São Paulo, terça-feira, 21 de outubro de 2008

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BENJAMIN STEINBRUCH

Oportunidade


A alta do dólar torna mais competitivos os produtos do Brasil, que podem avançar e recuperar mercados perdidos

QUALQUER que seja o tamanho e a duração da atual crise, não há como negar que as empresas brasileiras e os bancos brasileiros têm tudo para sair dela em melhores condições quando comparados com seus concorrentes no exterior. Embora tenham sido prejudicados por equívocos nas políticas monetária e cambial, as empresas brasileiras de setores básicos da economia são hoje competitivas, e os bancos, sólidos. Se isso é uma verdade incontestável, não há razão para pessimismo exagerado diante da crise.
Até setembro, a tensão financeira global havia atingido muito sutilmente o mercado interno. O número de empregos criados, com carteira assinada, é um bom indicador disso: 282 mil no mês passado e 2,08 milhões de janeiro a setembro. Só na indústria paulista foram abertas 11 mil vagas em um mês. Isso não significa, porém, que o Brasil está a salvo. Há muito tempo já se abandonou essa ilusão. Com 100% de certeza, as empresas devem se preparar para enfrentar o impacto da crise na economia real em 2009.
O maior impacto será, como já está sendo, no crédito. Nos últimos anos, o crédito tem sido o principal agente impulsionador do consumo e do crescimento internos. Estima-se que o volume de crédito deve atingir 37% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2008 -um recorde.
Enquanto a confiança não se restabelecer completamente, os financiamentos serão muito seletivos e sairão a conta-gotas. Cabe às instituições públicas, como o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e demais bancos oficiais, tomar a dianteira. Mas, enquanto o crédito não se recupera, a solução das empresas é usar o caixa, que, felizmente, engordou nos últimos anos.
É um lugar-comum dizer que as crises trazem oportunidades. Mas não há como negar a veracidade desse chavão. A alta do dólar, por exemplo, torna mais competitivos os produtos brasileiros não só para avançar no mercado externo, mas também para recuperar mercados perdidos para fornecedores de itens que passaram a ser importados nos anos de dólar barato, como aparelhos elétricos e outros produtos chineses. O medo dos riscos do mercado financeiro também pode estimular investidores conservadores, que hoje aplicam seus recursos em renda fixa, a comprar imóveis, mantendo razoavelmente aquecido o setor da construção. Na Bolsa de Valores, há empresas incrivelmente baratas, cujo valor real é várias vezes superior ao do conjunto de suas ações no mercado.
Reconheço ser muito difícil demonstrar otimismo diante das oscilações inacreditáveis das Bolsas de Valores nos últimos dias: alta de 14% num dia, queda de 11% no outro. Dificilmente alguém poderia encontrar argumentos racionais para justificar essas mudanças repentinas de humor. Em matéria de fundamentos, nada tão extraordinário aconteceu no dia da alta e também nada tão catastrófico ocorreu no dia da baixa. Essa volatilidade obviamente tem a ver com investidores -muitas vezes chamados de especuladores- que tentam se aproveitar da incerteza para ganhar dinheiro fácil e rapidamente. É um mercado para profissionais.
Nessas condições, haja sangue-frio. Mas cabe observar que ainda não apareceu um só analista prevendo recessão para a economia brasileira em 2009. Os mais pessimistas falam em crescimento de 2,5%. Convenhamos que ninguém está falando de caos. Só o pessimismo doentio pode levar a isso.


BENJAMIN STEINBRUCH, 55, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br


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