São Paulo, domingo, 20 de setembro de 2009

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Produção de energia em usina sofrerá fortes oscilações

Vazão do rio Xingu levará Belo Monte a alternar períodos de grande produção e de baixa geração

DO ENVIADO ESPECIAL AO PARÁ

A grande oscilação entre cheias e secas do rio Xingu vai transformar a hidrelétrica de Belo Monte numa imensa usina "vaga-lume". A vazão do rio pode alcançar 20 mil metros cúbicos por segundo no período de cheia, e em outros momentos, como agora, pode baixar a menos de mil metros cúbicos por segundo entre os períodos de setembro a outubro.
A Grande São Paulo, maior núcleo urbano do país, consome cerca de 60 metros cúbicos de água por segundo. O Xingu, mesmo na baixa, pode abastecer 16 cidades como São Paulo. Mas com essa imensa variação do nível d'água, Belo Monte terá, no período seco, pouca água para movimentar as turbinas.
Para extrair a energia dos 11,2 mil MW, são necessários 14 mil metros cúbicos por segundo de água, condição só possível entre os meses de março e abril, auge do período chuvoso. A previsão é que em outubro a situação seja inversa, de baixíssimo volume d'água, com geração ínfima.
"Como é possível uma usina com tantos problemas ambientais ter uma ociosidade dessa magnitude? Se a vazão do rio baixar mais de 700 metros cúbicos por segundo, o que já ocorreu, Belo Monte produzirá quase como uma pequena central hidrelétrica", critica Francisco Hernanes, pesquisador do IEE/USP (Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo) e um dos coordenadores do grupo de 38 especialistas de várias regiões do país que apresentará ao Ibama suas impressões sobre o projeto até o fim deste mês.
Só a partir dessa particularidade é possível relativizar o tamanho de Belo Monte. Embora a capacidade seja imensa, a energia firme extraída da usina será de 4.428,1 MW, 39,4% da capacidade total, algo próximo às usinas do Madeira (Jirau e Santo Antônio). Essa potência com que o país poderá de fato contar é 7,5% menor do que havia desejado a Eletrobrás.
A área ambiental exigiu a liberação de pelo menos 700 m3/s para o trecho de vazão reduzida do Xingu, para a Volta Grande. A barragem vai desviar o rio e vai secar parte dos 100 quilômetros da Volta Grande. No período chuvoso, o volume d'água abaixo da barragem principal será, no máximo, de 4.000 m3/s no primeiro ano e de 8.000 m3/s no ano seguinte. Foi a forma encontrada para se evitar uma catástrofe ambiental, com morte de peixes e da floresta ribeirinha, além de assegurar condições de navegação aos povos da região.
Walter Cardeal, diretor de engenharia da Eletrobrás, não considera esse um problema para a operação da usina. A justificativa: apesar disso, Belo Monte vai revezar com as usinas do Sul e do Sudeste no abastecimento do Sistema Interligado Nacional. "As chuvas na região Norte ocorrem antes das chuvas do Sudeste. Com isso, Belo Monte pode gerar energia enquanto as usinas do Sul e do Sudeste reservam água, e vice-versa", explica.
Maurício Tolmasquim, presidente da EPE, reconhece o problema, mas justifica que isso ocorre em razão da impossibilidade hoje de construir usinas como Itaipu, com grandes "estoques" de água. Foi isso que reduziu de 1.225 para 516 quilômetros quadrados a área alagada pelo projeto. "O país perde potencial energético, é inevitável. Ou fazemos isso, ou não temos mais hidrelétricas."
Para especialistas, reside aí um dilema. Uma resolução do CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) determinou a construção apenas de Belo Monte na bacia do rio Xingu. "Quem pode assegurar que, numa eventual crise energética, o CNPE não mude sua posição e aprove outras barragens no Xingu para aproveitar mais a capacidade que ficará ociosa?", disse Hermes Fonseca de Medeiros, professor-adjunto da Faculdade de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Pará. Para especialistas, a resolução não é uma garantia.


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