São Paulo, sábado, 18 de agosto de 2007

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ROBERTO RODRIGUES

Pecuária de corte, tecnologia e gestão


Corremos o risco de perder nossas vantagens na pecuária por duas razões: a defesa sanitária e a rastreabilidade


OS PECUARISTAS brasileiros, produtores da melhor carne do mundo, sofreram duramente nos últimos anos com os preços do boi gordo bastante deprimidos. Apesar de conquistarmos cada vez mais novos mercados -hoje exportamos carne para 150 países-, os preços ficaram baixos por razões pouco explicadas. No entanto, nos últimos meses houve uma mudança no cenário e os preços subiram um pouco. Ainda não foram corrigidos para os índices anteriores a 2003, mas já remuneram melhor o produtor. O câmbio tem sido um elemento adicional para a baixa remuneração, e a agitação dos últimos dias não garante significativas mudanças permanentes.
A sobrevivência dos produtores tem sido oportunizada pelo salto no patamar tecnológico. Há dez anos, um boi ia para o frigorífico com quatro anos de idade, pesando 22/23 arrobas. Hoje, com 18 meses já está em ponto de corte, com 15/16 arrobas. Com isso, tem sido possível extrair muito mais carne por hectare. A divisão, a rotação e o manejo de pastagens, sua adubação (em alguns casos até irrigação) e o uso de novas forrageiras mais nutritivas se somam a um espetacular melhoramento genético do nosso rebanho, seja no caso de raças zebuínas puras, como o nelore ou o guzerá, seja no cruzamento industrial do zebu com raças européias ou americanas.
O resultado é notável: o boi brasileiro pode ser chamado de "boi verde", pois cresce em regime de pasto e não consome farinhas de origem animal, o que acaba com a possibilidade de doenças terríveis, como o mal da vaca louca. Por outro lado, temos sol o ano todo e não precisamos estabular o gado no inverno. Portanto, nossas vantagens comparativas são enormes. Mas corremos o risco de perdê-las por duas razões: a defesa sanitária e a rastreabilidade. No primeiro caso, o problema maior é a aftosa. Embora essa doença de animais não ataque a espécie humana, os países importadores suspendem suas compras de países onde ela ocorre, com medo de ser transmitida a seus próprios rebanhos. Há muito de interesse comercial nisso. Mas, de qualquer forma, é um tema que precisa ser tratado com rigor por governos e produtores, porque um único governante ou produtor relapso pode prejudicar todo o país, embora a maioria absoluta desses seja muito cuidadosa. E a questão só será resolvida em definitivo quando todos os países da América do Sul trabalharem juntos.
Não é tão difícil, basta a vontade política. A outra área é a rastreabilidade, mecanismo que permite aos consumidores ter uma carne de qualidade certificada, com o conhecimento de todas as etapas de produção. Essa é uma tendência mundial irreversível, e não só para a carne: consumidores do mundo todo estão cada dia mais exigentes quanto aos fatores de produção, na direção da sustentabilidade técnica, ambiental e social. E já caminhamos para a certificação da propriedade rural, o que dá mais precisão ao processo.
Ambas as questões -defesa e rastreabilidade- são elementos de gestão, bem como a novíssima integração lavoura-pecuária introduzida pela Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária). Os pecuaristas brasileiros já deram testemunho de sua grande vitalidade ao incorporarem novas e modernas tecnologias de produção. Podemos aproveitar essa fase de preços melhores para investir ainda mais na gestão do setor, para que nossa competitividade fique para sempre imbatível.

ROBERTO RODRIGUES , 65, coordenador do Centro de Agronegócio da FGV (Fundação Getulio Vargas), presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e professor do Departamento de Economia Rural da Unesp - Jaboticabal, foi ministro da Agricultura. Escreve aos sábados, a cada 15 dias, nesta coluna.


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