São Paulo, domingo, 20 de dezembro de 2009

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Meirelles vê fim de estímulos em 2010

Presidente do BC diz que não há motivos para novas medidas e que país já tem condições para expansão forte e sustentada do PIB

Banco Central prepara medidas cambiais para enviar ao Congresso que devem incluir a abertura de conta em dólares no Brasil

Alan Marques/Folha Imagem
O presidente do BC, Henrique Meirelles, durante entrevista na sede da entidade, em Brasília, em que defendeu fim de estímulos

SÉRGIO MALBERGIER
EDITOR DE DINHEIRO
VALDO CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Responsável por uma política monetária muitas vezes criticada dentro do próprio governo, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, 64, emite sinais de que, para evitar ajustes bruscos no próximo ano, o ciclo de estímulos à economia tem de ser interrompido. "Não vejo estímulos à frente para 2010", disse em entrevista na sede do BC, em Brasília.
Destacando que, no caso do BC, algumas das medidas anticíclicas já estão sendo retiradas, ele evita criticar os recentes incentivos a setores da economia anunciados pelo ministro Guido Mantega (Fazenda).
Diz, porém, que "não há dúvida de que os estímulos são expansionistas" num contexto de crescimento já vigoroso.
Meirelles crê que um crescimento um pouco acima de 5% para 2010, como prevê o mercado, é "saudável", "sustentável" e "equilibrado", indicando que o Banco Central pode não mexer nos juros tão cedo.
Ele coloca como fundamental, em 2010, o cumprimento da meta de 3,3% do PIB para o superavit primário (economia para o pagamento dos juros da dívida pública). E faz questão de lembrar que é um compromisso já assumido por Mantega.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista.

 

FOLHA - O sr. vê risco de a inflação sair da meta se continuar o atual ritmo de crescimento da economia?
HENRIQUE MEIRELLES
- A previsão de inflação do mercado está um pouco abaixo do centro da meta. Evidentemente que, como qualquer banco central, consideramos que há sempre um risco de inflação e, portanto, estamos sempre monitorando isso cuidadosamente. Nunca deixa de existir um risco de inflação, principalmente em situações em que há crescimento.

FOLHA - O PIB do terceiro trimestre veio menor que o esperado. Como isso afeta a política monetária?
MEIRELLES
- No Banco Central, não trabalhamos com previsão de PIB trimestral, exatamente porque há muita volatilidade e incertezas em algumas medidas, devido a questões sazonais.
Portanto, trabalhamos sempre com previsão anual. As previsões do mercado são de um PIB em 2010 um pouco acima de 5%, um crescimento saudável, forte, sustentável e de acordo com as expectativas.

FOLHA - O governo não só está mantendo a maioria das medidas anticíclicas como as expandindo. O sr. avalia que ainda é o caso? Elas podem gerar inflação acima da meta?
MEIRELLES
- Existem diversos tipos de medidas e de estímulos.
E têm tempos de saídas diferentes. Se você olha o Banco Central, notará que várias medidas de estímulo já estão em processo de retirada. Algumas em processo final. Por exemplo, empréstimo das reservas, tivemos num certo momento um saldo de US$ 24,5 bilhões.
Esse saldo hoje está um pouco acima de US$ 1 bilhão.

FOLHA - Mas do lado da Fazenda estão sendo adotadas mais medidas de estímulo, redução de tributos. Como o sr. avalia essa ampliação?
MEIRELLES
- Olha, existe um cronograma de diminuição de estímulos por parte da Fazenda, que tem sofrido algumas adaptações, mas é um processo também em andamento. Em alguns momentos, durante o correr do próximo ano, os estímulos terão sido eliminados. Existe uma questão de cronograma que está sendo colocada, mas não há dúvida de que, na nossa hipótese de trabalho, durante 2010 teremos uma saída gradual do processo de estímulos.
Além do mais, trabalhamos com a hipótese de que a meta de 2010 do superavit primário será cumprida [3,3% do Produto Interno Bruto]. Como inclusive já anunciado pelo ministro [Mantega]. Agora, não há dúvida de que estímulos são expansionistas, e existem fatores contracionistas.
O que o Banco Central faz é olhar todo quadro e, a cada reunião, faz suas projeções macroeconômicas, levando em conta todos os fatores, e a partir daí toma sua decisão.

FOLHA - O sr. não vê necessidade de novos estímulos?
MEIRELLES
- Não, não de criação de estímulos.

FOLHA - Os bancos públicos estão muito agressivos na concessão de crédito por orientação do presidente da República e já estão com necessidade de capitalização extra, caso do Banco do Brasil. O sr. acha que os bancos públicos podem ser menos prudentes do que os privados?
MEIRELLES
- Nossa hipótese de trabalho é que não.

FOLHA - E a realidade?
MEIRELLES
- A realidade será determinada pelos relatórios da fiscalização que estão sendo feitos sobre todos os bancos, públicos e privados.

FOLHA - Essa agressividade pode estar indo além da prudência?
MEIRELLES
- Não verificamos ainda isso. Se, porventura, a fiscalização verificar alguma coisa nesse sentido, certamente vai haver a adoção de medidas baseadas em relatórios da fiscalização. São duas coisas diferentes, que precisamos levar em conta. Primeiro, é o movimento contracíclico, que foi correto e benfeito, pelos bancos públicos.
Agora, daqui para a frente, volta o mundo à normalidade.
Portanto, hoje os bancos estão competindo. Naturalmente os bancos públicos partem de uma velocidade um pouco maior, exatamente pela sua atitude anticíclica, mas certamente as regras prudenciais continuam, e o Banco Central vai fazer a avaliação de todos os bancos para garantir que não haja risco excessivo sendo assumido pelo setor público ou privado.

FOLHA - Uma das metas do sr. para o BC é a conversibilidade do real.
Quais medidas serão adotadas na reforma do mercado cambial?
MEIRELLES
- Os estudos estão em andamento, existem algumas coisas que envolvem aplicação de recursos de brasileiros no exterior, conforme já mencionamos, que envolve desafios.

FOLHA - Abertura de conta em dólar no Brasil está nos estudos?
MEIRELLES
- Pode ser, pode ser, dependeria de lei.

FOLHA - A questão do pacote cambial era vista como necessária e sairia neste ano. Por que mudou para o próximo ano? O câmbio deixou de ser um problema de curto prazo?
MEIRELLES
- São duas coisas diferentes. Primeiro, nunca houve, do meu ponto de vista, a ideia de lançar um pacote cambial neste ano. Eu sempre disse que estávamos engajados num processo de modernização da legislação cambial. Segundo, não há dúvida de que o processo exacerbado de desvalorização do dólar mundial equilibrou-se nos meses recentes.
Não há dúvida.


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