São Paulo, domingo, 21 de julho de 2002

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GANÂNCIA INFECCIOSA

Psicanalistas se especializam em tratar de investidores traumatizados pelas perdas no mercado acionário

Crise nas Bolsas cria distúrbio psicológico

DE NOVA YORK

Um de seus clientes não conseguia abrir mãos das ações já adquiridas. O corretor o aconselhava a vender na alta e embolsar os lucros, ele recusava e ficava agarrado aos papéis, até que perdessem o valor. Diagnóstico? "É um anal-retentivo. E retenção anal é péssimo para quem aposta na Bolsa de Valores."
Quem faz a análise é Richard Geist, professor de psiquiatria da renomada Harvard Medical School e fundador-presidente do Instituto de Psicologia e Investimentos, baseado em Newton, Massachusetts. Ele se define como psicoterapeuta e conselheiro financeiro.
"Estudo a influência da psicologia na maneira como as pessoas realizam seus investimentos em condições de risco", diz Geist à Folha. Segundo o acadêmico, a maior parte de seus pacientes está preocupada com os erros que cometeu no mercado de ações.
"Mas também há pessoas que se sentem ansiosas ou deprimidas com as perdas na Bolsa ou querendo entender melhor qual fenômeno psicológico está interferindo com o fato de elas atingirem ou não sucesso no mercado", afirma. Geist não está sozinho: sua especialidade é uma das que mais cresce nos EUA.

Nação de investidores
Quase 70 milhões de norte-americanos, ou um quarto da população do país, têm na Bolsa sua principal aplicação financeira. Com os ventos de baixa que atingem Wall Street nas últimas semanas, é natural que parte dessa multidão esteja ansiosa. Entram em cena os dublês de psicoterapeutas e analistas financeiros.
Nos últimos tempos, a entidade fundada por Richard Geist ganhou novo concorrente, um entre vários que estão surgindo. Trata-se do Instituto de Psicologia e Mercados, baseado em Jersey City, a menos de 20 quilômetros de Wall Street.

Quadro grave
Os negócios vão bem lá também, segundo Karen Friedman, diretora de comunicações do instituto. Tão bem que o órgão já lançou seu periódico, "The Journal of Psychology and Financial Markets", atualmente na primeiro edição do terceiro volume.
Na pauta da publicação há temas como "A Natureza Mutante da Oferta Inicial Pública de Ações" e "Imagens e o Julgamento Financeiro".
E quais seriam os principais problemas psicológico-financeiros dos investidores que procuram profissionais como Richard Geist e seus colegas?
"São cinco", responde o médico. E enumera:
"1) Usar o mercado para validar a própria auto-estima; 2) Não perceber as mudanças no discernimento que ocorrem quando eles estão ansiosos ao investir; 3) A tendência muito humana de seguir o comportamento da manada na hora de manter ou retirar o dinheiro investido; 4) Tomar decisões baseadas nas manchetes do caderno de economia; 5) Cometer erros quando estão se sentindo deprimidos e querem sair de um mercado que está caindo há muito tempo."

Regressão psíquica
E o que o analista responde aos pacientes?
"Ajo como em qualquer terapia tradicional", diz ele. "Induzo o paciente a lembrar a ocasião em que ele fez tudo certo no mercado e o resultado foi positivo. Então, peço para ele repetir o padrão. Assim, se ele pesquisou a história de uma empresa antes de investir, peço que faça o mesmo agora e assim por diante."
Se a sede da Bolsa de Valores de Nova York, o prédio centenário na esquina da rua Wall, em Nova York, fosse uma pessoa e o doutor Geist a pudesse colocar num divã, qual seria o diagnóstico? "Essa é uma questão que vale US$ 64 milhões", hesita. "Mas vamos lá."
"Primeiro", diz ele, "é preciso entender que três dinâmicas básicas influenciam o mercado, que são o nível de valorização, a política monetária e a psicologia do mercado". O.k. "As duas primeiras estão em expansão, mas a terceira está em recessão."
Assim, afirma ele, é a psicologia do mercado que está empurrando as Bolsas para baixo.
"O sentimento dos investidores da sociedade norte-americana está recessivo, então você tem a psicologia do mercado empurrando para baixo, apesar dos outros dois fatores estarem para cima."
Isso, em conjunção com fatores externos como a desconfiança nas corporação americanas e a ameaça do terrorismo, justificam a baixa. "Mas, em pouco tempo teremos, uma recuperação positiva do paciente, algo em torno de 6 a 12 meses", conclui o analista.
Entendeu?
(SÉRGIO DÁVILA)


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