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ARTIGO
Crise em outros países dá confiança aos norte-americanos
11.jun.03 - Hector Mata/France Presse
![](../images/b2106200301.jpg) |
Morador de rua dorme em sofá na Sunset Boulevard (Hollywood) |
DAVID LEONHARDT
DO "THE NEW YORK TIMES"
Com sua combinação de
crescimento lento, desemprego em alta e salários em queda,
a economia atual não atende a nenhuma definição conhecida. Um
economista a classificou como
"nova estagnação", fazendo uma
piada com a "nova economia".
Outro prefere "recuperação com
perda de empregos", sinalizando
que é uma situação pior do que a
da recuperação sem ganho de empregos dos anos 90.
Mas talvez a melhor maneira de
pensar sobre a situação atual, com
seus indicadores contraditórios,
seja como uma versão mais sombria da economia "Cachinhos
Dourados" do final dos anos 90,
uma expressão usada então para
denotar o balanço perfeito do
crescimento da economia aquecida o bastante para trazer prosperidade, mas fria o bastante para
manter a inflação sob controle.
Na versão atual, em contraste, a
economia se parece com um prato morno de mingau.
Os números parecem contar
duas histórias diferentes. Por um
lado, o mercado de trabalho está
atolado em sua mais longa queda
no nível de contratações desde a
Grande Depressão, e a mais profunda dos últimos 20 anos. Os salários ficaram muito para trás da
inflação, para a maior parte dos
assalariados, e os empregadores
vêm forçando os trabalhadores a
cobrir uma parcela maior do custo de seus planos de saúde.
Mesmo tendo atingido um pico
de 6,1%, o mais elevado em nove
anos, o índice de desemprego
continua ligeiramente abaixo de
sua média dos últimos 25 anos.
Havia tanta gente empregada
quando a crise começou que até
mesmo uma queda prolongada
no nível de emprego não conduziu a um desemprego estratosférico. O preço das casas continua subindo, permitindo que as famílias
suplementem sua renda renegociando hipotecas. Nos últimos
três meses, as ações estão em alta.
Os norte-americanos, de acordo
com pesquisas de opinião pública, continuam mais otimistas sobre a economia, hoje, do que há
uma década, apesar do momento
difícil.
Um motivo para essas aparentes contradições é que a crise vem
sendo incomumente longa e ampla, mas jamais se deteriorou a
ponto de poder ser considerada
como uma "crise nacional". Ela
atingiu quase todas as regiões e
grupos demográficos, sem atingir
a nenhum deles de maneira desproporcional. Todos os setores se
sentem entorpecidos, mas nenhum está morto.
"Os consumidores vêem algumas partes da economia como
boas -a inflação baixa, as baixas
taxas de juros- e algumas partes
como ruins -o desemprego e a
falta de reajuste nos salários", disse Richard Curtin, diretor de pesquisa da Universidade de Michigan. "Eles estão gastando apenas
o bastante para manter a economia crescendo em ritmo lento."
A natureza bipolar da economia
está afetando as pessoas de maneira diferente dos passados ciclos de ascensão e de queda econômica.
A porcentagem de norte-americanos se mudando de um Estado
para outro caiu em 2002 ao seu
mais baixo nível desde os anos 70,
de acordo com o grupo de pesquisa Economy.com. A despeito da
alta no desemprego, poucas pessoas optaram por procurar um
mercado de trabalho melhor do
que o de suas cidades de moradia.
Como as demissões de executivos são agora prática aceita no
mundo dos negócios, os profissionais liberais sofrem tanto como a classe trabalhadora. Não
existem mais diferenças notáveis
entre os imigrantes e os trabalhadores nascidos nos Estados Unidos. O índice de desemprego subiu de maneira semelhante para
ambos os grupos, segundo o Urban Institute, de Washington.
Apenas 32% dos norte-americanos se dizem preocupados com
a possibilidade de que um dos assalariados essenciais do domicílio
perca o emprego, segundo recente pesquisa feita pela revista
"Newsweek". Em outubro de
1991, quando o mercado de trabalho estava melhor do que o atual,
44% das pessoas responderam
afirmativamente a essa pergunta.
Outras medidas do clima no
país demonstram atitudes semelhantes. Na mais recente pesquisa
do instituto Gallup, 31% dos entrevistados classificaram as condições econômicas como "desfavoráveis". No final de 1992 -quase 18 meses depois que a economia voltara a crescer, depois da
última recessão-, quase 50% das
pessoas consideravam que as
condições fossem desfavoráveis.
Mais de um terço dos norte-americanos esperam que os próximos cinco anos tragam "bons
tempos contínuos", informou na
sexta-feira a Universidade de Michigan. Nas recessões dos anos 80
e do começo dos anos 90, o grupo
dos otimistas caiu a um quinto da
população, e durante a crise da
metade dos anos 70, apenas 10%
dos norte-americanos demonstravam tal otimismo.
Os problemas constantes de outros países, em comparação com
os dos Estados Unidos, aumentam a confiança dos norte-americanos, dizem os especialistas em
pesquisas de opinião pública.
Muita gente tem razões concretas para enfatizar o positivo. A
despeito da queda nos salários ao
longo do ano passado, a maior
parte das famílias tem renda superior à que tinha cinco anos
atrás, algo de que não poderiam
se vangloriar na década passada.
O preço médio de uma casa e o índice Standard & Poor's estão duas
vezes mais altos do que em 1995.
Ainda que a taxa de desemprego esteja mais ou menos na média, ela obscurece uma realidade
mais grave. Grande número dos
desempregados de longo prazo
desistiu de procurar emprego, o
que os torna inelegíveis para a definição de desempregado usada
nas pesquisas do governo, dizem
os economistas. O quadro mais
amplo revela que o mercado de
trabalho está em situação tão
ruim quanto no começo dos anos
90, quando o índice de desemprego superou 7%.
A longa crise já levou as pessoas
a se preocuparem mais com o futuro e a imaginar como pagarão
pela saúde e pela aposentadoria,
disse Kohut, do Pew Research
Center. Muita gente na casa dos
50 e dos 60 anos voltou a trabalhar
nos últimos anos, depois de decidir que precisaria de mais dinheiro do que o planejado para a aposentadoria.
"As preocupações não são tanto
com o aqui e o agora", disse Kohut, "e mais sobre os custos elevados no futuro".
É claro que esses custos um dia
se tornarão parte do aqui e do
agora. Em seu ritmo atual, a economia forçará muita gente a adotar expectativas mais modestas, a
fim de pagar as contas. O sentimento generalizado de otimismo
e prosperidade raramente sobrevive a esse tipo de mudança.
Tradução de Paulo Migliacci
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