São Paulo, domingo, 21 de outubro de 2007

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VINICIUS TORRES FREIRE

Más notícias, coleção de outono


Bancos e empresas dizem na temporada de balanços que americano comum dá calotes, perde renda e consome menos

O LUCRO DE uma empresa boa como a Caterpillar subiu 23% no terceiro trimestre (trata-se da matriz, nos EUA), um recorde. Mas as ações caíram. A entrevista em que a direção da empresa comentou lucro e perspectivas foi um dos detonadores da sexta-feira cinza de Wall Street. O que houve?
O faturamento da Caterpillar caiu 11% nos EUA e subiu no resto do mundo -20% na América Latina. A empresa faz motores, máquinas para construção, minas, petróleo etc.
Disse que construção civil e carga pesada estão em recessão nos EUA, mas "quase tudo está em alta lá fora; mineração, petróleo e infra-estrutura estão explodindo ("booming')".
E daí a Caterpillar? A Bolsa americana tropeçou devido ao mau humor com que o mercado julgou o resultado de grandes indústrias. Muito lucro subiu, mas empresas fizeram análises ruins da economia doméstica. Há previsão de que, inédito em cinco anos, o lucro agregado das empresas no trimestre vá cair.
A Hershey (chocolates) disse que o crédito mais caro levou seus distribuidores a manter menos estoques -compraram menos doce. A FedEx (correio, transporte) cortou expectativa de lucros devido ao desaquecimento econômico. O grande varejo já sente desânimo no consumidor.
A Bovespa anda de par com Wall Street. Apesar do papo de "descolamento" de emergentes, se coisas piores ocorrem nos EUA no mínimo é bom prestar atenção, e não só devido ao dinheirinho na Bolsa.
Mais curiosa é a reação de Wall Street ao mau resultado dos bancos, previsto até pelas colunas de pedra e pelo touro de lata da Bolsa de NY.
Afora Goldman Sachs e JP Morgan, os bancões, Citi à frente, perderam bilhões com derivativos de crédito e com empréstimos para fusões e aquisições que não conseguiram repassar adiante, além da queda nos negócios de crédito. Cresceram as provisões (expectativa de perdas futuras). Bidu. O que pegou mal?
Nos anúncios de resultado, bancos disseram que problemas devidos à crise do meio do ano ainda vão aparecer nos próximos balanços. Tal tipo de comentário foi ainda vitaminado pela explosão, na sexta, de outros dois fundos de derivativos de crédito. Mas não foi só isso.
Os bancos não perdem apenas devido a desastres com instrumentos financeiros exóticos ou até picaretas, com cotações de preço e risco fantasistas. O americano não está pagando seus empréstimos no banco. No Bank of America, o maior em depósitos e rede de agências nos EUA, o número de calotes e atrasos sérios dobrou de um ano para cá.
Não foi só no "BoA". Na entrevista de sexta-feira sobre o balanço do Wachovia, um executivo desse banco explicou a causa da inadimplência. Primeiro, redução da renda e subemprego. Segundo, acúmulo de dívidas. Terceiro, desemprego. Alan Greenpan ajudou. Disse que o fundão dos bancões vai dar problema. O fundão de Citi, JP Morgan e BoA é uma tentativa de financiar a compra de parte dos papéis encalhados na crise de crédito, evitando assim uma xepa de derivativos, que aumentaria o prejuízo dos bancões.
Para Greenspan isso é golpe, tentativa de tapar o sol com a peneira, de evitar o reconhecimento de que o buraco é mais embaixo.
Americano a dar calote, bancões perdendo algum (mas lucrando bem, ainda), com papéis podres fedendo, empresas vendo recessões em alguns setores da economia dos EUA: "bad news". Desânimo com negócios de coisas reais e esqueletos bilionários saindo do armário de crédito podre desarranjaram o otimismo do último mês. Não é fim de mundo, claro, mas pegou mal.

vinit@uol.com.br


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