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ECONOMIA GLOBAL
Após derrotar a inflação, principais economias se deparam com novo vilão, a queda generalizada de preços
Efeitos da deflação preocupam FMI e Fed
ÉRICA FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL
Depois de décadas de pavor e de
combate ferrenho à inflação alta,
o mundo teme hoje um mal diametralmente oposto, embora tão
ou mais maléfico: a deflação.
Essa preocupação se reflete em
recentes relatórios de importantes bancos e instituições como o
FMI (Fundo Monetário Internacional) e o Federal Reserve (o
banco central norte-americano).
O termo deflação é usado por economistas como sinônimo de queda generalizada de preços que
tende a persistir no longo prazo.
Embora tecnicamente somente
o Japão atravesse uma verdadeira
deflação hoje, seus riscos começam a ser vislumbrados no recuo
dos índices inflacionários de diversos países.
Relatório publicado pelo FMI
na semana passada chama a atenção para o fato de que a porcentagem de nações desenvolvidas e de
grandes países emergentes que
têm experimentado queda constante em seus índices de preços ao
consumidor passou de 1% a 3%
na primeira metade da década de
90 para cerca de 10% a 15% nos últimos três anos.
O trabalho é assinado por Manmohan S. Kumar, consultor do
Fundo que coordenou um grupo
de trabalho entre vários departamentos da instituição para pesquisar o tema.
Em boa medida, essa situação
de queda de preços mundo afora
representa uma vitória dos bancos centrais. Afinal, na década de
70, derrubar inflações galopantes
era prioridade.
Preços baixos e estáveis são um
sinônimo de caminho aberto para
o crescimento. Isso porque facilitam o planejamento das empresas, estimulando o investimento
produtivo. Por outro lado a renda
real dos consumidores tende a subir, incentivando o consumo.
Piso zero
Então a queda continuada e generalizada dos preços deveria ser
motivo para comemoração? Não,
nem sempre.
De fato, a deflação nem sempre
é um indicador econômico ruim.
Se provocada por uma rápida expansão de produtividade, a deflação pode conviver com o crescimento econômico. A história se
complica quando os preços caem
de forma contínua e generalizada
por causa de uma forte contração
do consumo.
O fantasma deflacionário que
hoje ronda principalmente as
economias desenvolvidas é uma
combinação das duas situações.
A renda de consumidores e de
investidores sofreu um forte baque com o estouro da bolha no
mercado de ações que levou a
grandes perdas de riqueza. Para
piorar, o mundo desenvolvido vive um momento de enorme excesso de capacidade produtiva
instalada. Em outras palavras, as
empresas investiram muito e agora não têm como produzir tudo o
que podem porque não há demanda suficiente.
Em reação, bancos centrais têm
lançado mão do mais convencional instrumento de política monetária: o corte dos juros. O problema é que há o piso zero para a
queda dos juros nominais. Se a taxa atinge esse nível e a deflação
persiste, os juros reais (diferença
entre juros nominais e a inflação)
só podem ser positivos.
O mal resultante disso é o que o
rendimento das empresas segue
em queda porque a demanda
continua deprimida, mas suas dívidas experimentam um crescimento relativo. Consequência:
empresas têm de partir para cortes de custos, como demissões, o
que tende a gerar mais deflação.
Analistas e autoridades não
apostam que a economia americana esteja caminhando para a
deflação. Em discurso feito na semana passada, Roger Ferguson,
vice-presidente do Fed, tentou
provar que a economia dos EUA
está longe da realidade japonesa
em meados da década passada,
quando o país asiático mergulhou
na espiral deflacionária.
Em larga medida, ele parece ter
razão. É que os bancos dos EUA
são mais sólidos do que os japoneses, e a economia norte-americana é mais dinâmica e produtiva.
A Alemanha parece correr mais
riscos deflacionários do que os
EUA. Além de o sistema financeiro alemão estar em pior situação,
os consumidores são ainda mais
endividados e o país não pode
cortar os juros, já que essa decisão
cabe ao Banco Central Europeu.
Mas isso não significa que o recente coro de preocupações com
a deflação peque pelo exagero.
Muito pelo contrário.
Em primeiro lugar, as consequências de uma deflação na Alemanha seriam muito ruins para o
resto da Europa. Além disso, prever uma deflação nem sempre é
fácil. Como mostra um estudo do
próprio Fed sobre o Japão, publicado em 2002, pouco antes do início da espiral deflacionária as pesquisas de mercado e do governo
previam a continuidade de taxas
moderadas de inflação.
Segundo Kumar, embora os riscos de uma deflação global sejam
baixos hoje, quando se trata desse
mal até as mínimas chances de
sua ocorrência pedem ação rápida. Por isso, é provável que os juros voltem a cair nos EUA.
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