São Paulo, segunda-feira, 19 de agosto de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

PROTECIONISMO

Esse é o valor que o Brasil deixa de vender ao exterior devido às barreiras tarifárias dos países desenvolvidos

Agropecuária perde US$ 7,8 bi por ano


Divulgação
Colheita do algodão em Santa Helena de Goiás; país é competitivo, mas necessita de organização


JOSÉ SERGIO OSSE
CÍNTIA CARDOSO
DA REPORTAGEM LOCAL

O agronegócio brasileiro perde US$ 7,8 bilhões por ano por causa do protecionismo dos países desenvolvidos. A eliminação dos impedimentos ao livre comércio representaria um acréscimo de 30% nas exportações brasileiras de produtos agropecuários, segundo a Camex (Câmara de Comércio Exterior).
O levantamento da instituição simula a extinção de todas as barreiras tarifárias, quotas e sobretaxas incidentes nos produtos brasileiros, assim como o fim dos subsídios à produção nos países importadores. Os exercícios de simulação têm se tornado uma das principais ferramentas dos negociadores internacionais.
Apenas no continente americano, as exportações dos cinco principais produtos da pauta brasileira, quatro deles agropecuários, aumentariam em US$ 10 bilhões por ano com o fim do protecionismo na região -principalmente nos Estados Unidos.
O protecionismo só começou a ser debatido mais intensamente no Brasil nos últimos quatro anos. O país, por causa disso, sofre com a falta de experiência no campo da negociação comercial, vital para a redução das barreiras e defesa das exportações nacionais.
Segundo Marcos Jank, professor da Esalq/USP e acadêmico visitante do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), o Brasil ainda está aprendendo a negociar. "Os diplomatas brasileiros têm um know-how vasto no trato de questões geopolíticas, mas a experiência na atuação em negociações comerciais é pequena." Mesmo assim, segundo ele, é preciso que o país não fuja da mesa de negociações.
As negociações brasileiras na área comercial atualmente em curso colocam o setor agrícola como prioridade, afirma Lytha Spíndola, secretária de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento. Hoje, o país negocia a criação da Alca (Área de Livre Comércio das Américas), o acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Européia e toca ações contra subsídios na OMC (Organização Mundial do Comércio). Nos dois primeiros, enfrenta os interesses dos dois maiores, mais protegidos e subsidiados mercados do mundo.
Segundo a Camex, o gasto com subsídios agrícolas dos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), que reúne as nações mais ricas do planeta, é de US$ 340,8 bilhões por ano. Desse total, mais de dois terços correspondem aos EUA e à União Européia.
O desafio é, com uma equipe de negociação relativamente nova -a carreira de analista de comércio exterior para administração pública federal foi criada em 1988-, conseguir defender os interesses brasileiros em discussões com os experimentados diplomatas americanos e europeus.
Heloísa Lee Burnquist, pesquisadora do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), lembra que os países desenvolvidos são os que, desde a criação da OMC, em 1995, mais têm atuado nesse foro de discussões. Dessa forma, seus diplomatas desenvolveram suas táticas de negociação e, muitas vezes, abriram precedentes favoráveis a seus países, diz a pesquisadora.
Recentemente, o Brasil pretendia entrar com representação contra os EUA com relação à soja e ao algodão. Porém, com a seca nas regiões produtoras norte-americanas, o preço internacional da soja subiu no mercado internacional, beneficiando os produtores brasileiros. Por essa razão, o governo brasileiro decidiu não manter o questionamento em relação à soja, alegando que o momento político é desfavorável à causa brasileira.
"O caminho não é esse, afinal, o protecionismo americano permanece. O que aconteceu é que, por causa do tempo, o Brasil foi beneficiado. Mas, no ano que vem, se a safra dos EUA for tranquila, continuaremos sendo prejudicados pelas medidas americanas", diz Marcos Jank.
Com relação ao algodão, há previsão de entrada com uma ação na OMC ainda neste ano. Segundo a Associação Brasileira de Produtores de Algodão (Abrapa), com o protecionismo imposto pelos EUA, a área plantada de algodão no Brasil encolheu, passando dos 936 mil hectares da safra 1999/ 2000 para os atuais 700 mil.
Segundo Antônio Ernesto de Salvo, presidente da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), o setor agropecuário é o que, potencialmente, tem mais condições de gerar rapidamente divisas para o país por meio de exportações. Para ele, a manutenção do protecionismo nos níveis em que está não afetaria muito o que já existe do setor no Brasil.
Além disso, ele diz acreditar que em breve boa parte das medidas protecionistas será extinta por pressão das grandes empresas fabricantes de alimentos. Ao constatarem que o Brasil é um dos poucos países no mundo com grande potencial de expansão agrícola e alta produtividade a custo baixo, vão pressionar para o fim das barreiras para produzir e exportar a partir do país.
Pedro de Camargo Neto, secretário de Produção e Comercialização do Ministério da Agricultura, concorda. Para ele, os setores que poderiam desaparecer por causa do protecionismo já desapareceram. O que afeta o produtor é que isso impede a expansão do setor.


Texto Anterior: Painel S.A.
Próximo Texto: Mercado novo é opção contra as barreiras
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.