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Juiz se diz "incomodado" por agentes da Abin
Magistrado que suspendeu leilão por 3 vezes afirma que membros da agência foram à Justiça em Altamira e telefonaram "várias vezes"
"Não entendo o que eles estão investigando", diz Antonio Carlos Almeida Campelo, para quem conflitos jurídicos sobre usina estão na fase inicial
JOÃO CARLOS MAGALHÃES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELÉM
O juiz Antonio Carlos Almeida Campelo, da Justiça Federal
em Altamira (PA), disse estar
"incomodado" por "solicitações" feitas por agentes da Abin
(Agência Brasileira de Inteligência) sobre suas decisões no
caso da usina de Belo Monte.
Nos últimos seis dias, Campelo, 47, suspendeu por três vezes o leilão da usina, aumentando a temperatura da disputa jurídica em torno da obra de R$
19 bilhões, a ser construída no
rio Xingu, no Pará.
"Não entendo o que eles estão investigando", disse Campelo, por e-mail -condição estipulada por sua assessoria para a entrevista.
Questionado depois sobre
como se deram essas solicitações, o juiz afirmou, em novo e-mail, que agentes da Abin estiveram na Justiça Federal em
Altamira e telefonaram para lá
diversas vezes, "atrás das [minhas] decisões".
FOLHA - Na opinião do senhor, Belo
Monte será uma "tragédia socioambiental", como os críticos do projeto
da usina hidrelétrica afirmam?
ANTONIO CARLOS ALMEIDA CAMPELO
- O Estudo de Impacto Ambiental ainda não está concluído. Segundo técnicos do próprio Ibama, [ele] ainda demanda de outros estudos. Esses outros estudos é que vão dizer o
nível de degradação ambiental
e as medidas mitigadoras.
FOLHA - Até que ponto os interesses políticos estão pesando na atuação do Judiciário?
CAMPELO - As decisões prolatadas são técnicas e amparadas
por doutrinas de renomados
juristas do direito ambiental e
em jurisprudência de tribunais
superiores brasileiros e estrangeiros. Assim, o interesse político não é levado em conta.
FOLHA - O senhor se sente pressionado?
CAMPELO - Recebi procuradores da AGU, da Aneel e do Ibama e, por mais de uma hora, ouvi suas alegações e fiz algumas
ponderações. Mas não foi suficiente para eu modificar minha
decisão. Não me sinto pressionado, mas estou incomodado
com várias solicitações de
agentes da Abin, que não vejo
como um órgão de representação judicial. Não entendo o que
eles estão investigando.
FOLHA - Como e quando essas "solicitações" ocorreram?
CAMPELO - Não houve conversa
com agentes da Abin. Dois
agentes da Abin estiveram na
subseção de [Justiça Federal
em] Altamira atrás das decisões
e querendo saber quando eu
daria outras decisões.
Ligaram várias vezes para o
diretor da subseção de Altamira querendo informações sobre
o teor das decisões e o momento em que eu liberaria.
Pediram cópias de minhas
decisões por e-mail [todas já
haviam sido disponibilizadas
na internet].
FOLHA - O leilão pode ser considerado inválido?
CAMPELO - Ainda não sei do horário do leilão [13h20], mas minha terceira decisão foi prolatada às 11h45 [de ontem] e foi
transmitida para e-mail do Ibama, da União, da Aneel, e algumas entidades foram intimadas
com entrega da decisão em
mãos de procuradores.
Caso haja confirmação de
que o leilão foi realizado após
intimação da decisão, ele é nulo
de pleno direito.
FOLHA - O senhor vê um conflito
velado entre diferentes instâncias
do Judiciário?
CAMPELO - Isso é inerente ao
sistema judicial brasileiro. A
decisão do TRF pode ser revogada pelo STJ [Superior Tribunal de Justiça], por exemplo.
FOLHA - A disputa jurídica deve se
acirrar?
CAMPELO - Na verdade, os conflitos jurídicos ainda estão na
fase inicial. Os processos prosseguem [...]. Ainda neste ano,
pretendo sentenciar todos os
processos sobre Belo Monte. Se
a sentença for no mesmo sentido, por exemplo, da decisão que
suspendeu o leilão, ele pode ser
considerado nulo. Mas isso é só
uma hipótese.
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