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EUA querem "ensinar" livre comércio ao país
DO ENVIADO ESPECIAL A MIAMI
Os empresários industriais norte-americanos dispõem-se a lançar um "exercício de educação"
aos brasileiros, tanto do setor público como do privado, na tentativa de convencê-los a aceitar uma
Alca o mais abrangente possível.
O anúncio foi feito ontem por
Scott Otteman, diretor de Política
Comercial Internacional da NAM
(Associação Nacional de Manufatureiras), uma espécie de CNI
norte-americana.
A idéia de que os brasileiros precisam ser "educados" sobre as
vantagens do livre comércio não é
nova. Em Cancún, na Ministerial
da Organização Mundial do Comércio, o empresariado dos EUA
usou expressão idêntica quando o
Brasil ajudou a criar o então G20,
grupo de países em desenvolvimento para lutar pela liberalização agrícola nos países ricos.
O chanceler Celso Amorim, como é óbvio, não acha que os brasileiros precisam ser educados sobre o tema. Mas, em vez de reagir
iradamente, preferiu tirar do baú
da memória uma cena do clássico
filme "Casablanca" em que um
dos personagens pergunta ao
principal: "Por que você veio a
Casablanca?". "Pelas águas", responde o interrogado. "Mas aqui é
deserto", retruca o interlocutor.
"Ah, então eu estava mal informado", termina a cena.
A analogia é para dizer que estão mal informados os que dizem
que o país é contra o livre comércio. "Somos a favor, desde que seja equilibrado. Não podemos ter
livre comércio só para um lado."
Repete, então, a conhecida lista
de produtos brasileiros contra os
quais os EUA praticam tudo, menos livre comércio (aço, suco de
laranja, açúcar, álcool etc.), para
completar: "Livre comércio é
mais falado que praticado".
Para os industriais norte-americanos, no entanto, o Brasil é culpado por, em Miami, não ter sido
definida uma Alca "robusta, de alta qualidade e abrangente", conforme a sucessão de qualificativos
enfileirada por Frank Vargo, vice-presidente da NAM para Assuntos Econômicos Internacionais.
"Exceto pelo Brasil, essa meta
está quase alcançada", diz Vargo.
Coincidência ou não, ele usou o
anúncio de que os EUA iniciam
negociações com países centro-americanos, andinos, Panamá e
República Dominicana, para dizer que estes teriam interesse em
evitar que o Brasil tenha acesso ao
mercado norte-americano, a menos que assuma os outros compromissos da Alca "robusta, de alta qualidade e abrangente".
Resposta de Amorim, na sua
própria entrevista coletiva: "É
mais fácil dizer do que fazer
[acordos de livre comércio]".
Vargo e Otteman acham que o
Brasil perderá investimentos se
não aderir à visão de Alca ampla.
"Os investimentos americanos no
Brasil já caíram porque o ambiente não é atraente. Vai ficar menos
atraente ainda com os acordos
entre os EUA e os outros países da
América Latina", prevê Vargo.
Amorim discorda: "O Brasil foi,
por muito tempo, o segundo
maior receptor de investimentos
externos do mundo, atrás da China, e não tinha [nem tem] acordo
de proteção aos investimentos".
Os industriais dos EUA estão
tão interessados na Alca robusta
que se dispõem até a ceder na data
de implantação (prevista para
2005 e reafirmada no texto de
Miami). "Se puder ser no prazo,
melhor. Se não, podemos esperar
um pouco mais", diz Vargo.
(CR)
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