|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
OPINIÃO ECONÔMICA
Crime contra a economia
GESNER OLIVEIRA
É óbvio que o crime guarda
relação com a desigualdade
e a falta de acesso à educação.
Mas não dá para esperar a justiça social para atacar seriamente
o crime organizado. O foco da
doença não está apenas em São
Paulo ou no Rio de Janeiro. O
Brasil está em guerra. Na cidade
e no campo. Ou se derrota o crime ou o país será condenado ao
Quarto Mundo, eliminando
qualquer chance de melhores
condições sociais no futuro.
Os ataques terroristas em São
Paulo deram visibilidade mundial a um problema que vem se
agravando de forma assustadora
nas últimas décadas. Em classificação de 117 países elaborada pelo Fórum Econômico Mundial
que avalia fatores que influenciam a competitividade, o Brasil
está na 99ª posição em relação
ao crime organizado e na 107ª
posição em relação aos custos
das empresas gerados pelo crime
e pela violência.
Segundo o Banco Mundial, as
empresas brasileiras incorrem
em custos de segurança privada
(equipamentos, alarme, trancas,
entre outros) de 1,4% das vendas,
quase o dobro da média dos países da OCDE. Além disso, as perdas advindas de roubos, vandalismo, incêndio e outros crimes
representam 0,4% das vendas,
mais do que o triplo de países
emergentes como a China
(0,12%) e o Chile (0,19%).
Estudo do Banco Mundial de
Robert Ayres chama a atenção
para quatro formas pelas quais o
crime arrasa uma economia. Em
primeiro lugar, as ondas de violência destroem o estoque de capital físico. Isso ocorre diretamente, como se viu nos ataques
covardes do terror em São Paulo;
ou lentamente, pela ação daninha do vandalismo cotidiano; ou
indiretamente, pelo desestímulo
que a insegurança representa
para o investimento em infra-estrutura.
Em segundo lugar, a criminalidade inibe o desenvolvimento de
capital humano. Pesquisa sobre
o efeito da violência sugere efeitos cumulativos elevados sobre o
desempenho escolar das crianças; além disso, as despesas com
segurança tendem a crescer,
comprimindo as escassas disponibilidades para as áreas de educação e saúde.
Em terceiro lugar, a prevalência do crime destrói aquilo que se
convencionou chamar capital
social. Esse último é entendido
como um conjunto de regras e
normas de convivência que permitem a ação coordenada das
sociedades. O clima do "salve-se-quem-puder" aniquila a força da
ação coletiva e solidária e multiplica gastos improdutivos por
parte dos setores público e privado.
Em quarto lugar, o insucesso
do Estado em suprir serviço tão
básico quanto a segurança termina por subtrair legitimidade e
relevância do próprio aparelho
estatal. Acentua-se, dessa forma,
a tendência a não cumprir as leis
e especialmente a não pagar os
impostos, aumentando ainda
mais a já assustadora informalidade da economia brasileira de
quase 40%. No Peru, essa taxa é
superior a 50%!
Mas o problema é ainda mais
grave do que assinalado por Ayres. O crime não apenas corrói o
tecido social. A insegurança pública acentua a concentração e a
desigualdade. Agrava, assim, os
próprios fatores alimentadores
do crime organizado, gerando
um círculo vicioso de miséria e
violência.
De um lado, as camadas desprivilegiadas são as principais
prejudicadas. Rico tem guarda-costas e carro blindado. Pobre
pega condução e anda por ruas
mal iluminadas e onde a polícia
não entra. De outro lado, o crime
constitui mais um inibidor do
empreendedorismo. Quantos pequenos e médios empreendedores não são obrigados a vender
seus negócios por problemas de
segurança? Isso ocorre com freqüência na cidade e no campo,
concentrando os mercados e tornando a economia menos eficiente. Uma grande empresa faz
seguro e monta um exército privado. O pequeno e o médio empreendedor não dispõem dos recursos necessários e muitas vezes
são obrigados e arriscar sua própria vida e de seus familiares para se manter em atividade.
Se o crime organizado não for
debelado, a sociedade brasileira
estará condenada ao subdesenvolvimento. Não é possível crescer de forma sustentada sem restabelecer um mínimo de segurança. Mas a tarefa não é fácil. A
violência tem causas múltiplas e
complexas. Uma solução global
requer abordagem multidisciplinar. Incentivos econômicos podem contribuir. Uma próxima
coluna tratará da economia contra o crime.
Gesner Oliveira, 49, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia
(Berkeley), presidente do Instituto Tendências e ex-presidente do Cade. Atualmente, é professor visitante do Centro
de Estudos Brasileiros na Universidade
Columbia (EUA).
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
Texto Anterior: Para setor calçadista, medidas são tímidas Próximo Texto: Tendências Interncionais - Mercado: Nasdaq tem agora 25,1% na Bolsa londrina Índice
|