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TRABALHO
Objetivo é eliminar artigos que estão em desuso, ultrapassados ou garantidos pela Constituição ou por outras leis
Governo Lula prepara "limpeza" na CLT
CLAUDIA ROLLI
FÁTIMA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL
O Ministério do Trabalho tem
quase pronto um anteprojeto de
lei que elimina pelo menos 100 artigos -de um total de 922- da
CLT (Consolidação das Leis do
Trabalho).
A primeira "faxina" na legislação trabalhista não foi ainda discutida com a sociedade. O governo entende que os artigos extintos
até agora pelo anteprojeto -a
"limpeza" na CLT ainda não terminou- estão em desuso, ultrapassados ou garantidos na Constituição ou em leis específicas.
Até a primeira quinzena de
maio, o anteprojeto deverá estar
pronto para ser revisto pelo ministro do Trabalho, Jaques Wagner, que pode consultar representantes dos trabalhadores, das empresas e da Justiça do Trabalho.
Em seguida, o texto será encaminhado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que deverá enviá-lo para o Congresso Nacional.
Os artigos mais polêmicos que o
anteprojeto elimina são os que
tratam da duração e das condições do trabalho da mulher, da
concessão de férias para quem
tem mais de 50 anos e da prestação de serviços nas férias.
O artigo 384 da CLT, que o ministério quer extinguir, diz que a
mulher tem direito a descanso de
15 minutos entre o término da
jornada de trabalho normal e o
início da adicional.
"Isso valia para o período em
que a CLT foi editada, em 1943,
quando o entendimento era que a
mulher era frágil. Hoje, elas até dirigem caminhão", afirma Otávio
Brito, consultor jurídico do ministério, encarregado de "limpar"
a CLT.
"Imagine uma mulher que chefia uma seção composta por homens ter de parar seu trabalho
por 15 minutos para poder cumprir a lei. Isso não faz sentido."
O ministério não quer alterar os
artigos que garantem direitos, como licença-maternidade de 120
dias e estabilidade no emprego até
cinco meses após o parto. "Esse tipo de proteção é compatível com
os dias de hoje."
O parágrafo 2º do artigo 134 da
CLT diz que os menores de 18
anos e os maiores de 50 anos terão
férias corridas -de uma só vez. O
anteprojeto extingue as férias corridas para quem tem mais de 50
anos.
"A expectativa de vida [do brasileiro] aumentou. Não dá mais
para considerar que uma pessoa
que tem mais de 50 anos precise
dessa proteção. Os próprios trabalhadores hoje preferem dividir
o período de férias em até três vezes", diz Brito.
No caso dos menores de 18
anos, o Ministério do Trabalho
quer levar a discussão para o Fórum Nacional do Trabalho, que
será formado no próximo mês
por representantes dos trabalhadores, das empresas e do governo.
O artigo 138 -o anteprojeto
também o elimina- diz que o
empregado não poderá prestar
serviço a outra empresa durante
as férias, a não ser que seja obrigado a fazê-lo por contrato de trabalho. Com a eliminação desse artigo, o empregado poderá trabalhar
nas férias.
Com a redução da jornada de
trabalho e com o desemprego,
muitos profissionais já trabalham
nas férias, no entender do consultor, porque precisam completar o
orçamento. "Manter esse artigo
[o 138] só cria confusão para o
empregado", afirma.
Para o ministério, "limpar" a
CLT significa retirar as "células
mortas" da lei sem que isso implica a retirada de direitos já conquistados pelos trabalhadores,
como férias, 13º salário, licença-maternidade, jornada de trabalho
de 44 horas e FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço).
Os artigos que não estiverem incluídos nessa primeira etapa de
mudanças na lei trabalhista deverão ser discutidos, segundo Brito,
no fórum trabalhista.
"Acho temerária a iniciativa do
Ministério do Trabalho, pois ela
desqualifica o Fórum Nacional do
Trabalho na medida em que presume o que seria consenso", afirma o advogado Luis Carlos Moro.
"O anteprojeto deveria ser colocado em pauta no fórum para discussão de direitos conquistados
por categorias profissionais ao
longo de muitos anos", diz o advogado Alessandro Vietri.
"Não são mudanças profundas,
mas também não beneficiam os
trabalhadores. Nenhuma supressão de direitos interessa aos trabalhadores", diz Ricardo Gebrim,
presidente do Sindicato dos Advogados do Estado de São Paulo.
Mais autonomia
O que o governo quer é dar mais
espaço para as negociações entre
trabalhadores e patrões, hoje restritas devido às minúcias da lei.
Hoje, por exemplo, existem muitos artigos na CLT, do 129 ao 153,
que tratam de férias. Isso, na avaliação de Brito, tira espaço para a
negociação dos sindicatos.
"Não é possível tirar do trabalhador o direito às férias. Agora,
se o valor a ser pago será todo antecipado ou pago parcialmente,
antes ou depois do período de
descanso, isso pode ser objeto de
negociação entre o trabalhador e
o empregador, ou entre o sindicato e a empresa", diz.
O consultor também entende
que a data do pagamento do 13º
salário pode ser negociada. "O
que tem de estar claro na lei é que
um salário a mais por ano tem
que ser pago para o trabalhador
até dezembro. Agora, a divisão ou
a forma de pagamento pode ser
discutida em negociação coletiva", afirma Brito.
No FGTS, diz ele, será mais difícil fazer mudanças, já que existe
uma lei específica que trata do
fundo (lei 8.036, de maio de 90) e
envolve interesses do Estado.
Mas, no entender do consultor jurídico do ministério, seria preciso
estabelecer um controle maior sobre os recursos do fundo.
Flexibilização
Brito diz que o ministério é contra a flexibilização das leis trabalhistas na forma como defendia o
governo FHC. Ao propor a alteração no artigo 618, que trata dos
acordos coletivos, o governo tucano queria, na prática, deixar que
as negociações entre patrões e
empregados prevalecessem sobre
a legislação trabalhista.
Por esse artigo, só empresas e
instituições que não estão enquadradas nas regras da CLT podem
fazer acordos que se sobreponham à lei. Com a mudança que o
governo anterior defendia, até como forma de diminuir o trabalho
informal, a livre negociação ganharia força.
"Não conseguimos imaginar
que essa alteração na CLT pudesse gerar emprego. Mas reconhecemos que alguns artigos da legislação não são compatíveis com as
mudanças que ocorreram com a
evolução dos métodos de trabalho e com a Constituição de 88."
Brito destaca também que esse
projeto de "faxina" na CLT não
será um ato isolado do governo
Lula. "Paralelamente ao anteprojeto, o governo vai discutir a reforma sindical no fórum trabalhista. No passado, a mudança da
CLT, via substituição do artigo
618, era um ato isolado. Era empurrar "goela abaixo" mudanças
sem discutir alterações na estrutura sindical necessárias para fortalecer os sindicatos."
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