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No Brasil, estrangeiros perdem trabalho
Imigrantes de países vizinhos como Peru e Bolívia enfrentam dificuldades para conseguir novas vagas
VERENA FORNETTI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
"No hay trabajo", repetem
imigrantes peruanos, paraguaios e bolivianos que perderam o emprego em pequenas
fábricas de costura afetadas pela crise mundial. Como muitos
estão irregulares no país, estão
apartados da discussão sobre a
ampliação das parcelas do seguro-desemprego e, sem ninguém para quem reclamar, alguns foram demitidos sem nem
receber os dias trabalhados.
Com a retração no consumo
e o medo de que o pior ainda esteja por vir, janeiro, que costuma ser um mês fraco para a indústria têxtil, ficou ainda mais
difícil neste ano. Segundo a
Bolbra, associação que representa donos de fábricas de costura da comunidade boliviana,
as encomendas de roupas caíram cerca de 50% em janeiro
ante o mesmo mês de 2008.
Com rendimento vinculado à
produção, o salário também recuou. Cada peça costurada rende de R$ 0,50 a R$ 3,00 ao trabalhador, segundo o número de
horas de trabalho. "Pedimos
para não pagarem tão pouco
porque R$ 0,50 não é nada", diz
Marcos Herminio Canaviri, secretário-geral da Bolbra.
"Tem de trabalhar muito para ganhar pouco", resume o padre Mário Geremia, coordenador da Pastoral do Migrante da
Igreja Católica.
María (nome fictício), 30, foi
demitida em dezembro, pouco
antes do Natal. Ela recebia no
final do ano R$ 250 ao mês por
uma jornada de trabalho que
começava às 7h e terminava às
22h30. Às 12h em ponto, na
única parada do dia, ela e dois
filhos, de quatro e dois anos, recebiam a marmita com arroz,
salada e carne. "Quando me
mandaram embora, não me pagaram muito bem. Disseram
que eu produzia muito pouco."
A peruana Catalina (nome
fictício), 34, também perdeu o
emprego no final do ano em
uma oficina de costura em São
Paulo. "Não tinha mais encomendas. Agora estou procurando outro trabalho, mas não
consigo achar nada." Catalina
pensa em voltar para o Peru,
mas o sonho de que o filho de 15
anos e os seus outros dois meninos menores cheguem à universidade no Brasil adia a volta.
Dificilmente os imigrantes
voltam de vez para o país de origem, afirma Luiz Bassegio, secretário do Grito dos Excluídos
Continental, movimento que
defende inclusão na sociedade.
Ele, que há 20 anos defende a
ampliação dos direitos do imigrante, destaca que, além da esperança de obter trabalho, o
sistema educacional e o acesso
universalizado à saúde estimulam a permanência dos estrangeiros. O real valorizado ante as
moedas vizinhas é outro fator
que estimula a permanência.
Um real vale cerca de 3 bolivianos e aproximadamente
2.200 guaranis, a moeda oficial
do Paraguai. "Aquilo que os
EUA representam para os brasileiros, o Brasil representa para bolivianos, paraguaios e peruanos", afirma Bassegio.
Fila do emprego
Quando não conseguem trabalho fixo, mesmo que sem carteira assinada, os estrangeiros
que não se regularizaram e os
brasileiros que não encontram
vaga e se abrigam em instituições que atendem migrantes
recorrem a serviços temporários sub-remunerados.
Maria Isabel Barbosa, coordenadora do Arsenal da Esperança, que abriga mais de 1.100
homens em São Paulo, diz que,
às 7h, há uma fila de caminhões
que recruta mão-de-obra na
instituição. "Os meninos participaram da montagem dos palcos para o show da Madonna e
agora fizeram a preparação do
Carnaval no Anhembi."
Segundo ela, a remuneração
pode ser de R$ 15 ao dia, com
dever de dormir no emprego e
de só retornar à casa quando a
empreitada terminar.
O problema é que os estrangeiros nem sempre conseguem
receber. É o caso de Paul (nome
fictício), africano de 26 anos
que já passou pela casa e desde
dezembro tenta receber o pagamento pela montagem da estrutura que abrigaria um evento em São Paulo. "Os africanos
estão abandonados", afirma o
padre Geremia.
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