniões atrai atenção para ela. Dos Brics, apenas o Brasil tem um índice interno de poupança inferior a 20% do PIB -os demais países apresentam índice superior a 30%. Embora o foco dos últimos meses venha sendo conseguir que a China consuma (e importe) mais, houve menos atenção à necessidade de que o Brasil consuma menos. Para 2010, o crescimento brasileiro agora provavelmente deve se aproximar dos 6%. É uma ótima notícia. A má notícia é que sustentar esse ritmo no futuro, incluindo as necessidades substanciais de investimentos da Petrobras, as crescentes necessidades urbanas e de infraestrutura, e sem esquecer a Copa do Mundo e a Olimpíada, esbarrará em uma verdadeira barreira. O uso de poupança externa tem limites. Para além de uma margem de 3%, a suscetibilidade a circunstâncias externas se expande rapidamente. A campanha presidencial está a ponto de começar a sério. Com sorte, os dois principais candidatos oferecerão programas que especificarão de que maneira pretendem resolver esse aparente dilema. Tradução de PAULO MIGLIACCI ALBERT FISHLOW, 74, é professor emérito da Universidade Columbia e da Universidade Berkeley. Escreve quinzenalmente, aos domingos, nesta coluna.
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