São Paulo, sábado, 21 de outubro de 2000

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ANÁLISE

A queda nos mercados quer dizer recessão mundial?

FLOYD NORRIS
DO "THE NEW YORK TIMES"

Lembra-se de 1998? À medida que as moedas asiáticas despencavam e as Bolsas de Valores ruíam, o pânico se espalhava pelo mundo. Em meio a temores de uma recessão mundial, o Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos) emergencialmente baixou juros e injetou dinheiro numa economia global asfixiada. Os mercados se recuperaram quando ficou claro que um desastre seria evitado.
Agora, os ganhos obtidos desde então foram liquidados. Medido em termos de dólares, metade do valor das Bolsas de Valores em países como Indonésia, Filipinas, Coréia do Sul e Tailândia desapareceu este ano, o que as deixa próximas de suas marcas recordes de baixa em 1998. O Japão perdeu um quarto de seu valor. Neste hemisfério, os mercados da Argentina, Brasil, Chile e Peru caíram pelo menos 15%, ou mais.
E os norte-americanos vivem por aí preocupados porque o índice Standard & Poor's 500 (que mede o desempenho em Bolsas de 500 grandes empresas dos EUA) caiu 5%.
"Ninguém está pensando de verdade sobre a debilidade mundial fora dos Estados Unidos e da Europa", diz Michael O'Higgins, da O'Higgins Asset Management, de Miami. "Isso quer dizer que a economia mundial é muito mais fraca do que as pessoas acreditam. Os mercados farejam problemas à frente."

Desacelera
Mas nos Estados Unidos também há sinais de preocupação. Os junk bonds (papéis de alto risco e grande rentabilidade, se renderem) estão sendo negociados como se houvesse uma recessão começando e a inadimplência geral estivesse próxima, com um ágio em relação ao rendimento dos bônus do Tesouro norte-americano que supera o verificado durante o pânico de 1998.
Isso tudo está acontecendo enquanto a economia mundial continua a funcionar, com a forte demanda acarretando alta nos preços do petróleo e do cobre.
Até mesmo o Japão, que havia uma década tentava sem sucesso se recuperar, mostra agora sinais de alta na confiança do consumidor. A decisão do banco central japonês de elevar as taxas de juros foi recebida com desdém generalizado, mas os problemas esperados não apareceram.
A opinião comum é que que a economia mundial perde velocidade, quaisquer que sejam os indicadores atuais. Os altos preços do petróleo estão prejudicando o crescimento, enquanto a política monetária apertada adotada pelo Fed alarmou os investidores internacionais, que se lembravam do Fed como o salvador do mundo durante a crise de 1998.

Tecnologia
Os sinais de uma desaceleração no setor de tecnologia apavoram os investidores em países exportadores de componentes para computadores. como Taiwan e Coréia do Sul. Em Taiwan, onde a queda foi de 42% este ano, o governo anunciou ontem seu segundo pacote em uma semana, com o objetivo de sustentar os preços das ações. Parte do pacote é um aumento nas somas que os estrangeiros estão autorizados a investir no país, uma mudança que poderia ser mais efetiva caso acontecesse em um momento em que algum estrangeiro estivesse disposto a fazê-lo.

Porto seguro
A tese implícita entre investidores é a de que as Bolsas de Valores dos Estados Unidos são o lugar mais seguro para o dinheiro em um mundo que está crescendo menos. Nosso mercado está povoado de empresas em crescimento que supostamente se sairão bem mesmo em meio a uma crise, enquanto algumas regiões da Ásia substituíram o Meio-Oeste dos Estados Unidos como fabricantes dos produtos cujos preços despencariam durante uma recessão.
David Bowers, principal estrategista de investimento global na Merrill Lynch, diz que os investidores enfrentam uma decisão importante quanto à alocação de seus ativos. "Será que superestimamos a desaceleração?", pergunta. Se for assim, seria uma boa hora para procurar investimentos em mercados deprimidos.
Quer os mercados estejam exagerando os riscos, quer não estejam, é surpreendente a falta de atenção a essa possibilidade que vemos na atual campanha eleitoral. Isso reflete, em parte, a confortável suposição de que os Estados Unidos escaparão às piores conseqüências de qualquer crise.
A natureza instável dos mercados mundiais pode ajudar a explicar os altos e baixos violentos que as Bolsas norte-americanas vêm enfrentando, com os operadores tentando entender se estamos ou não em um ponto de virada para a economia mundial. A recuperação de ontem foi reconfortante, mas a queda na abertura do pregão de quarta-feira foi assustadora. Como dizem na China, vivemos em um tempo interessante.


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