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CAIXA FORTE
Alta ocorreu nos últimos dez anos, período em que caiu o volume de crédito e a receita com tarifas aumentou
Lucros dos bancos sobem mais de 1.000%
LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O aumento da concentração no
setor bancário levou o lucro dos
dez maiores bancos hoje instalados no país a subir mais de 1.000%
nos últimos dez anos. Ao longo
desse período, a concessão de crédito despencou, a receita com a
cobrança de tarifas cresceu mais
de seis vezes, as despesas com
pessoal ficaram abaixo da inflação e o número de reclamações ao
Banco Central voltou a crescer.
Traduzindo os números: enquanto os ganhos aumentaram
em proporção exponencial, impulsionados pela compra de outros bancos, a insatisfação dos
clientes se intensificou, pelo menos no caso daqueles que precisam ir às agências. A contribuição
das grandes instituições financeiras para o crescimento da economia, por meio da concessão de
crédito, caiu.
Em abril, o Banco Central registrou o maior número de reclamações de clientes bancários desde
agosto de 2001. "Invariavelmente,
a percepção das pessoas que estão
nas agências é que há poucos funcionários para atender ao público", disse à Folha o chefe da divisão de Atendimento ao Público
do Banco Central, João Evangelista de Sousa Filho.
Menos crédito
Em 1994, o crédito disponível na
economia equivalia a 35,5% do
PIB (Produto Interno Bruto -soma dos valores de todos os bens e
serviços finais produzidos no país
em determinado período). No
ano passado, essa relação ficou
em 24,8% do PIB.
A política de juros altos do Banco Central e a necessidade do governo de financiar sua dívida interna levaram os bancos a preferir
comprar títulos do Tesouro Nacional a emprestar dinheiro para
consumidores e empresas. Para as
instituições financeiras, emprestar dinheiro ao governo, comprando um título público, é mais
fácil e menos arriscado do que
conceder empréstimos às empresas e pessoas físicas.
"Os bancos abandonam o crédito e ficam [aplicam] em títulos.
Mas mesmo 35% [relação crédito/PIB] é um percentual muito
baixo", diz Gustavo Pedreira, analista da ABM Consulting. Em países desenvolvidos, essa proporção
passa de 100% do PIB.
Mais lucros
No ano em que o Plano Real foi
lançado (julho de 1994), as instituições que hoje formam o grupo
dos dez maiores bancos no país
lucraram R$ 1,279 bilhão. No ano
passado, o ganho conjunto dos
dez maiores foi de R$ 14,573 bilhões -crescimento de 1.039%,
de acordo com levantamento feito pela ABM Consulting a pedido
da Folha.
Em 1994, os então dez maiores
bancos respondiam por 61,9% de
todo o mercado bancário brasileiro. Após aquisições de outras instituições e o próprio crescimento
dos grandes grupos, a participação de mercado das dez maiores
instituições financeiras subiu para 79,7% no ano passado. Em
contraste com a lucratividade dos
bancos, setores que dependem
em grande medida de crédito para vender seus produtos tiveram
perda de receita na última década.
Os que registraram lucro, ostentam números bem inferiores aos
das instituições financeiras.
Segundo a consultoria Economática, o setor de eletroeletrônicos, por exemplo, em 1994, registrava lucro de R$ 209,8 milhões
para um prejuízo de R$ 133,9 milhões em 2003. Máquinas industriais, com desempenho melhor,
registrou elevação de 217%.
Exceção
Dos setores analisados, o único
que superou os bancos foi o de alimentos e bebidas -puxado pelos
números positivos da AmBev-,
com aumento de 1.592%. Nesse
ramo, porém, as vendas ao consumidor praticamente não são influenciadas pela oferta de crédito.
Parte do ganho dos bancos se
deve ao aumento da receita com a
prestação de serviços. Em 1994, os
bancos que em 2003 formavam o
grupo dos dez maiores obtiveram
em conjunto R$ 4,198 bilhões
com a cobrança de tarifas. No ano
passado, o faturamento com taxas
sobre a prestação de serviços bancários foi de R$ 27,697 bilhões
-variação de 559,7%.
Na contramão dessa tendência,
os gastos com pessoal caíram em
termos reais, isto é, subiram menos do que a inflação. De 1994 a
2003, as despesas com a folha de
pagamentos cresceram 62,7%.
Excluindo o primeiro semestre de
1994 (fase em que ainda persistia a
hiperinflação), a inflação medida
pelo IPCA (Índice de Preços ao
Consumidor Amplo) foi de 139%
e a registrada pelo IGP-DI (Índice
Geral de Preços - Disponibilidade
Interna), de 191%.
Isso ajuda a explicar porque as
duas principais reclamações dos
clientes ao BC são o tempo excessivo perdido em filas e o mau
atendimento. Com o aumento da
automação dos serviços, o número de funcionários é cada vez menor, proporcionalmente, para
atender aos clientes nas agências.
Clientela insatisfeita
O Banco Central catalogou 3.138
reclamações em abril (último dado disponível), das quais 246 referem-se a filas e 217 ao mau atendimento. O número mais alto imediatamente anterior a esse foi registrado em agosto de 2001, quando foram recebidas 3.302 reclamações no total (o dado relativo
às filas não era computado separadamente nessa época).
Sousa Filho ressalta que os números sub-representam a insatisfação dos consumidores bancários. Segundo ele, o Banco Central
dispõe somente de 130 funcionários para dar vazão às queixas
provenientes de todo o país. "Estamos atuando quase na maioria
do tempo no limite. Temos uma
demanda reprimida que é considerável, mas que a gente não consegue mensurar", disse.
Muita procura
Segundo Sousa Filho, o canal
mais utilizado pelos consumidores para se comunicar com o Banco Central é o telefone (de 70% a
80% das reclamações). Ele diz que
o número de ligações não atendidas todos os dias é muito grande.
"Se compararmos os dados de
hoje com os de oito anos atrás pode ser que tenhamos números, de
um modo geral, muito semelhantes. Isso não significa que os bancos pioraram ou melhoraram.
Não dá para dizer nada disso, porque sempre trabalhamos com demanda reprimida", afirmou.
Para Pedreira, da ABM Consulting, não se pode afirmar, contudo, que a qualidade do atendimento bancário piorou para todos os clientes. Em sua opinião, o
serviço melhorou muito para os
correntistas de maior poder aquisitivo, incluindo atendimento exclusivo nas agências.
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