São Paulo, sábado, 19 de junho de 2004

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LUÍS NASSIF

A mordida do Confaz

Em sua próxima reunião, o Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária, que reúne os secretários da Fazenda estaduais) poderá acabar de vez com a subvenção dos consumidores de energia de baixa renda. Sergipe e Espírito Santo já foram os pioneiros, mas o assunto está sob discussão. Virando norma, as contas dos consumidores da parte mais baixa da pirâmide (até 30 kWh) sofrerão aumentos de quase 50%.
Na portaria nš 922, de 28 de julho de 1993, o DNAEE (Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica) estabeleceu o subsídio cruzado, ao estipular que as empresas concessionárias elaborassem planos tarifários, de modo a oferecer tarifas diferenciadas de acordo com as classes de consumidores. Caberia ao DNAEE, posteriormente à Aneel, definir as classes de consumidores.
A lei nš 10.604, de 17 de dezembro de 2002, fortaleceu o subsídio. Depois que o governo federal criou o padrão de definição do consumidor de baixa renda, ocorreu aumento expressivo de consumidores nessa faixa. Se o Confaz decidir taxar a subvenção, matará o subsídio.
A lógica do subsídio é simples. Suponha que a tarifa somada dos consumidores de baixa renda seja 100, e os de renda alta, 100. O que a legislação faz é cobrar, digamos, 80 da baixa renda. Aí permite que a distribuidora compense esse valor ao cobrar dos consumidores de renda mais alta.
Subvenção não é pagamento nem compensação, segundo diz a Aneel, em parecer que tenta impedir a decisão do Confaz.
Além disso, a lei nš 10.762, de 11 de novembro de 2003, criou a Conta de Desenvolvimento Energético, destinada, entre outros objetivos, a garantir recursos para a subvenção à baixa renda. Esse fundo é cobrado na conta de luz de todos os consumidores. Portanto integra a base de cálculo para a cobrança do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).
Pelos cálculos da Aneel, essa interpretação do Confaz na prática matará qualquer vantagem para o consumidor de baixa renda. Por exemplo, um consumidor na base inferior da pirâmide, que consome 30 kWh, pelo modelo atual paga R$ 2,83 pela energia e R$ 0,94 pelo ICMS, num total de R$ 2,83. Pelo modelo proposto pelo Confaz, passará a pagar os R$ 2,83 pela energia e R$ 2,77 pelo ICMS e a conta subiria para R$ 5,60. O ICMS corresponderia a 98% do valor da energia consumida.
A regressividade seria brutal. O custo final do kWh para a primeira faixa de consumo saltaria de R$ 0,126 para R$ 0,187 -aumento de 49%. O novo custo unitário para essa faixa (até 30 kWh) corresponderia ao mesmo que hoje é cobrado para a quarta faixa (consumidores de até 100 kWh).

CVM
Já alertei outras vezes aqui para o fato de que o governo estava dando um tiro no pé ao não aproveitar a oportunidade da saída de Luiz Cantidiano para reformular a CVM (Comissão de Valores Mobiliários). As conseqüências de anos de falta de liderança moral sobre o mercado estão aí: o Brasil aparecendo nos principais jornais internacionais como o país de pior governança corporativa da América Latina.

E-mail -
Luisnassif@uol.com.br


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